Defesa civil municipal*
A criação de uma Comissão de Defesa Civil permite à prefeitura agir com rapidez em situações de emergência, minimizando as conseqüências das calamidades públicas.
Autor: Marco Antonio de Almeida
Auxiliar de pesquisa: Fábio Maleronka Ferron
Em situações de calamidade pública, como acidentes, incêndios, inundações, a prefeitura muitas vezes não sabe que atitude tomar para atender rapidamente as necessidades da população e minimizar os efeitos da catástrofe. A criação de uma Comissão Municipal de Defesa Civil (COMDEC) facilita a coordenação das ações de emergência e a distribuição de tarefas entre os diversos setores, além de estabelecer parcerias com órgãos não-municipais, centralizando informações e descentralizando ações preventivas, assistenciais, de socorro e recuperativas.
CRIAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO
A Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Governo do Estado de São Paulo sugere algumas providências que os governos municipais podem tomar para a criação e viabilização da COMDEC. A principal competência da COMDEC é o gerenciamento, em áreas urbanas, das emergências de origem natural ou tecnológica que requerem planos de ações abrangentes e com respostas imediatas, para atender satisfatoriamente as necessidades específicas de cada ocorrência.
A Defesa Civil precisa dar respostas rápidas às situações emergenciais. A criação e implementação da COMDEC vinculada diretamente ao Gabinete do Prefeito permite uma visão global do município e maior agilidade nas ações e na tomada de decisões. Além disso, há um ganho político, pois não privilegia nenhuma secretaria, evitando transtornos e desgastes para o administrador municipal.
Para a criação da COMDEC é importante envolver equipes multidisciplinares de técnicos da prefeitura, e também a iniciativa privada e a comunidade.
O ideal para funcionamento da COMDEC é que ela tenha estrutura suficiente para operar 24 horas por dia, ativando, inclusive, o código especial 199 – Disque Defesa Civil.
A colaboração dos diversos órgãos da prefeitura é fundamental para o trabalho da Defesa Civil, especialmente na prevenção e fiscalização. As áreas diretamente envolvidas são as de Serviço Social, Obras (estrutura operacional e máquinas) e Engenharia do Sistema Viário.
A fim de incentivar o serviço voluntário (agentes da Defesa Civil), obtendo a colaboração da população e envolvendo-a nas várias fases das ações da Defesa Civil (de prevenção, socorro, assistência e recuperação), podem ser criados mecanismos de incentivo tais como isenção do IPTU e de outras taxas.
Depois que a COMDEC estiver criada e estruturada, entre outros planos e programas, poderá:
1) investir na fase preventiva através de trabalhos de conscientização, perante a comunidade local, em vários tópicos: medidas para minimizar os efeitos das chuvas excessivas (enchentes e deslizamentos), emergência com gás de cozinha, drogas, acidentes no lar, acidentes de trânsito, etc.;
2) promover campanhas de impacto: vacinação, agasalho, poluição do ar, etc.;
3) promover a criação de Núcleos Comunitários de Defesa Civil – NUDECs, orientando-os em procedimentos a serem executados em áreas sujeitas a desastres, possibilitando maior agilidade nas intervenções da Defesa Civil, através da descentralização e regionalização dos trabalhos;
4) desenvolver o levantamento das áreas de risco do município, propondo soluções ao Executivo municipal para o enfrentamento dessas ameaças;
5) criar sistemas informatizados de cadastro de recursos públicos e privados, interagindo com planos de atendimento de emergências de Defesa Civil;
6) implantar a viatura educativa, equipada com recursos audiovisuais, como suporte para atividades educacionais e de prevenção.
EXPERIÊNCIAS
O programa de Defesa Civil da cidade de Campinas-SP (878 mil hab.) teve início em 1990, com a criação da COMDEC, encarregada de elaborar um plano de emergência para o município. Em 1993, essa comissão foi transformada em departamento, adquirindo quadro próprio, recursos e infra-estrutura.
A equipe é enxuta, com cerca de 30 integrantes, embora seja difícil encontrar pessoas que correspondam ao perfil requerido pelo trabalho. Conta também com cerca de 30 voluntários ("brigadistas civis").
A Defesa Civil de Campinas, além de atender à população 24 horas por dia através do telefone 199, desenvolve também uma série de programas de prevenção e fiscalização: produtos perigosos, radiação, planos de emergência para enchentes, para fogo em mata, para o aeroporto e outros. Recentemente, foi criado também o programa de defesa civil nas escolas, de caráter pedagógico.
Os recursos são uma frota de seis veículos, uma central de telefone com quatro linhas 199 (emergência), microcomputadores. O orçamento é coberto por recursos próprios, sem muita folga para investimentos
Em 1992, a Defesa Civil de Campinas atendeu 40.440 chamadas telefônicas e, em 1995, 113.536 chamadas.
As parcerias incluem o Corpo de Bombeiros, a Secretaria Municipal de Saúde, a Companhia Municipal de Águas, o Centro de Tecnologia do município, o Departamento de Parques e Jardins e a Secretaria Municipal de Obras. Há o projeto de um Centro de Treinamento, para capacitar os funcionários da Defesa Civil e também os brigadistas voluntários.
Em Santos-SP (419 mil hab.), foi criado o Programa de Enfrentamento de Riscos de Escorregamento nos Morros, com o objetivo de desenvolver ações e obras que eliminem ou minimizem as conseqüências de escorregamento de solo e rochas nos morros de Santos.
Pautados pela prevenção ao risco geológico, são desenvolvidos os seguintes programas: de Obras Públicas; de Saneamento Ambiental; de Planejamento, Controle e Ocupação Urbana nos Morros; de Apoio Financeiro às famílias em situação de risco; e o Programa Habitacional dos Morros: Plano Preventivo de Defesa Civil, operado anualmente de dezembro a abril.
Este trabalho permanente de prevenção é coordenado pela Administração Regional dos Morros, envolvendo diversas secretarias e órgãos municipais. Durante todo o ano são desenvolvidas ações integradas com as Secretarias de Saúde, Educação, Meio Ambiente e Assuntos Jurídicos.
Os Núcleos de Defesa Civil, organizados a partir da ação do poder público, são constituídos por cerca de 150 voluntários não-remunerados, treinados e equipados pela prefeitura. Durante o período das chuvas eles auxiliam nas vistorias de áreas de risco e na remoção preventiva de moradores em risco iminente. Esses voluntários, com o apoio do Conselho Internacional para Iniciativas Ambientais Locais (ICLEI), gerenciador do Programa Agenda 21-Local e ligado à ONU, deverão constituir brevemente uma Organização Não-Governamental.
DIFICULDADES
Podem ocorrer problemas, conflitos e limites para a implementação de um órgão como a Defesa Civil. A prefeitura, portanto, deve estar preparada para enfrentá-los. Por exemplo:
* Pressão da população, que quer ser atendida prontamente nas situações emergenciais, e congestionamento de linhas telefônicas, por insuficiência de troncos ou por acúmulo de funções que não são de competência do órgão. O telefone da Defesa Civil acaba atendendo, algumas vezes, outras demandas da população, especialmente a de mais baixa renda, devido ao horário de funcionamento (24 horas) e a gratuidade do serviço. Uma solução é empregar um número maior de pessoas no atendimento telefônico, integrando-o a outros serviços telefônicos da prefeitura.
* Desinformação da comunidade a respeito do serviço, por falta de divulgação.
* Podem surgir pressões políticas e desgastes com a imprensa. A condução dos processos de tomada de decisão de maneira transparente minimiza estas ocorrências.
* Chamadas falsas (trotes): o reconhecimento do serviço prestado e de sua importância podem levar a própria comunidade a fiscalizar este tipo de ocorrência, através de campanhas educativas.
DESLIZAMENTOS DE TERRA
Os meses de dezembro a abril trazem chuvas e preocupações para a população pobre que mora em áreas de risco sujeitas a deslizamentos de terra e rochas. A cada ano várias tragédias acontecem, deixando pessoas desabrigadas, feridas ou mortas, estradas interditadas, comunicações cortadas.
Desde o acidente recorde na Serra das Araras, no Rio de Janeiro, em 1967, que causou 1.700 mortes, até as ocorrências mais recentes em grandes centros urbanos como Salvador e Rio de Janeiro, estas imagens se repetem. Entre 1988 e o primeiro semestre de 1996, mais de 800 pessoas faleceram em acidentes deste tipo (veja gráfico).
O poder público municipal pode interferir nessa situação através de uma série de programas interrelacionados, envolvendo:
* monitoração preventiva das áreas de risco;
* controle das ocupações;
* programas habitacionais que possibilitem transferir a população que ocupa áreas de risco para locais seguros;
* programas de saneamento ambiental, como coleta de lixo, implantação de redes emergenciais de afastamento de esgoto, controle de erosão, preservação de áreas verdes, etc.;
* obras de contenção de encostas, drenagem, recuperação de escadarias, estabilização de blocos rochosos, etc.
O Programa de Enfrentamento de Riscos de Escorregamento nos Morros de Santos, através de uma série de ações conseguiu obter uma drástica redução das conseqüências dos escorregamentos. Implantado em 1989, ainda registrou 2 vítimas em 1990 e uma em 1992. Mas, embora continue sendo castigada por intensas chuvas, a cidade não registrou mais nenhuma ocorrência com pessoa ferida ou morta por acidentes associados a deslizamentos.
* Publicado originalmente como DICAS nº 61 em 1996.
Dicas é um boletim voltado para dirigentes municipais (prefeitos, secretários, vereadores) e lideranças sociais. Atualmente, seu acervo está publicado no site do Instituto Pólis.