Programa Mãe-Canguru
Ao garantir o contato entre mãe e bebê, permite humanizar o atendimento, reduzir os índices de mortalidade freqüentes nos casos de prematuridade e diminuir os custos hospitalares referentes a este tipo de parto.Autora: Janaína Valéria de Mattos
Ao garantir o contato entre mãe e bebê, permite humanizar o atendimento, reduzir os índices de mortalidade freqüentes nos casos de prematuridade e diminuir os custos hospitalares referentes a este tipo de parto.Autora: Janaína Valéria de Mattos
O grande número de recém-nascidos prematuros e de baixo peso, as altas taxas de mortalidade infantil, os altos custos hospitalares e as elevadas porcentagens de seqüelas no crescimento e desenvolvimento desses bebês são grandes preocupações da classe médica. Além de ser um atendimento caro, constata-se que ao se colocar o bebê nascido prematuramente numa incubadora, é grande a probabilidade de a mãe desvincular-se emocionalmente da criança. Também o fato de interromper a amamentação leva à desnutrição da criança quando deixa o hospital. Tanto a ausência de incubadoras, principalmente nas regiões mais pobres do País, como a desnutrição e o abandono sofridos pelos bebês prematuros influenciam diretamente os altos índices de mortalidade infantil.
Buscando uma alternativa segura de atendimento a esses bebês, proporcionando melhor qualidade de vida a recém-nascidos prematuros ou de baixo peso e garantindo um atendimento mais humanizado tanto para as crianças quanto para suas mães, médicos colombianos criaram, em 1979, o método "Mãe-Canguru".
A metodologia do Programa "Mãe-Canguru" está baseada em princípios simples e que têm demonstrado grande efetividade no atendimento:
1. o calor, gerado e transmitido pelo corpo da mãe em contato com o bebê, que fica junto dela durante longos períodos;
2. o leite materno que, além de alimentar o bebê, possui propriedades imunológicas, protegendo o bebê contra infecções;
3. o amor, que estimula o bebê, garantindo-lhe apoio e equilíbrio emocional, fatores indispensáveis para seu bom desenvolvimento.
Importado para o Brasil pela equipe de pediatria do Hospital "Guilherme Álvaro", na cidade de Santos, litoral paulista, o método foi implantado em meados de 1991.
O principal objetivo do Programa "Mãe-Canguru" é humanizar a assistência ao recém-nascido prematuro e/ou de baixo peso, possibilitando a alta precoce, amenizando os efeitos da infra-estrutura inadequada, superlotação e infecção hospitalares. Desse modo, superadas as complicações clínicas características dos primeiros dias de vida dos bebês, independente do peso em que se encontrem, recebem alta, e são atendidos no ambulatório até que se completem as quarentas semanas de gestação normal ou até que o bebê atinja o peso de dois quilos. A alta precoce, além de fortalecer o vínculo do bebê com sua família, favorece a liberação de vagas destinadas a novas internações, racionalizando o uso de equipamentos (incubadoras, etc.) e reduzindo custos, sem afetar a qualidade no atendimento.
FUNCIONAMENTO
No método "Mãe-Canguru" o atendimento aos bebês prematuros baseia-se nas suas condições clínicas e não no seu peso, como ocorre na metodologia tradicional.
O primeiro passo é estabilizar o bebê, que recebe procedimentos de reanimação e cuidados pediátricos necessários. Esse processo pode demorar, dependendo do grau de prematuridade, desconfortos respiratórios, apnéias, etc. De acordo com suas condições, o bebê é encaminhado a uma unidade de terapia intensiva ou intermediária, ou diretamente à mãe, que pode optar pelo tratamento convencional. A partir daí, num período experimental dentro da maternidade, a mãe aprende cuidados, alimentação, técnicas de estímulo à sucção, etc. Desde o começo, busca-se favorecer o vínculo entre a mãe e o bebê, mantendo-se o bom senso capaz de estabelecer os devidos limites de segurança.
O método considera sempre o binômio mãe-filho. Quanto à mãe, é realizada uma caracterização psicossocial pelos protocolos específicos aplicados durante a internação e no segmento ambulatorial. Uma equipe interdisciplinar dá orientação quanto ao funcionamento e benefícios do método. Em relação ao bebê, tão logo supere eventuais problemas críticos de saúde, é amarrado ao corpo da mãe (diretamente em contato com a pele) em posição vertical, junto ao seio, apenas de fralda, não havendo necessidade de nenhum tipo especial de tecido para a confecção da bolsa. A posição vertical é utilizada para evitar o refluxo gástrico-esofágico e a bronco-aspiração, fenômenos comuns que podem levar à asfixia e até mesmo à morte. As mães são instaladas em camas elevadas e aconselhadas a dormir sentadas, na posição ereta, para que o bebê se mantenha sempre nessa posição. O contato com o corpo da mãe promove a manutenção dos níveis adequados de temperatura corpórea do bebê, além de favorecer o estreitamento do vínculo mãe-filho. Proporciona maior tranqüilidade ao recém-nascido, que tem longos períodos de sono profundo, e à mãe, que pode acompanhar todos os momentos de seu bebê, facilitando sua amamentação. As dificuldades dos bebês para sugar o leite prolongadamente é compensada pela proximidade com o peito materno.
O aleitamento exclusivo tem papel fundamental no programa, dadas as propriedades imunológicas e nutritivas do leite materno. As mães de bebês prematuros produzem um leite especial, com maior teor protéico, de calorias, de sódio e menor de lactose do que o leite a termo (37 a 42 semanas de idade gestacional). As mães são constantemente orientadas para estimular a amamentação do bebê, sendo proibidos bicos, chupetas, chuquinhas e mamadeiras.
Quando é necessária alguma complementação alimentar, ou quando o bebê é incapaz de sugar, é oferecido leite por meio de seringas, copinhos ou conta-gotas. Na ausência do leite da própria mãe, deve-se utilizar os bancos de leite materno, evitando-se fórmulas industriais com base no leite de vaca, que podem ocasionar infecções intestinais e problemas alérgicos.
O calor proporcionado pelo corpo da mãe substitui o calor mecânico da incubadora, diminuindo os riscos de hipotermia e hipertemia, causadas por possíveis falhas nesses equipamentos. Caso haja necessidade de interrupção desse contato, seja pela ausência provisória da mãe ou por qualquer episódio de hipotermia, o recém-nascido permanecerá em berço aquecido até que se restabeleçam as condições ideais. Os bebês que necessitarem permanecer no berçário por qualquer patologia, receberão o calor materno em períodos de 30 a 40 minutos, várias vezes ao dia e no momento da amamentação.
O bebê só tem alta quando se encontra em condições clínicas estáveis, em regime de aleitamento exclusivo, apresentando curva de ganho ponderal ascendente, e a mãe estiver preparada para manejá-lo. Após a alta, a mãe é orientada a permanecer em contato com o bebê, até que este complete pelo menos um mês de vida, ou até que se cumpram as 40 semanas de gestação. Caso a mãe tenha alta antes do recém-nascido, e o hospital dispuser de vagas, ela é convidada a permanecer com o seu bebê até que ele também receba alta.
No período de internação hospitalar, na ficha de evolução do recém-nascido, são observados e relatados diariamente parâmetros como peso, temperatura, episódios de apnéia e aspiração, complementação alimentar, intercorrências clínicas, reflexos, tônus e posicionamento global, reflexos orais e coordenação destes com a respiração, sinais de estresse e participação e educação da mãe nos cuidados com o bebê.
No período pós-alta são realizadas consultas ambulatoriais, sendo o primeiro retorno agendado entre 48 e 72 horas após a alta. No primeiro mês de vida, são feitas avaliações semanais, no segundo e no terceiro, quinzenais e, a partir do terceiro, mensais, até o primeiro ano de vida. Nos retornos ambulatoriais são avaliados dados como peso, estatura e perímetro cefálico, desenvolvimento psicomotor, triagem auditiva, avaliação de patologias oculares, além de técnicas de amamentação, motivação para aleitamento materno, aspectos bio-psicossociais e familiares.
RECURSOS
Para implantar o Programa não é necessário nada além do que já exista num hospital que atende nascimentos prematuros. No caso do Hospital "Guilherme Álvaro" foram utilizados o espaço do alojamento comum e, num primeiro momento, a mesma equipe de profissionais.
A partir de 1992, o projeto passou a contar com uma equipe multidisciplinar composta de: fonoaudióloga; assistente social; psicóloga; terapeuta ocupacional; pediatras e enfermeiras-assistentes.
A implantação da UTI Pediátrica foi conseguida por meio de campanha realizada pela equipe responsável junto à Confederação das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) de Cubatão-SP, que se responsabilizou por conseguir verbas para o material necessário, promovendo um mutirão, que contou com a participação de funcionários das indústrias, que contribuíram com parte de suas horas extras, e a colaboração de indústrias, viabilizando a instalação das três incubadoras e respectivos implementos.
As demais destinações de recursos provêm da Secretaria de Saúde do Estado, responsável pela manutenção do Hospital.
DIFICULDADES
Uma das maiores dificuldades tem sido a não viabilização das visitas domiciliares, inicialmente previstas para o período pós-alta, que permitiriam identificar o meio em que vive a criança, orientações gerais, observação da aplicação do "Método Canguru" no domicílio e o comportamento do trinômio mãe-família-criança. Tal procedimento ainda não foi possível por falta de recursos para a aquisição de veículos, treinamento e pagamento de profissionais.
Outra grande dificuldade é a manutenção dos equipamentos da UTI Pediátrica, que foi instalada com recursos privados, não sendo, portanto, formalizada pelo Estado, que deixa de destinar verbas para tais fins.
RESULTADOS
O método "Mãe-Canguru" permite a humanização no atendimento, possibilitando ainda uma considerável redução nos custos hospitalares, na racionalização do uso de equipamentos e na melhoria da qualidade de vida, tanto da mãe quanto do bebê, diminuindo os índices de abandono, tão freqüentes nos casos de prematuridade.
Resgatando o contato íntimo entre mãe e bebê, o Programa restabelece o vínculo afetivo que pode ser rompido pelos métodos tradicionais de atenção a crianças prematuras. Assim, o desmame precoce e a rejeição materna podem ser evitados, já que as mães, muitas vezes, evitam investir numa relação que pode ser frustrada pela perda do bebê.
Desde a implantação do método, em 1991, até janeiro de 1999, houve acompanhamento de 266 bebês após a alta. Embora tenha havido um número maior de partos seu acompanhamento pós-alta não foi realizado, devido à distância da moradia de alguns pacientes. O atendimento é estendido a diversos municípios da Baixada Santista, pois o hospital é unidade de referência para gestantes de risco de toda a região.
Os recém-nascidos submetidos ao método tiveram oxigenação adequada, manutenção dos níveis de temperatura corpórea, baixa incidência de respiração periódica e apnéia, além do menor risco de bronco-aspiração.
Em conseqüência do uso desse método tem-se observado um melhor desenvolvimento neuro-psicomotor nos bebês que não sofreram asfixia neonatal nem desenvolveram seqüelas. Diminuindo o tempo de internação, diminui-se o risco de infecção hospitalar, muito freqüente em hospitais super-lotados.
CONTATO
Dr. Mário Alves Rosas, do Hospital Guilherme Álvaro
Rua Osvaldo Cruz, 197 – Santos – SP
Fones: (013) 220-1300/220-1337
Dra. Tereza Toma
Instituto de Saúde da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo
Fone: (011) 3105-9047/Ramal 211