Raul Pont: O ano de 1980 iniciou-se promissor para o Movimento Pró-PT. Apesar da descrença dos parlamentares que, inicialmente, afirmavam sua simpatia pelo projeto, o PT vai se consolidando no país como proposta autônoma e enfrentando a nova Lei Orgânica dos Partidos, feita na medida para fortalecer a organização partidária de cima para baixo, a partir do Congresso Nacional. Em janeiro circula o anteprojeto do Manifesto a ser aprovado na fundação oficial do Partido.

Raul Pont: O ano de 1980 iniciou-se promissor para o Movimento Pró-PT. Apesar da descrença dos parlamentares que, inicialmente, afirmavam sua simpatia pelo projeto, o PT vai se consolidando no país como proposta autônoma e enfrentando a nova Lei Orgânica dos Partidos, feita na medida para fortalecer a organização partidária de cima para baixo, a partir do Congresso Nacional. Em janeiro circula o anteprojeto do Manifesto a ser aprovado na fundação oficial do Partido.
Em 10 de fevereiro, atendendo a uma convocação da Comissão Nacional Provisória, reuniram-se, no Colégio Sion, em São Paulo, representantes do Movimento Pró-PT de 17 Estados brasileiros, já representando articulações regionais que escolhiam democraticamente suas coordenações estaduais e já tomavam iniciativas para campanhas de filiação, alugar sedes, produzir boletins e ampliar o movimento para os municípios do interior do País.
Nesta oportunidade foram coletadas as 101 assinaturas exigidas pela Lei Orgânica dos Partidos em vigor para encaminhar o pedido de registro junto ao Tribunal Superior Eleitoral.

Paulo Skromov: O primeiro ato de fundação de um partido legal era simplíssimo, demais. Ficamos até assustados com a bobagem que parecia ser – quer dizer – você reunir 101 pessoas. Era isso que exigiam, para começar a registrar o partido, assinando um manifesto político que contivesse as idéias do partido.
Como uma maneira de ampliar o partido nesse momento, a gente ofereceu assinatura de fundadores a pessoas que nós não pretendíamos incorporar ao partido, mas que tinham importância na sociedade para os explorados, para os oprimidos, e que tinham sensibilidade para as aspirações populares. E foi um sucesso. Nós conseguimos levar pessoas extremamente representativas e hoje muitas delas se orgulham de serem fundadoras do partido, com justa razão, porque nos ajudaram a dar esse passo importante.
Aí, formalizamos o Movimento pelo PT. A lei exigia que se pusesse um P na frente, se não exigisse, não teríamos fundado o PT, teríamos continuado com Movimento pelo PT, porque achávamos que ainda era o Movimento. Tanto que o MDB também foi obrigado a por um P na frente e ficou PMDB. Para nós, em vez de colocar Partido do Movimento pelo PT – ficava muito esquisito – a gente eliminou o M e ficou PT.
Essa foi uma fundação formal, ela tem sua importância, acabou marcando a nossa história, acabou sendo definidora de um novo momento que foi a deflagração da legalização, mas o que deflagrou de fato a legalização foi a reunião de 13 de outubro de 79. Foi lá que tiramos a decisão de fazer a reunião de fundação.

Raul Pont: Foi um momento histórico de reencontro de militantes de várias gerações que tinham lutado contra o regime militar, mas também contra o reformismo dos PCs tradicionais e o populismo de Getúlio Vargas e do PTB: misturavam-se com a geração dos anos 68-69, com os intelectuais e professores universitários que resistiram ao regime militar e com a nova vanguarda sindical, que se construíra na luta e que fora criada pelo "milagre brasileiro", pelo recente desenvolvimento do capitalismo brasileiro.

Paul Singer: Essa reunião no Colégio Sion foi um momento emocionante. Houve três grandes figuras antigas, por assim dizer, que batizaram o PT: o Mário Pedrosa, um importantíssimo intelectual, trotskista, do Partido Socialista; o Sérgio Buarque de Holanda e o Apolônio de Carvalho. Pessoas com 70, 80 anos de idade, com uma longa folha corrida de atuação política e intelectual…
Eu me lembro que Mário Pedrosa fez um discurso dizendo: "Vocês vão deixar todas as suas bíblias fora. Vocês vão entrar no PT sem bíblia, sem dogmas. Nós vamos todos aprender juntos um novo bê-a-bá". Isso foi dito por um homem que tinha sido um dos grandes ideólogos da esquerda não-estalinista no Brasil. Foi muito impressionante. Ele estava certo. Ele morreu em 1980 e disse isso alguns meses antes de morrer. Ele percebeu que o PT que estava se fundando era extremamente heterogêneo, que tinha de haver uma grande boa vontade para que essa heterogeneidade não levasse a uma sectarização.
Essa era a grande oportunidade histórica, perseguida durante décadas pela esquerda brasileira, que havia lutado contra o populismo e o reformismo burocratizado e antidemocrático dos PCs brasileiros. Combinavam-se elementos chaves para materializar a organização independente dos trabalhadores, perseguida há décadas por pequenos grupos dissidentes do PC nos anos 30, por revolucionários isolados e, já nos anos 60, pela estratégia da ORM-Polop e pelos grupos que romperam com os PCs nos anos 66-69.
O surgimento do PT era a grande chance de construir aquela alternativa através de um partido amplo, de massas e enraizado nos sindicatos, nos movimentos populares e no meio da juventude.

*Entrevistas realizadas por Marta Harnecker em 1994 in O sonho era possível

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