Ações inovadoras da prefeitura na área do Abastecimento, oferecendo alimentos mais saudáveis e baratos, dinamizam a economia local e melhoram a qualidade de vida dos cidadãos.
Autor: Marcos Antonio de Almeida
Consultora: Christiane Costa

Ações inovadoras da prefeitura na área do Abastecimento, oferecendo alimentos mais saudáveis e baratos, dinamizam a economia local e melhoram a qualidade de vida dos cidadãos.
Autor: Marcos Antonio de Almeida
Consultora: Christiane Costa

No Brasil há profundas contradições no que se refere à distribuição de alimentos. Embora seja um dos maiores produtores agrícolas mundiais, grande parcela de sua população não tem acesso à quantidade mínima de alimentos necessária para o seu sustento.

Nesse contexto, é importante que o município invista numa política de abastecimento. O acesso à alimentação deve ser garantido de modo permanente e duradouro, como bem público e direito de cidadania, pois dele dependem a vida e a saúde também das gerações futuras.

Uma política de abastecimento deve ter basicamente dois objetivos:

1- diminuir o preço e aumentar a oferta e a qualidade dos produtos, e
2- apoiar o pequeno produtor agrícola.


INSTRUMENTOS

O poder público municipal conta com vários instrumentos para melhorar o quadro de abastecimento local. Entre os mais simples e menos dispendiosos estão aqueles que diminuem os preços e melhoram a qualidade da comercialização dos alimentos, especialmente no que se refere à normatização e fiscalização de feiras-livres, supermercados e indústrias alimentícias.

Nessa linha pode ser incluída a criação de um serviço de informação ao consumidor. Em Belo Horizonte-MG (2.060 mil hab.), a SMAB (Secretaria Municipal de Abastecimento) divulga – através da imprensa, do Jornal do Ônibus e do serviço telefônico Disque-Economia – os preços, permanentemente atualizados, de uma cesta básica composta por 45 itens, e identifica os estabelecimentos onde é menos dispendiosa.

Outra iniciativa, também da prefeitura de Belo Horizonte, é apoiar a formação de grupos de compra comunitários que, adquirindo alimentos em grandes quantidades, obtém preços mais baixos. A implantação destes grupos é acompanhada por técnicos da SMAB, que fornecem informações sobre produtos de safra e pesquisas de preços em vários estabelecimentos da cidade.

Ainda no âmbito da comercialização de alimentos, um dos problemas encontrados na maioria dos municípios é a concentração de supermercados e feiras-livres nas regiões centrais da cidade. Os bairros periféricos, onde há poucos estabelecimentos comerciais, enfrentam duplo problema: sua distância do centro, dificultando o deslocamento das pessoas até os lugares onde são vendidos gêneros básicos a preços menores; e a pequena demanda, decorrente do baixo poder aquisitivo da população, inviabilizando economicamente a instalação de sacolões fixos ou feiras-livres.

O sacolão verde, experiência implementada em Santo André-SP (627 mil hab.) durante o período 89-92, buscou superar este problema. Dois ônibus, previamente adaptados, comercializavam hortifrutigranjeiros e produtos da cesta básica, abastecendo regiões distantes do centro. Em Belo Horizonte foi criado o Comboio do Trabalhador, com pontos móveis de venda, que nos fins de semana vão até a periferia. Além de atender às regiões mais distantes, o programa melhora o acesso da população carente, na faixa de um a três salários mínimos, aos gêneros alimentícios básicos.

A prefeitura também pode criar equipamentos públicos como sacolões, mercados municipais e feiras-livres, que melhoram o abastecimento, descentralizam os serviços e aumentam a oferta.

O Horto Shopping Ouro Verde, em Campinas-SP (879 mil hab.), é um bom exemplo de descentralização de serviços para melhor atender à população. Ele foi construído anexo a um terminal de ônibus, no qual circulam cerca de 60 mil pessoas por dia, na zona oeste do município.

O Horto Shopping conta com 43 permissionários que oferecem, além de diversos tipos de alimentos, outras mercadorias e serviços, inclusive públicos (há postos da Companhia de Saneamento Municipal, do INSS, da Telesp). A obra foi realizada em parceria: a prefeitura cedeu o terreno e a Companhia Municipal de Abastecimento executou a obra, com financiamento dos futuros permissionários.

O Horto Shopping permite a realização de compras sem que a população tenha que se deslocar até o centro da cidade, graças à diversidade de serviços oferecidos a preços acessíveis. Outra vantagem é que os usuários de ônibus, ao fazerem compras sem sair do terminal, não precisam pagar outra passagem.

O apoio à produção local é outra função importante que pode ser desempenhada pela prefeitura. Podem ser ações que diminuem o grande número de intermediários entre a produção e o consumo final, como as desenvolvidas em Belo Horizonte através dos projetos Direto da Roça e Campanha da Safra. Os dois programas facilitam a negociação entre produtores e a população, melhorando os preços finais para ambos.

Brasília-DF (1.673 mil hab.) implantou o PROVE (Programa de Verticalização da Pequena Produção Agrícola), com a finalidade de inserir na economia local o pequeno produtor de alimentos, de base familiar e com baixa renda, incentivando as mini-agroindústrias. A Secretaria de Agricultura oferece quatro diferentes kits em placas de cimento pré-moldado, de áreas variáveis (de 13,96 m2 a 55,26 m2) e criou uma linha de crédito para o pagamento dos kits. Além disso, fornece cursos, treinamento e assessoria para os pequenos produtores. Implantado em outubro de 1995, em um ano contava com 446 produtores cadastrados, 40 indústrias em construção e 32 em funcionamento. A renda média per capita subiu de R$ 50,00 para R$ 200,00 a partir do segundo mês de funcionamento, e cada agroindústria absorve, em média, seis empregos.

Outra iniciativa que está ao alcance da prefeitura é incentivar a produção caseira de alimentos. É o caso de experiências bastante conhecidas, como as hortas caseiras e escolares. Também em Belo Horizonte, foi implementado um programa de incentivo aos pomares caseiros, o Pró-Pomar, que distribui mudas de árvores frutíferas. Além de melhorar as condições nutricionais das famílias, este tipo de iniciativa repercute em outros problemas urbanos, ajudando, por exemplo, na arborização da cidade, o que diminui a impermeabilização desnecessária de várias áreas e, assim, ajuda diretamente no escoamento da água das chuvas.

No caso de municípios com forte presença rural, é importante e estratégico desenvolver ações que possibilitem a inserção de trabalhadores do campo na dinâmica econômica do município. Um exemplo desse tipo de política é o Pólo Agroflorestal de Rio Branco-AC (196 mil hab.).

Desenvolvido pela prefeitura em parceria com a EMATER, FUNDAC, Ministério do Meio Ambiente e SUDAM, o Pólo Agroflorestal é um modelo de assentamento agrícola baseado na implementação de uma infra-estrutura básica. O programa possibilita que ex-agricultores e ex-seringueiros retornem ao meio rural e se reintegrem à sua profissão original, dedicando-se ao manejo de culturas permanentes para comercialização e produção de subsistência.

Uma área importante, que merece toda a atenção da prefeitura, é a da merenda escolar. Deve contar com o acompanhamento de nutricionistas que garantam a qualidade das refeições. A descentralização da aquisição de gêneros alimentícios, através de núcleos regionais (aliada aos programas de incentivo à produção local) pode garantir alimentos saudáveis e mais baratos. Além de fornecer alimento às crianças em fase de crescimento, os programas de merenda escolar podem oferecer também atividades de educação alimentar, como as desenvolvidas no Programa Pé-de-Moleque, de Belo Horizonte, que envolveu os alunos através de vídeos e atividades lúdico-educativas.

Finalmente, a prefeitura pode oferecer alimentação a baixo custo para a população mais pobre, através de restaurantes populares, como o de Belo Horizonte. O restaurante serve diariamente cerca de 2.500 refeições, e os cardápios variados são controlados nutricionalmente pela Secretaria Municipal de Abastecimento. O público que o freqüenta encontra-se na faixa de renda de 1 a 3 salários mínimos.

PARTICIPAÇÃO POPULAR
A fundação de um Conselho Municipal de Abastecimento ajuda a envolver a população e o setor privado na criação e aplicação de mecanismos de estabilização de preços, e de normatização e regulamentação do abastecimento.

Na mesma perspectiva do Conselho Municipal, mas atuando de forma mais localizada, pode-se propor o gerenciamento participativo de feiras, sacolões e outros equipamentos de abastecimento, através de um Conselho de Usuários. Para tanto, além de mobilizar lideranças informais nas comunidades, é preciso oferecer-lhes formação no que se refere à classificação e manuseio dos produtos. Deve ser criada uma rotina de trabalho que inclua participação periódica na fiscalização das feiras, sacolões e demais equipamentos, seguidas de reuniões de discussão e avaliação.

PARCERIAS
As ações da prefeitura contam com um arco amplo de parceiros possíveis, de pequenos produtores a distribuidores, permissionários do serviço público (especialmente no caso dos Ceasas), supermercados, etc. Podem ser estabelecidas parcerias também com secretarias da própria administração municipal ou outros órgãos públicos, estaduais e federais.

Outra iniciativa importante é a constituição de consórcios municipais. A atuação conjunta em âmbito regional pode ampliar a oferta de alimentos e reduzir seus preços.

No caso do combate à fome e à desnutrição, é fundamental envolver ao máximo a sociedade civil. Um exemplo de como esse envolvimento pode se dar é o ISA (Instituto de Solidariedade para Programa de Alimentação), uma parceria entre Ceasa-Campinas e diversas entidades da sociedade civil. O ISA, um dos maiores centros de processamento de alimentos do País, ocupa um terreno permissionado pelo Ceasa através de um contrato de 40 anos. Na linha de produção, a capacidade máxima para processar alimentos, doados pelos permissionários do Ceasa, está na ordem de 50 a 70 toneladas mensais. Isto permitirá produzir inicialmente 10 mil pratos de refeição por dia, distribuídos em forma de kits às entidades sociais filiadas ao ISA e às unidades das redes municipais de ensino e de saúde. O ISA também beneficiará as famílias carentes encontradas nos bolsões de miséria de Campinas e cadastradas pelas administrações regionais. Outra meta é realizar cursos profissionalizantes na área de alimentação.

Programas de combate à desnutrição e de complementação alimentar são outra forma da prefeitura garantir que a população de baixa renda tenha acesso à alimentação. Nesse caso, convênios entre as secretarias de Abastecimento, Saúde e Ação Social são recomendáveis, pois potencializam as ações do poder público, como a distribuição de alimentos em creches e postos de saúde.

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* Publicado originalmente como DICAS nº 78 em 1997
Dicas, é um boletim voltado para dirigentes municipais (prefeitos, secretários, vereadores) e lideranças sociais. Os textos buscam oferecer informações sobre técnicas e práticas de gestão que contribuam para o avanço da democracia, otimização da aplicação e uso dos recursos públicos, promoção da cidadania e melhoria da qualidade de vida.

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