Morre o jornalista econômico Biondi
Brasil perde, vítima de complicações cardíacas, Aloysio Biondi, 64 anos, uma das principais opiniões econômicas do país.
Morre o jornalista econômico Biondi *
Udo Simons
Da equipe do Correio
São Paulo — O jornalismo brasileiro está de luto nesta semana. Uma das principais opiniões econômica e política do país, o jornalista e colaborador do Correio Braziliense, Aloysio Biondi, 64 anos, morreu ontem, vítima de complicações cardíacas e do rompimento da veia aorta abdominal, no hospital da Beneficência Portuguesa, em São Paulo. Quando seu corpo for enterrado, hoje, às 10 da manhã, no cemitério da Paz, zona sul da capital paulista, a crítica brasileira estará orfã.
‘‘Biondi foi o mais importante jornalista de economia do Brasil’’, garante o jornalista Jânio de Freitas. A trajetória profissional dele é um exemplo para os colegas. Nasceu em Caconde, no interior de São Paulo, em 1936, em uma família de comerciantes. Concluiu o segundo grau e abandonou os estudos. Tentou no final da década de 50 cursar filosofia, mas desistiu do curso. Não teve formação universitária, mas isso nunca foi demérito em seu currículo.
Em 1956, aos 20 anos, foi contratado como redator e editor-assistente de economia da Folha de São Paulo. Começou, então, uma carreira brilhante. Percorreu as grandes redações de jornais e revistas especializados em economia no país. Assumiu a secretaria de redação da Folha em 1966. Tornou-se editor de economia da revista Visão em 1967. No ano seguinte, assumiu a direção da revista Fator. Dois anos depois, era editor de economia da Veja.
A lista é longa. Até a década de 90, ele levou seu olhar crítico e observações precisas aos principais veículos de comunicação impressa do país. Vencedor de três prêmios Esso, a mais prestigiada premiação jornalística brasileira, nunca perdeu a simplicidade e o empenho no trabalho. ‘‘Ele trabalhava sem parar’’, lembra Marco Antonio Araujo, coordenador do curso de jornalismo da Faculdade Casper Líbero, onde Biondi dava aulas de edição de jornais. ‘‘Há dois anos, recebeu o prêmio de Notório Saber da faculdade. Foi a forma encontrada para homenagear todo o esforço em ensinar aos futuros profissionais’’, diz Marco Antonio.
Há oito anos separado de sua única mulher, Ângela, morava em um apartamento alugado, sem luxos, com o amigo Édson Nunes, que o considerava um segundo pai. Sua mania era a de colecionar jornais. Juntou pilhas e pilhas e nunca deixava ninguém jogá-los fora. Adorava cozinhar para os filhos, Pedro, Antônio e Bia. Quando eles iam visitá-lo, isso acontecia com freqüência, desdobrava-se em atenções. ‘‘Os filhos de Biondi eram sua grande paixão’’, revela Marco Antonio.
AVESSO À MODERNIDADE
Biondi levou muito tempo para começar a escrever seus artigos e matérias no computador. Há apenas seis meses tentava se adaptar ao que ainda considerava modernidade. Bem humorado, não abria mão das rodas de chopp às sextas-feiras. Era um dos poucos encontros sociais de Biondi, que detestava restaurantes e bares sofisticados. Sua preferência eram os botecos. Para os amigos dizia que mesa de bar não podia ter toalha.
Sua morte pegou a todos de surpresa. Sempre escondeu suas doenças. Nem sua ex-mulher e filhos sabiam de seus problemas de saúde. Na noite de quinta-feira, quando sentiu uma forte dor nas costas e passou mal, Édson foi o primeiro a socorrê-lo. Biondi foi levado às pressas para uma clínica particular próxima a sua casa. Seu filho, Pedro, foi chamado e acompanhou as últimas horas do pai. Da clínica, foi transferido para o Hospital da Beneficência Portuguesa com diagnóstico de problemas renais. No hospital, ao dar entrada, às 20h30, ao contrário do diagnóstico da clínica, foi constatada ruptura da aorta abdominal. O quadro clínico dele piorou durante a madrugada provocando complicações cardíacas e, às 9h30 de ontem, foi constatada sua morte clínica.
Seu corpo foi velado na capela do hospital. O sindicato dos jornalistas de São Paulo preparou para hoje uma homenagem a Biondi. Os alunos da faculdade Cásper Líbero, nesta próxima semana, decidem como homenagearão o antigo professor.
Workahoolic assumido, Biondi vivia para o trabalho. Acordava cedo e só dormia de madrugada. Lia, no mínimo, cinco jornais por dia e escrevia colunas para mais de dez jornais no Brasil. Fazia comentários em sites na Internet, mantinha uma coluna de análise econômica diária no jornal paulistano Diário Popular e colaborava com jornais e publicações de sindicatos. No Correio Braziliense, estreou seu artigo semanal, publicado todas às quartas-feiras, com o novo projeto editorial lançado em 2 de julho.
Ano passado, a Fundação Perseu Abrahmo publicou, em maio, o único livro dele — O Brasil Privatizado, obra que já vendeu 140 mil exemplares e critica os processos de privatização no governo Fernando Henrique.
Em sua última coluna publicada no Correio na quarta-feira passada, Biondi fala sobre os inúmeros casos bilionários de corrupção envolvendo homens públicos e governantes em vários países do mundo. E faz uma reflexão sobre o assunto, onde conclui que a impunidade é a maior responsável por destruir um país.
* Publicado no Correio Brasiliense de 22/07/2000