A campanha militante do PT não ressoou em baixa voz nos rincões paulistas, nos rincões de outros Estados centrais e, sobretudo, nos grandes rincões do país. Ao contrário, ouviu-se e sentiu-se, tal como foi no Nordeste e Norte do Brasil, o grito forte de um povo que decidiu por um governo de inclusão e justiça social.

Este cenário revela que nossa trajetória política interna, de privilegiamento dos grandes centros como referência única na construção de vitória partidária, precisa ser revista. Deslocou-se o ponto de referência do PT, que nasceu das grandes massas organizadas, nos fortes sindicatos, para a frágil organização dos diretórios cujos endereços são os mesmos das casas dos seus dirigentes. Deslocou-se o ponto de referência do PT de uma centralidade que organizava as bases partidárias nos rincões, determinava os níveis de aliança sem reconhecer os embates políticos e de projetos que foram historicamente moldados nas lutas dos “pequenos petistas”, perdidos nos rincões. Deslocou-se o ponto de referência do PT que se estabeleceu nos últimos anos, erroneamente, no poder econômico, em detrimento da política, e passou-se a reconsiderar, uma ironia, uma perspectiva militante e de identidade popular. Deslocou-se mandarinatos internos para a abertura e a contribuição de lideranças nacionais do Sul ao Norte, garantindo uma pluralidade de idéias e o renascimento dos fundamentos do PT (a boa e velha inversão de prioridades).

Em verdade, quem inaugura tal deslocamento é o próprio Lula. Sua desterritorialização nordestina é o paradigma do deslocamento do PT e, contraditoriamente, é Lula migrante que se desloca para os rincões. É Lula que reinaugura não apenas o Nordeste e o Norte como sujeitos histórico-sociais no grande cenário político. Reinaugura também a presença das camadas mais empobrecidas da população com seu direito e desejo de sonhar.

Mas não é apenas o PT que sofre esse deslocamento. Lula com seu projeto de inclusão desloca as mais tradicionais forças políticas conservadoras do país e fundamentalmente do próprio Norte e Nordeste, deslocando nos rincões.

Neste sentido, vale a pena chamar a atenção dos dirigentes petistas sobre a necessária revisão do centralismo e refletir sobre a interiorização política e a capacidade de agregar forças.

Em nossa trajetória militante no PT, vimos ao longo dos anos as lideranças do centro pousarem com suas estruturas partidárias e de aparelhamento nos rincões. Neste processo, arrebataram votos e sonhos de crescimento e fortalecimento das lideranças locais. Um processo pernicioso para a construção democrática do PT e, sobretudo, para o desejo de ampliar a capacidade de intervenção local e regional.

Assim, faz-se necessário reconhecer tal deslocamento a fim de que novos personagens entrem em cena e, nas mesmas condições que o povo nortista e nordestino, dos rincões de maneira geral – segmento que Lula ratificou como prioridade -, possam construir ou se necessário reconstruir o partido democrático e de massas que há mais de 20 anos fundamos, ainda que seja nos rincões.

*artigo publicado no portal do PT em 09/11/2006

*José Gilberto de Souza é geógrafo, professor doutor do Departamento de Economia Rural da Unesp de Jaboticabal (SP) e presidente do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores na mesma cidade.

`