Soluções não convencionais, embora sejam mais complexas do ponto de vista da operacionalização, conseguem incorporar questões como geração de emprego e renda e prejudicam menos o meio ambiente, a saúde e a qualidade de vida.Autores: Eduardo de Lima Caldas e Patrícia Laczynski

Soluções não convencionais, embora sejam mais complexas do ponto de vista da operacionalização, conseguem incorporar questões como geração de emprego e renda e prejudicam menos o meio ambiente, a saúde e a qualidade de vida.Autores: Eduardo de Lima Caldas e Patrícia Laczynski

Independente do tamanho do município, o poder público municipal busca incentivar o desenvolvimento econômico local, aumentando a produção agrícola, atraindo indústrias e expandindo as atividades voltadas ao comércio e à prestação de serviços, quase sempre sem levar em conta que a contrapartida do crescimento econômico é o aumento da produção de lixo.

Para enfrentar o problema do lixo, sua coleta, processamento e destinação final, há diversas soluções, desde os aterros sanitários, incineradores, usinas de compostagem, e os lixões, até a coleta seletiva, reciclagem de entulho e compostagem simplificada.

Dentre as soluções convencionais, os lixões continuam sendo a mais utilizada, apesar dos graves prejuízos que trazem ao meio ambiente, à saúde e à qualidade de vida da população. Já a coleta seletiva, reciclagem de entulho e compostagem simplificada, embora sejam mais complexas do ponto de vista da sua operacionalização, conseguem incorporar questões mais amplas como preocupação com a perspectiva de gênero, emprego e renda, parcerias com outros setores governamentais e com a sociedade civil.

EXPERIÊNCIAS

Angra dos Reis-RJ caracteriza-se, do ponto de vista topográfico, por suas praias recortadas e litoral com muitas ilhas e escarpas. Esta topografia de certo modo condicionou as formas de ocupação do solo e desenvolvimento urbano do município: são vários núcleos populacionais afastados e separados entre si por barreiras naturais.

Do ponto de vista demográfico, Angra dos Reis cresceu aproximadamente 8,5% entre 1991 e 1996, o que representa uma taxa média de crescimento anual de 2,3%, embora esteja abaixo do crescimento do Estado do Rio de Janeiro (3,5%), está acima do crescimento do País (1,4%)..

Tanto a forma de ocupação do solo quanto o crescimento populacional causam impacto direto nas políticas de coleta, processamento e destinação final do lixo. Enquanto a forma de ocupação territorial dificulta o acesso da população aos serviços de coleta do lixo e modificam o custo de transporte dos resíduos coletados; o aumento populacional aumenta a quantidade de lixo produzida, significando maior custo para a manutenção dos serviços.

São coletadas no município 2.200 ton/mês. Cerca de 4,5% (100 ton/mês) deste total é coletado seletivamente. Calcula-se que estes 4,5% de peso significam 25% do volume total no momento do despejo, quando o lixo comum ainda não se deteriorou.

O aterro municipal de Angra dos Reis possui vida útil de 25 anos, contada a partir de 1999, caso se mantenha a coleta seletiva no município, vigente desde 1990. Não se mantendo a coleta seletiva, a vida útil do aterro decai.

Nos últimos anos foram implementados alguns programas de coleta, transporte, tratamento e destino final do lixo: expansão da coleta comum do lixo, implantação e expansão dos serviços de coleta seletiva, Programa Troca de Lixo, Coleta Seletiva de Lixo Hospitalar, dentre outros.

Coleta Comum

A coleta comum atende a todas as comunidades da parte continental do município. Os serviços de coleta e transporte do lixo, varrição das ruas, limpeza de valas e coleta de entulhos são executados por empresa terceirizada e pagos com recursos públicos. A coleta de lixo e a manutenção de logradouros públicos nas ilhas também são terceirizados. Os serviços contratados para o continente são pagos de acordo com a quantidade de serviço executada, os serviços contratados para as ilhas são pagos por dia/homem.

Coleta Seletiva

A coleta seletiva foi implantada, em caráter "piloto", em 1990, nas ilhas e nos morros de Santo Antônio e da Caixa D’água, localizados no centro da cidade. Trata-se de locais de difícil acesso não atendidos pelo serviço convencional de coleta de lixo. A conseqüência mais imediata da falta de acesso à coleta convencional era o surgimento de depósitos inadequados em mangues, grotas, costeiras, ou mais freqüentemente, nos fundos das escolas locais.

De 1990 até 1993, o município coletava, em média, 2,5 toneladas de lixo reciclável, por mês. Em novembro de 1993 foi implantado o Programa de Troca de Lixo, e a quantidade média de lixo reciclável saltou para 100 toneladas por mês.

O Programa de Troca de Lixo abrange todo o município, inclusive as ilhas. Os participantes levam o lixo aos postos de troca espalhados por diversos bairros do município ou solicitam a coleta do lixo diretamente em domicílio. Em ambos os casos, o material deve ser previamente selecionado.

O valor do lixo entregue é calculado por meio de uma tabela de pontuação. Cada participante acumula pontos que são convertidos e trocados por alimentos, material escolar ou cimento, comprados pela prefeitura com o dinheiro da venda do lixo reciclável arrecadado.

Os participantes podem ser individuais ou coletivos. Para as unidades públicas de atendimento médico e para as escolas públicas estaduais e municipais existe o Projeto Escola da Latasa – empresa privada que compra latas de alumínio.

Dentro ainda do programa de Coleta Seletiva de Lixo é realizada a coleta de resíduos de serviços médicos da rede pública: hospitais, prontos socorros e postos de saúde.

A coleta seletiva e a operação do aterro são terceirizados e pagos por dia/homem e hora/equipamento.

Usina de Lixo

A usina de lixo foi comprada pela prefeitura em 1987 e terminou de ser montada em 1988. Porém só em agosto de 1993, após vários serviços de adequação eletro-mecância, a usina entrou em operação. O equipamento de beneficiamento do lixo (prensas manuais e moinho de vidro) foram transferidas do "galpão" para a usina recém instalada.

A Coordenadoria de Saneamento Básico percebeu que o lixo proveniente era de baixíssimo ou nenhum valor e que, em termos de educação ambiental, a operação de uma usina nos moldes tradicionais traria muitos prejuízos. O lixo da coleta comum voltou a ser despejado diretamente no aterro e a usina transformou-se em local de beneficiamento do lixo proveniente da coleta seletiva.

COLETA SELETIVA

O Programa de Coleta Seletiva foi implementado inicialmente, em caráter piloto, em 1990, nas ilhas e nos morros de Santo Antônio e da Caixa D’água, localizados no centro da cidade, com duas parcerias: o Comitê Contra a Fome e pelo Desenvolvimento (CCFD), entidade católica francesa que destinou recursos a fundo perdido ao Programa, e com o Conselho Municipal das Associações de Moradores de Angra dos Reis (COMAM), que teve a responsabilidade de contratar oito trabalhadores dos morros para realizar o serviço da coleta seletiva, comercializar o lixo e desenvolver atividades de educação ambiental.

De acordo com as parcerias estabelecidas, os funcionários faziam a coleta nos morros em latões e levavam o lixo para um galpão próximo ao centro da cidade onde operavam uma prensa manual, para enfardar os papéis, e um moinho de vidro. O alumínio, assim como os outros itens do lixo (papel branco, papelão, latas de outros metais, e outros) eram vendidos soltos.

A Prefeitura Municipal teve o papel de articular a parceria, acompanhar o trabalho do Conselho de Associações de Moradores, orientar e encaminhar a prestação de contas e os relatórios ao CCFD, além de coordenar a realização de diversos mutirões de limpeza nos locais onde o lixo era inadequadamente jogado.

Desde 1991, um ano após a implementação do programa, a prefeitura vem assumindo os custos, uma vez que os recursos advindos do CCFD esgotaram-se.

O contrato com trabalhadores e a manutenção dos equipamentos também são custeados desde 1991 com dotação orçamentária da Prefeitura Municipal.

Em 1993 foi criado, na Secretaria Municipal de Obras, o Departamento de Saneamento Básico com objetivo de iniciar o Programa de Saneamento Básico municipal com recursos do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento e da CEF – Caixa Econômica Federal – e coordenar os serviços de coleta de lixo e varrição, incorporando o Programa de Coleta Seletiva, até então sob responsabilidade da Secretaria de Planejamento.

O CCFD, além de financiar a implantação do Programa de coleta seletiva de lixo, teve um papel fundamental de "auditor externo", uma vez que exigia relatórios e prestações de contas, fazendo com que a Prefeitura interagisse com o COMAM e, de certo modo, descentralizasse as tomadas de decisão, democratizando a gestão pública.

RECURSOS

Todo o sistema de resíduos sólidos gastou, em 1997, R$ 3 milhões, representando 4,2% do orçamento municipal daquele ano (R$ 67 milhões). Para o ano de 1999, estima-se um gasto da ordem de R$ 4 milhões, o que representa aproximadamente 4,6% do orçamento (R$ 94 milhões).

Deve-se observar que a Taxa de Limpeza Pública (TLP) não cobre os custos destes serviços. A TLP é cobrada a partir do Cadastro Municipal de Imóveis, usado para o lançamento do Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU.

A ineficiência do financiamento da política de coleta, transporte, tratamento e destinação final do lixo deve-se, principalmente, à desatualização do Cadastro e à alta inadimplência referente ao IPTU. Há bairros em Angra dos Reis nos quais mais da metade dos imóveis não estão lançados no Cadastro Imobiliário Municipal. Deve-se considerar ainda que a indadimplência do IPTU chega a aproximadamente 50%. Em decorrência dessa situação, a TLP alcança a cifra de R$ 790 mil, ou seja, 25,5% dos aproximadamente R$ 3,1 milhões requeridos.

Apesar das dificuldades de mensurar o benefício social advindo da coleta seletiva de lixo, o gasto com este serviço representa menos de 20% do gasto total com serviços de coleta dos resíduos sólidos.

Deve-se considerar ainda os recursos humanos destinados a operar a política de coleta seletiva especificamente: até 1993, oito funcionários operavam 2,5 toneladas por mês, perfazendo média de 312 kg/funcionário/mês. A partir de 1993, o número de funcionário elevou-se para 50, e a quantidade de lixo reciclado passou para 100 ton./mês, e a produtividade da mão-de-obra passou 2 ton./funcionário/mês.

DIFICULDADES

Dentre as dificuldades observadas, apontam-se as seguintes:

a) quantificar o ganho social – Se por um lado é possível contabilizar os gastos com programas alternativos de coleta de resíduos sólidos, por outro, ao contrário, é muito difícil mensurar os ganhos proporcionados por estes programas em termos de qualidade de vida e economia de recursos naturais. Cada embalagem de vidro reciclada, por exemplo, representa determinado custo, mas por outro lado, representa também um ganho de difícil mensuração em termos da não utilização de silício, areia, jateamento, mão-de-obra, dentre outros, para reposição do material que seria desperdiçado no lixo. O mesmo pode-se dizer para papel, latas de alumínio, cuja principal matéria-prima é a bauxita, e para diversos outros produtos;

b) fiscalizar as empresas que prestam serviços de coleta convencional de resíduos sólidos em termos de cumprimento das rotinas estipuladas e de efetivação dos serviços nos bairros contratados, bem como fiscalização do despejo dos resíduos coletados;

c) estabelecer interação do Programa de Coleta de Resíduos Sólidos com o financiamento dessa política por meio da TLP, em decorrência da desatualização do Cadastro Municipal de Imóveis;

d) licitar serviços e compras de equipamentos – Duas licitações para aquisição de equipamentos de beneficiamento dos resíduos sólidos foram anuladas no passado por falta de lisura entre os participantes. Hoje o Coordenadoria de Saneamento Básico, ao invés de adquirir o equipamento, estabelece parcerias com os compradores. A usina enfarda ferro numa prensa jacaré do Grupo Gerdau (Consigua), enfarda plástico em duas prensas da Consugel, quebra vidro em um moinho da Cisper e o papel é enfardado na única prensa própria da prefeitura.

RESULTADOS
A Coordenadoria de Saneamento Básico está conseguindo transformar o lixão em aterro sanitário. Já conseguiu limitar o número de catadores de papel e lixo e cadastrá-los, além de cercar todo o aterro, impedir a entrada de catadores alcoolizados e crianças, retirar todos os barracos existentes dentro da área do aterro, colocar drenos de gás para evitar incêndios e drenar o chorume.

A reprodutibilidade dessa política, permitindo superar as dificuldades e tornando-a mais eficiente, depende principalmente da constituição de um conselho municipal paritário que, dentre outras funções, acompanhe e fiscalize o processo de licitação, a forma de contratação dos serviços e da mão-de-obra, e a destinação final dos resíduos sólidos.

Além da constituição do conselho, é importante articular parcerias com empresas e organizações não -governamentais. O CCFD, por exemplo, exigiu a participação do Conselho Municipal das Associações de Moradores até como forma de fiscalização externa da gestão dos serviços de coleta e tratamento do lixo.

A experiência de Angra dos Reis foi implementada, inicialmente, em caráter "piloto" e somente depois se expandiu. Neste sentido, a experiência pode ser iniciada nos próprios órgãos públicos e nas escolas, em parceria com a Delegacia de Ensino, por exemplo. Uma vez coletado e selecionado, o lixo tinha destino certo – diversas empresas como a Latasa, a Cisper e os sucateiros locais.

Quadro: Valores Absolutos e Percentual, segundo Serviços com Coleta, Transporte, Tratamento e Destino Final dos Resíduos Sólidos (1997)

Serviço

Valor Absoluto

Percentual 1*

Percentual 2**

Coleta Comum

1.498.080

48,37

2,24

Coleta Seletiva

603.640

19,49

0,90

Aterro

227.766

7,35

0,34

Varrição

427.200

13,79

0,64

Entulho em Caçambas

101.120

3,27

0,15

Ilha Grande

198.000

6,39

0,29

Barco (transporte)

41.470

1,34

0,06

Total

3.097.276

100,00

4,62

Fonte: Prefeitura Municipal de Angra dos Reis.
* Valor Percentual em relação ao total dos Serviços com Coleta, Transporte, Tratamento e Destino Final dos Resíduos Sólidos.
** Valor Percentual em relação ao orçamento municipal total.


CONTATOS

Paulo Sevalho Gonçalves

Departamento de Saneamento Básico da Prefeitura Municipal de Angra dos Reis – Rio de Janeiro.

Endereço: Rua Coronel Carvalho, 124 – Centro – CEP: 23900-000 – Angra dos Reis – RJ.

Telefones: (0XX24) 365-4296 e (0XX24) 367-1073

Fax: (0XX24) 365-4296