Gustavo Venturi faz uma análise a respeito das primeiras pesquisas de intenção de voto, da evolução das candidaturas petistas e do cenário político-econômico nacional instaurado pelo governo Lula.

Cenário nacional favorece candidaturas petistas

Entrevista com Gustavo Venturi*

Por Michelle Rusche

1 – Qual a sua avaliação das primeiras pesquisas oficiais de intenção de voto para o PT?

Se fizermos uma retrospectiva, vamos observar três momentos diferentes. Até o fim de 2003, havia uma euforia muito grande em função da vitória de Lula e com a alta credibilidade do governo federal, o que fez com que alguns analistas acreditassem que haveria uma avalanche de vitórias do PT nas eleições deste ano. Em fevereiro de 2004, nos deparamos com as denúncias contra Waldomiro Diniz, funcionário da Casa Civil da Presidência da República, gerando um momento de paralisia do governo, seguido pelo desgaste do baixo reajuste do salário mínimo. A popularidade do governo Lula caiu, e esse cenário levou a prognósticos, também precipitados, bastante pessimistas a respeito do desempenho do PT nas eleições deste ano.

Na verdade, a popularidade do governo federal tinha começado a cair já no início deste ano, independentemente do episódio Waldomiro. É importante lembrar que, historicamente, até próximo das eleições de 2002, o PT nunca tinha ultrapassado um terço do eleitorado, e logo em seguida Lula seria eleito com quase dois terços. Era esperado, portanto, que muitas pessoas que aderiram à candidatura Lula de última hora tivessem expectativas de mudanças a curto prazo.

De qualquer forma, a partir de julho, com a poeira da denúncia Waldomiro e do aumento do mínimo assentadas, e com a economia começando a dar sinais de reação, entramos em um terceiro momento – uma situação intermediária e mais realista, eu diria, sem a euforia ilusória do primeiro ano e sem o catastrofismo que prevaleceu em algumas análises do primeiro semestre – que nos permite avaliar as pesquisas com mais segurança.

Trata-se de um cenário, em que a recuperação da economia, embora ainda pequena, recompõe expectativas positivas em relação ao desempenho do governo Lula a médio prazo, um cenário que em curto prazo não deve sofrer alterações bruscas, positivas ou negativas, de modo que o quadro nacional tende a favorecer o crescimento dos candidatos petistas nas eleições.

2 – O crescimento de Marta Suplicy nas pesquisas de intenção de voto na cidade de São Paulo comprova a tese de que o crescimento da popularidade no governo Lula reflete no desempenho dos candidatos petistas?

No Grupo de Trabalho Eleitoral (GTE), do PT Nacional, estamos acompanhando as pesquisas de intenção de voto em várias cidades. De um modo geral, houve uma queda das candidaturas nas pesquisas em abril e maio deste ano por causa daquela conjunção de fatores: estagnação da economia, episódio Waldomiro e aumento do mínimo. Agora vemos a reversão desse quadro, com a recuperação parcial da popularidade do governo Lula. Mas o cenário nacional é apenas o pano de fundo das disputas municipais – poderia prejudicar muito o desempenho dos candidatos petistas se a imagem do governo federal não se recuperasse e, ficando como está ou um pouco melhor, tende a ajudá-los. Mas o desfecho das eleições será definido fundamentalmente pelo desempenho dos atores locais, cujas campanhas entraram em cena oficialmente em julho.

O mérito principal do crescimento da Marta é, sem dúvida, de uma administração petista que cumpriu com seus compromissos de campanha e mostrou que é um governo voltado para o social. Vale lembrar os programas sociais que implantou, puxados pelo Renda Mínima, a reforma do sistema de transportes e a implantação do Bilhete Único, a criação e funcionamento de 21 CEUs, o transporte e uniforme gratuitos para os alunos das escolas municipais etc. – um conjunto de políticas públicas que está gerando um impacto positivo na avaliação do seu governo e se revertendo em voto para a candidata Marta. Um voto, aliás, que já estava claro nas periferias mais pobres da cidade, como os extremos das zonas Sul e Leste, onde o impacto desses programas no cotidiano das pessoas já pode ser sentido há mais tempo, e que agora começa a avançar mais em regiões e setores médios da população.

3 – Se as eleições fossem hoje, como o PT se sairia?

Considerando as capitais, o PT venceria o 1º turno em 1º lugar em Porto Alegre (RS), Aracajú (SE) e Palmas (TO). Também estaria garantido no 2º turno em São Paulo (SP), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Recife (PE) e Rio Branco (AC). Com boa possibilidade de disputar o 2º turno, mesmo que isolada em 2º lugar, temos a senadora Ana Júlia em Belém (PA). E ainda, em Florianópolis (SC), Vitória (ES) e Goiânia (GO) o PT estaria disputando a segunda vaga para o 2º turno. Portanto, considerando só essas 12 capitais, já se vê um desempenho bastante expressivo do PT.

4 – Pode-se dizer que o PSDB é o principal adversário dos petistas nessas eleições?
Como vimos, hoje o PT estaria no 2º turno em 9 capitais e disputando uma vaga em mais três. Nessas 9 capitais em que o PT está bem, o PSDB é o principal adversário em quatro. Já em outras 15 capitais em que o PT está mal colocado, o PSDB lidera apenas em Natal (RN) e Cuiabá (MT). Isso demonstra, que, ainda que o PSDB possa ir bem em muitas cidades, não polariza a maioria das disputas com o PT, mesmo que isoladamente apareça como principal adversário nas capitais. Considerando o conjunto dos municípios em disputa, pelo que as pesquisas permitem antever, certamente o Brasil que vai emergir das urnas em 31 de outubro não estará politicamente dividido entre PT e PSDB: PMDB, PFL, PDT e PPS, entre outros, também mostrarão sua força eleitoral.

Em suma, é natural que diante da vitória de Lula na sucessão de Fernando Henrique, o PSDB tenha se tornado o principal adversário político do PT. Mas nem por isso é o principal adversário eleitoral do PT este ano, no sentido de uma bipolarização da disputa. O quadro partidário brasileiro é mais complexo que isso e, a meu ver, as eleições deste ano tendem a ratificar sua complexidade multipolar, não a simplificá-la.


*Gustavo Venturi, cientista político e coodenador do Núcleo de Opinião Pública (NOP) da Fundação Perseu Abramo.

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