A retomada da trajetória de crescimento sustentado e a consolidação de um quadro macroeconômico de maior solidez e resistência às vicissitudes da economia internacional – consubstanciada, por exemplo, na queda da relação dívida externa/exportações ou nos menores níveis do risco-país – estimulam a oferta de mais crédito, o que favorece a continuidade do movimento de expansão, principalmente quando financia novos investimentos. Portanto, com o fortalecimento do arranjo institucional e a manutenção do bom desempenho macroeconômico, o crédito deverá continuar crescendo nos próximos anos, levando o Brasil a ter, no médio prazo, uma relação crédito/PIB próxima das economias mais desenvolvidas.

Hoje e no futuro, o papel dos bancos públicos é continuar fomentando o desenvolvimento econômico e social brasileiro, ofertando crédito e serviços financeiros nas melhores condições e para o público mais amplo possível. Isso muitas vezes significa atender parcelas da população ou regiões do País que, por razões diversas, não interessam aos bancos privados. Há casos bem recentes mostrando como os bancos públicos foram desbravadores de novos mercados que só posteriormente atraíram as grandes instituições privadas.

Por muitos anos a oferta de crédito agrícola e de financiamento habitacional esteve restrita ao Banco do Brasil e à CAIXA, respectivamente, por total desinteresse das instituições financeiras privadas neste tipo de operação. Mais recentemente, foram os bancos públicos federais que iniciaram o esforço de inclusão bancária das parcelas de menor renda da população ou que ofereceram de forma mais ampla o crédito com desconto em folha de pagamento para a população, apesar desta modalidade de crédito apresentar um spread significativamente inferior – e, portanto, uma taxa de juros paga pelo tomador – aos observados nas demais operações de crédito pessoal. Enquanto isso, alguns grandes bancos privados negam-se a oferecer crédito consignado para os seus clientes com a justificativa de evitar a redução do spread médio de suas operações.

Da mesma forma, a existência de financiamento de longo prazo na economia brasileira ainda permanece quase que restrita ao oferecido pelos bancos públicos. No fornecimento de crédito de longo prazo para a realização de investimentos industriais ou comerciais o BNDES é quase exclusivo; no financiamento imobiliário apenas recentemente a CAIXA passou a ter a companhia de bancos privados, mesmo ainda detendo mais de 60% deste mercado, graças, em grande parte, às melhores condições de taxas de juros, prazos e celeridade na avaliação e aprovação das demandas que recebe.

O futuro dos Bancos Públicos

É preciso admitir que ser uma instituição financeira pública no Brasil não é tarefa fácil. Além de estarem recorrentemente submetidas às criticas daqueles que desejam o seu fim, os bancos públicos mais recentemente, em função dos lucros atingidos, também tem sido alvos daqueles setores da sociedade que os defendem. Entretanto, tais defensores da existência dos bancos públicos, ao criticarem a ocorrência de resultados positivos, cometem um duplo equívoco. Primeiro, porque se esquecem que os resultados são repassados ao Tesouro e servem para cumprir com as obrigações do governo central (investimento, custeio, pagamentos de programas de transferência de renda, juros, etc.). Ou seja, parte dos lucros alcançados pelos bancos públicos volta para a sociedade. Segundo, porque se esquecem de que nas atuais condições de concorrência bancária e de restrições fiscais do governo federal, um banco público precisa ser eficiente e competitivo, e assim obter ganhos com as suas operações, para ser capaz de investir em tecnologia, expansão física, e melhoria de produtos e serviços.

Os avanços ocorridos nos bancos públicos nesses últimos anos mostram (e a CAIXA é um bom exemplo) que um banco pode ser público, ter compromisso social e obrigações com as políticas de governo e, ao mesmo tempo, ser eficiente e competitivo, mostrando não existir uma inerente incapacidade das instituições financeiras estatais cumprirem a contento suas mais diversas missões. No entanto, se essa batalha foi vencida, o mesmo ainda não se pode dizer da guerra pelo crescimento sustentado e pela redução da desigualdade da renda.

Nessa guerra, a preservação do caráter público e do compromisso social exigirá – no próximo período – uma maior articulação e coordenação da ação das instituições financeiras federais e a contínua elevação da sua eficiência e competitividade, seja nas suas ações tipicamente sociais, seja naquelas inerentes à atividade bancária. Caso contrário, os interesses privatistas – sempre presentes, mesmo quando aparentemente adormecidos – terão maior facilidade de retomar sua peroração. Não sem razão, com o precoce início da fase pré-eleitoral em 2005 e a então aparente vitória das oposições, não foram poucas as vozes que retomaram a apologia da privatização e a defesa do fim do crédito dirigido dos bancos públicos.

Os bancos estatais nos últimos anos passaram a manter em sua atuação um compromisso Público. Sim, Público maiúsculo, ou seja, com os objetivos maiores de crescimento econômico e distribuição de renda, em meio à sua maior eficiência e competitividade, na busca constante pela preservação de um patrimônio que é de toda a sociedade. Muitas vezes, a crítica aos bancos públicos assim como sua defesa, é verdade, parecem viver do passado e permanecem algumas décadas atrás, desconhecendo, de fato, as mudanças ocorridas na economia mundial e brasileira, bem como nas próprias instituições financeiras controladas pelo governo federal.

Além disso, independentemente dos avanços ocorridos recentemente, as demandas nacionais de crédito e investimento continuam muito elevadas e os bancos públicos de hoje tem uma dupla responsabilidade. Por um lado, no fomento ao desenvolvimento econômico e social brasileiro, ofertando crédito e serviços financeiros nas melhores condições e para o público mais amplo possível. Isso significa continuar se dispondo a desbravar novos mercados e atender parcelas da população ou regiões do País que, por razões diversas, inicialmente não interessam aos bancos privados nacionais ou estrangeiros. Por outro lado, assegurar sua eficiência e desempenho em um mercado crescentemente competitivo. Desta maneira, os bancos públicos federais não precisarão ter receio da concorrência com os bancos privados, nacionais ou estrangeiros, e nem dos arautos de sua privatização.

*Jorge Mattoso, com base em artigo de Jorge Mattoso e Marcos Vasconcelos “Para que Banco Público?”, 2006. Mattoso é professor do Instituto de Economia da UNICAMP, autor de vários livros e artigos publicados no Brasil e no exterior; ex-secretário de Relações Internacionais da Prefeitura de São Paulo de jan/01 a dez/02. Presidiu a Caixa Econômica Federal de jan/03 a mar/06

`