” Muita gente, ao ver tudo isso sendo revelado pela imprensa, fica decepcionada com o Congresso e com a política de modo geral.”



Há um clima de deterioração em Brasília. Três senadores com papel fundamental na base do governo FHC, Jader Barbalho, do PMDB, José Roberto Arruda, até recentemente do PSDB, e Antonio Carlos Magalhães, do PFL, estão envolvidos em escândalos que têm deixado boquiaberta a opinião pública.

A reação a tal situação está se intensificando no Senado e na Câmara. Cada vez mais, tudo indica que a oposição conseguirá as assinaturas necessárias para implantar a CPI da Corrupção. Pelo menos 11 casos graves de denúncias no governo FHC não foram investigados: Sivam (maio de 95), Proer (novembro de 95), Pasta Rosa (fevereiro de 96), precatórios (novembro de 96), grampo do BNDES (maio de 97), Dossiê Cayman (novembro de 98), auxílio aos Bancos Marka e FonteCidan (janeiro de 99), sobras de campanha de FHC e Eduardo Jorge (julho de 2000). Sem falar na lama que atualmente inunda o Senado, a começar por seu presidente, Jader Barbalho (casos Banpará e Sudam).

A crise política que toma conta do governo brasileiro assemelha-se àquelas enfrentadas por outros países que adotaram modelos econômicos subordinados às políticas neoliberais, em especial na América Latina. Como no Peru, ou na Argentina, a adoção cega do receituário do Consenso de Washington só fez frear o crescimento econômico, ao mesmo tempo em que promoveu aumento significativo da desigualdade, do desemprego, da violência e, sobretudo, da corrupção.

No Brasil, a situação está chegando ao limite. Basta ver como as mentiras se multiplicam na boca dos acusados de envolvimento na violação do painel. Do jeito que está, só resta aguardar a acareação de ACM, Arruda e Regina Borges.

A confissão de Arruda, admitindo que induziu a ex-diretora do Prodasen a violar a votação secreta do Senado, a pedido de ACM, é mais um sinal da grave crise política que envolve o governo. ACM nega ter feito o pedido a Arruda, embora reconheça que ele lhe levou a lista com a revelação dos votos. Admite também que leu a lista e que telefonou, na ocasião, para Regina.

Arruda, ex-líder do governo no Senado, mentiu enfaticamente à nação e, cinco dias depois, se “desmentiu” de modo igualmente convicto. Tudo isso com transmissão nacional pela TV. Ficou evidente que a confissão, aparentemente ainda parcial, só veio a público depois do contundente depoimento da ex-diretora do Prodasen. O senador chorou, mas nem sequer renunciou. Se a moda pega, para manter a impunidade no Brasil basta chorar.

O presidente FHC se apressou em elogiar a confissão do ex-líder do governo, engrossando o coro dos que querem evitar sua cassação. Mesmo assim, ele foi levado a se desligar do PSDB.

É interessante notar que, em sua confissão, Arruda mencionou de passagem já ter servido ao governo com lealdade em situações muito mais graves do que a violação do painel do Senado. Resta imaginar que espécie de situação pode ter sido mais grave do que essa e quantos “chorões” ainda podem aparecer por aí.

A CPI da Corrupção vai se mostrando cada vez mais necessária e também inevitável politicamente. Como os congressistas que ainda insistem em apoiar o governo podem encarar de cabeça erguida seus eleitores em seus Estados de origem? Além da intensificação das ações no Congresso, acredito que é imprescindível a mobilização ampla da opinião pública contra as tentativas de abafar esse escândalo que compromete em definitivo o governo FHC e os partidos que lhe dão sustentação.

Muita gente, ao ver tudo isso sendo revelado pela imprensa, fica decepcionada com o Congresso e com a política de modo geral. É exatamente isto o que muitos conservadores e corruptos querem que o povo pense: que todos os políticos e todos os partidos são iguais. Mas isso não é verdade.

A lição que essa crise deixa é que precisa ocorrer nas eleições de 2002 para Câmara e Senado o que se deu com os vereadores corruptos de São Paulo no ano passado. A grande maioria deles foi varrida pelo voto e houve uma significativa renovação política e ética na Câmara Municipal. Tratou-se de um aviso, entre muitos que vêm ocorrendo país afora: a política brasileira está mudando.


*Luiz Inácio Lula da Silva, presidente de honra do Partido dos Trabalhadores e conselheiro do Instituto Cidadania.