Casa rosa mulher*
Esta é uma das cinco experiências premiadas como destaque no ciclo de premiação de 1996 do Programa Gestão Pública e Cidadania (iniciativa conjunta da Fundação Getúlio Vargas-SP e Fundação Ford).Adaptação, por José Carlos Vaz, do relatório de avaliação de Ana Alice Alcântara Costa (UFBA), elaborado para o Programa Gestão Pública e Cidadania.
Esta é uma das cinco experiências premiadas como destaque no ciclo de premiação de 1996 do Programa Gestão Pública e Cidadania (iniciativa conjunta da Fundação Getúlio Vargas-SP e Fundação Ford).Adaptação, por José Carlos Vaz, do relatório de avaliação de Ana Alice Alcântara Costa (UFBA), elaborado para o Programa Gestão Pública e Cidadania.
A Casa Rosa Mulher dá assistência a mulheres vítimas de violência doméstica, prostituição ou risco pessoal e social. Oferece ações de atendimento em saúde, psicologia, apoio jurídico e atividades educativas e formativas. Essas ações têm como orientação o resgate da auto-estima feminina e a promoção de ações de combate à exclusão social. É uma iniciativa da Prefeitura Municipal de Rio Branco-AC (197 mil hab.), gerenciada pela Secretaria Municipal do Trabalho e Bem-Estar Social. As atividades da Casa Rosa Mulher tiveram início em abril de 1994, mas a proposta surgiu bem antes, a partir da preocupação e tomada de consciência da sociedade local quanto à gravidade da situação das mulheres de Rio Branco vítimas da violência da prostituição.
AÇÕES
As ações empreendidas pela Casa Rosa Mulher visam resgatar a valorização da mulher e sua auto-estima, rompendo o ciclo da violência de que são vítimas e reconstruindo sua identidade de gênero. Para isto, oferece atendimento jurídico, social e psicológico; serviços em saúde e educação, além de atividades artísticas.
Com o apoio de uma equipe multidisciplinar (advogada, assistente social, psicóloga, enfermeira, médico, arte-educadora, etc.) a Casa Rosa Mulher quer atender três clientelas básicas: mulheres prostituídas, mulheres de baixa renda e adolescentes. Estes esforços se materializam através de ações como:
* serviço de assistência/atendimento individual ou em grupo;
* visitas domiciliares;
* campanhas de prevenção de DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis) e AIDS nos locais de trabalho e moradia, na rede pública de ensino, etc.;
* promoção da cidadania através do esclarecimento de seus direitos, da assessoria jurídica e do encaminhamento de ações judiciais;
* atendimento médico-ginecológico especializado;
* capacitação profissional: cursos de corte-costura, cabeleireiro, manicure, culinária, artesanatos de couro vegetal, etc; todos com um mercado promissor a ser explorado;
* informação anti-drogas;
* programas culturais e de lazer que propiciem a valorização e a auto-estima, como cursos de danças, teatro e capoeira;
* encaminhamento dos filhos das mulheres atendidas às escolas, creches e programas especiais para crianças e adolescentes mantidos pela Prefeitura.
RECURSOS
Desde a sua criação, a Casa conta com o apoio financeiro (através de projetos específicos) de organismos e programas do governo federal (Ministério da Cultura, Ministério de Bem-Estar Social, Ministério da Saúde, Comunidade Solidária), de organismos internacionais como o UNICEF e o Fundo Canadá, de diversas organizações não-governamentais (IBAM, CBIA, Rede Acreana de Mulheres, CDDHEP, SESC, SENAC, etc.). O gasto anual com o programa é da ordem de US$ 240 mil, sendo que o governo municipal responde por mais de 40% desse valor.
A equipe técnica e de apoio da Casa Rosa Mulher é mantida com recursos da Prefeitura. Os recursos provenientes de convênios são utilizados na compra de equipamentos, pagamento de instrutores e atividades específicas. Dada as características específicas do Projeto, voltado para assistência e capacitação de mulheres, é pouco provável que ele consiga se auto-sustentar, a perspectiva tem sido buscar parceiros não só para diminuir o peso orçamentário da Prefeitura, mas também para atingir um número cada vez maior de mulheres, e, assim, ampliar a abrangência do projeto.
PARCERIAS
Um ponto fundamental do sucesso da experiência foi a articulação, por parte da Prefeitura, de uma extensa rede de parceiros que se integraram ao projeto: Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação Popular do Acre, Rede Acreana de Mulheres e Homens, UNICEF, SESC/AC, Conselho da Comunidade Solidária, Secretaria Municipal de Saúde, Fundação Garibaldi Brasil, Ministério da Saúde, Ministério da Cultura, Universidade Federal do Acre.
A Casa Rosa Mulher conta com a participação ativa de várias organizações da sociedade civil. Seu próprio surgimento atende a uma demanda do movimento de mulheres acreanas, através desta entidades, e esta parceria tem sido mantida em suas atividades cotidianas. Um exemplo interessante dessa relação de colaboração é busca de recursos externos à Prefeitura. Isto é, sempre que uma determinada fonte financiadora restringe a concessão de recursos a programas governamentais, estas entidades parceiras solicitam e negociam os recursos para projetos que serão desenvolvidos pela Casa Rosa Mulher. Com essa prática é possível ter acesso a recursos vetados a programas públicos e, principalmente, realizar e implementar atividades articuladas e integradas entre poder público e sociedade civil.
Por outro lado, a ampliação do trabalho voluntário também é um instrumento importante no desenvolvimento da proposta da Casa Rosa Mulher. Vários profissionais se incorporam ao projeto na medida em que ele avança em legitimidade junto à sociedade acreana.
DIFICULDADES
Os responsáveis pela casa consideram a estrutura de apoio insuficiente para atender às necessidades. Há carências de equipamentos básicos, como carro, computador e outros. Do ponto de vista de recursos humanos, a principal dificuldade é o número reduzido de pessoal técnico especializado, que se soma à indefinição funcional dos técnicos e pessoal de apoio (alguns trabalham como prestadores de serviços).
A dependência orçamentaria da Prefeitura Municipal, é avaliada como uma dificuldade para a continuidade do programa, uma vez que a mudança na administração municipal pode interrompê-lo ou alterar sua forma de execução.
Do ponto de vista da sociedade, percebe-se que a população feminina local ainda não nas ações governamentais de atendimento à mulher. Entretanto, isto só se transformará dentro de um processo de mudança social, inevitavelmente longo.
Principalmente em seu primeiro ano de existência, o projeto enfrentou a oposição e os preconceitos da sociedade local. Os setores conservadores da cidade passaram a identificar a Casa Rosa Mulher com a prostituição, tomando-a como um motivo de ataque político à administração municipal. As "moças de família" não podiam freqüentar as atividades da casa para não serem confundidas com prostitutas.
INOVAÇÃO
O Programa Casa Rosa Mulher é a primeira experiência de política pública direcionada para as mulheres no Estado do Acre. Em toda a região norte não há registro de qualquer programa específico para as mulheres, além das Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher, com seus objetivos e áreas de abrangência limitados. Nem mesmo os Conselhos Estaduais e Municipais da Condição Feminina na região tem conseguido implementar propostas desta grandeza.
A Casa Rosa Mulher é uma proposta inovadora também nos seus objetivos, na sua prática de trabalho, na relação de parceria que tem estabelecido com sua clientela. Suas profissionais tratam com o mesmo carinho e respeito tanto a senhora de classe média que vem atuar no papel de cliente nos cursos de manicure, de cabeleireiro, quanto a prostituta enferma que vem em busca dos serviços de saúde.
Por outro lado a casa tem conseguido também acompanhar e buscar soluções para novas demandas que vão surgindo no desenrolar de suas atividades, um exemplo é a implantação de programas específicos voltados para as crianças : cursos de capoeira, grupos de leitura, fábrica de bonecos e atividades esportivas. Essa foi uma demanda das próprias crianças do bairro onde se localiza a Casa, ou de filhos das mulheres que freqüentam a Casa.
Veja também a experiência de Santos-SP.
RESULTADOS
Desde sua implantação, desde abril de 1994 até julho de 1996, a Casa Rosa Mulher realizou 2.902 atendimentos. Seu público é constituído por 45% de adolescentes e mulheres prostituídas, 30% de mulheres de baixa renda, 15% de crianças e adolescentes que vivem em situação de risco social e 10% de mulheres em situação de violência.
A experiência da Casa Rosa Mulher pode ser considerada um grande sucesso na área de políticas públicas voltadas para as mulheres, e pode ser reproduzida nas grandes e médias cidades, onde a população feminina vive à margem do processo de criação de riquezas.
Desde sua implantação, pode-se verificar a transformação da Casa em um ponto de referência efetiva no trabalho com mulheres e adolescentes. O crescente respeito e reconhecimento por parte da comunidade é evidenciado pelo aumento da demanda, a ampliação do número de trabalhadores voluntários e do de parceiros e entidades conveniadas.
O sucesso da Casa levou a Prefeitura a reconhecer a importância da implantação de políticas públicas específicas para as mulheres, em particular voltadas para a valorização da mulher marginalizada, em situação de violência e de baixa renda.
A utilização de mecanismos de contato inovadores e não repressivos, por conta do desenvolvimento de métodos de trabalho adequados, permitiu um atendimento que valoriza a cidadania. Reforçou-se, com isto, o contato do poder público com mulheres marginalizadas, além de propiciar um relacionamento mais humanitário e menos preconceituoso por parte de um organismo público em relação às mulheres profissionais do sexo e dos setores populares.
A implementação de programas preventivos (DST/AIDS, combate à violência, conscientização sobre o uso de drogas) com as populações mais vulneráveis, a preocupação em capacitar mulheres para que sejam incorporadas ao mercado de trabalho e a constituição de um ponto de referência para as mulheres em situação de violência também podem ser apontados como resultados positivos do programa no desenvolvimento de sua consciência de cidadania.
COMPOSIÇÃO DO PÚBLICO ATENDIDO
PELA CASA ROSA MULHER
ADOLESCENTES E MULHERES PROSTITUÍDAS |
45% |
MULHERES DE BAIXA RENDA |
30% |
CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM RISCO SOCIAL |
15% |
MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA |
10% |
Fonte: Prefeitura Municipal de Rio Branco
* Publicado originalmente como DICAS nº 70 em 1996