Incluir na legislação urbanística a opção de conjuntos residenciais horizontais permite a elaboração de projetos mais baratos que lotes unifamiliares e edifícios de apartamentos.Autores: Ricardo S. Moretti e José Carlos Vaz

Incluir na legislação urbanística a opção de conjuntos residenciais horizontais permite a elaboração de projetos mais baratos que lotes unifamiliares e edifícios de apartamentos.Autores: Ricardo S. Moretti e José Carlos Vaz

Em muitas cidades brasileiras, a legislação urbanística dificulta ou impossibilita a construção de moradias do tipo condomínio horizontal. O excesso de restrições estabelecidas pelo poder público limita a adoção de soluções criativas por parte dos projetistas. Com isto, as opções de empreendimentos habitacionais ficam restritas à construção de edifícios de apartamentos ou unidades unifamiliares totalmente isoladas em lotes mínimos relativamente grandes.

A seguir é apresentado um exemplo de projeto de lei de condomínios horizontais, que pode ser adaptado para as particularidades de cada município. Sua elaboração baseia-se no princípio de que a legislação urbanística deve buscar regulamentar os aspectos do empreendimento que digam respeito à coletividade (impactos no trânsito, na infra-estrutura urbana e nas condições de vida da vizinhança) e à salubridade das habitações, deixando a cargo dos projetistas e moradores as decisões relativas a padrões de conforto, uso de espaços comuns, áreas de circulação e outras, de caráter privado.

O modelo de projeto apresentado permite a construção de conjuntos residenciais horizontais, sob regime de condomínio. O porte dos condomínios varia bastante: podem ser construídos desde pequenos conjuntos do tipo "vila", com menos de seis unidades, até empreendimentos de 160 unidades, constituídos de edifícios de até três pavimentos.

As edificações não podem possuir mais do que nove metros de altura. Combinada a esta exigência, estão a restrição da taxa de ocupação em 50% da área do lote (ou seja, no máximo metade do terreno será edificado) e a limitação da área construída total à mesma metragem do terreno (ou seja, a soma das áreas dos pavimentos construídos, incluindo as unidades, garagens subterrâneas e espaços construídos de uso comum não poderá superar a área total do lote). Por fim, é limitada em 62,5 metros quadrados a quota mínima do terreno por unidade habitacional (divisão da área total do lote pelo número de moradias).

Como exemplo, tem-se que um terreno de 1.250 metros quadrados comportará, no máximo, 20 unidades geminadas ou superpostas em um ou mais edifício de dois pavimentos, que ocuparão, no máximo, 625 metros quadrados de área do terreno com área construída total de 1.250 metros quadrados. Se forem construídos edifícios de três pavimentos, a área do terreno ocupada pelas edificações se reduzirá, pois a área construída não pode exceder a do terreno.

PROJETO DE LEI

Dispõe sobre a criação de categoria de uso residencial: Conjunto Residencial Horizontal.

Artigo 1º – O Conjunto Residencial Horizontal é constituído por unidades habitacionais isoladas, agrupadas, geminadas ou superpostas, em condomínio, sendo permitido nas zonas de uso que admitem uso residencial.

Artigo 2º – Todas as unidades habitacionais do Conjunto Residencial Horizontal deverão ter altura inferior a 9 metros, definindo-se altura, para efeito desta Lei, como a maior diferença de cota entre qualquer ponto da edificação e o perfil original do terreno no ponto considerado.

Artigo 3º – O Conjunto Residencial Horizontal somente poderá ser implantado em lotes com área igual ou inferior a dez mil metros quadrados, devendo ainda atender às seguintes disposições:

I – A quota de terreno por unidade habitacional, obtida pela divisão entre a área total do lote e o número de unidades habitacionais a construir, deverá ser igual ou superior a 62,5 metros quadrados.

II – A taxa de ocupação máxima será de 50% e a área construída total do empreendimento não deverá ser superior à área do lote.

III – Para cada unidade habitacional deverá ser prevista pelo menos uma vaga de estacionamento dentro da área do lote, podendo ser aceita vaga de estacionamento em superfície ou subterrânea.

IV – O acesso às unidades habitacionais deverá ser feito através de via particular, de pedestres ou de veículos, interna ao conjunto, devendo a via de pedestres ter largura mínima de 3 metros;

V – Nos casos de unidades superpostas, a escadaria de acesso poderá atender mais de uma unidade, desde que obedecidas as dimensões mínimas previstas no Código de Edificações.

VI – Serão aplicadas as exigências de recuo de frente, lateral e de fundos correspondentes à zona em que será construído o Conjunto Residencial Horizontal para o lote como um todo, dispensando-se os recuos entre edificações do conjunto e entre as edificações e as vias internas, desde que obedecidas as prescrições do Código de Edificações relativas às condições mínimas de iluminação, insolação e ventilação de cada unidade habitacional.

VII – A edificação com altura superior a 7 metros deverá atender a um recuo mínimo de 3 metros com relação às divisas do lote.

VIII – No mínimo 15% da área do Conjunto Residencial Horizontal deverá ser mantida permeável.

Artigo 4º – O Conjunto Residencial Horizontal destina-se exclusivamente à implantação de unidades habitacionais, não sendo admitida a instalação de outros usos.

Artigo 5º – O Conjunto Residencial Horizontal só poderá ser implantado em lotes que tenham frente e acesso para vias oficiais de circulação com largura igual ou superior a 10 metros, com a exceção do caso previsto no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único – Admitir-se-á a implantação do Conjunto Residencial Horizontal em vias oficiais de largura inferior a 10 metros quando estiver previsto estacionamento de visitantes no interior do lote, na proporção mínima de uma vaga de estacionamento para cada duas unidades habitacionais.

Artigo 6º – Será permitida a implantação de Conjunto Residencial Horizontal de caráter evolutivo, construindo-se na etapa inicial apenas o embrião da edificação, desde que:

I – seja apresentado e aprovado o projeto da edificação completa;

II – seja emitido certificado de conclusão parcial das obras correspondentes ao embrião.

Artigo 7º – O projeto do Conjunto Residencial Horizontal deverá indicar:

I – arborização e tratamento paisagístico das áreas comuns não ocupadas por edificações;

II – drenagem das águas pluviais;

III – sistema de coleta, tratamento e disposição de águas servidas e esgotos;

IV – instalação para disposição de lixo, no interior do lote, junto à via pública.

Artigo 8º
– Os espaços de uso comum, as áreas de estacionamento e as vias internas de circulação de veículos e pedestres serão considerados bens de uso exclusivo do Conjunto Residencial Horizontal, sendo sua manutenção de responsabilidade do conjunto de moradores.

EXPERIÊNCIA
Em S. Paulo-SP (9.646 mil hab.), foi criada recentemente a categoria de uso residencial conjunto residencial horizontal – vila (Lei n.º 11.605/94 regulamentada pelo Decreto n.º 34.740/94), Baseando-se nas concepções apresentadas no projeto de lei acima. Além das normas gerais apresentadas aqui, a lei e o decreto trazem algumas regulamentações adicionais, principalmente com respeito à circulação interna ao conjunto.

A mudança na legislação resultou de um processo de discussão envolvendo órgãos de habitação e planejamento da prefeitura, vereadores, urbanistas e representantes dos empreendedores imobiliários, a partir da iniciativa de um vereador da oposição, com apoio de técnicos do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas).

Com a nova lei, passa a ser possível a construção de empreendimentos do tipo conjunto residencial horizontal, com edificações como pequenos edifícios de até três pavimentos, sobrados, moradias isoladas ou casas geminadas. Também é estimulada, pela nova lei, a implantação de empreendimentos do tipo vila residencial, que desde os anos 60 foram objeto de restrição da legislação do município.

RESULTADOS

Os conjuntos residenciais horizontais permitem combinar uma boa qualidade de arquitetônica com a otimização da infra-estrutura disponível. Oferecem uma solução entre os lotes unifamiliares (que só fornecem boa qualidade de vida à custa da baixa densidade de ocupação) e os edifícios de apartamentos (com alta densidade habitacional mas acompanhados de uma série de conflitos de uso e sobrecarga da infra-estrutura).

É possível ampliar posteriormente as casas, com a implantação de moradias do tipo embrião, o que é especialmente importante para programas habitacionais voltados a população de baixa renda.

Em termos de custo, é possível realizar empreendimentos com custo unitário de construção bastante inferior ao de edifícios de apartamentos. O uso de terreno por unidade, no entanto, é maior, o que pode tornar pouco atraentes empreendimentos em regiões onde o custo da terra seja especialmente elevado, ainda que para a grande maioria das cidades brasileiras de médio e grande porte este problema afete apenas uma parcela pequena de sua área urbana.

A construção de conjuntos habitacionais horizontais permite, também, a abertura de novas possibilidades de investimento para o pequeno capital, reduzindo o poder das grandes empresas construtoras no mercado imobiliário local. Além disso, cria condições para que grupos organizados promovam soluções comunitárias de produção de moradia, através de cooperativas e mutirões.

Esses grupos podem adquirir terrenos e neles implantar conjuntos residenciais horizontais com a vantagem de não se exigir um número alto de participantes.
 

CUSTO UNITÁRIO DE
UNIDADE HABITACIONAL*
US$
Edifício de apartamentos 31.059
Condomínio horizontal 20.353

* Unidade de 50m2, mais garagem para automóvel, com custo do terreno de US$ 71/m2
Fonte: Ricardo S. Moretti


* Publicado originalmente como DICAS nº 33 em 1995Dicas, é um boletim voltado para dirigentes municipais (prefeitos, secretários, vereadores) e lideranças sociais. Os textos buscam oferecer informações sobre técnicas e práticas de gestão que contribuam para o avanço da democracia, otimização da aplicação e uso dos recursos públicos, promoção da cidadania e melhoria da qualidade de vida.