Dois anos antes (a partir de 1978) parte das oposições estava se articulando para a criação de um novo partido de caráter socialista; essa iniciativa, entretanto, não teve êxito.

Dois anos antes (a partir de 1978) parte das oposições estava se articulando para a criação de um novo partido de caráter socialista; essa iniciativa, entretanto, não teve êxito.
No decorrer das memoráveis greves de 1978-80, todos os que participavam do movimento começaram a perceber a necessidade de sair das lutas puramente reivindicatórias e estendê-las para o campo político. Para isso a estrutura sindical era insuficiente; tornava-se evidente a necessidade da criação de um partido de trabalhadores. Essa idéia alastrou-se como um rastilho de pólvora, especialmente após os eventos do dia em que Lula foi aclamado na Assembléia Legislativa. O Partido dos Trabalhadores ia nascer exatamente de todas as bases populares de oposição que vinham lutando contra a opressão naquele momento, especialmente os metalúrgicos do ABC.

Foi assim que chegamos, em fevereiro de 1980, ao ato de lançamento do Manifesto do Partido dos Trabalhadores, nome que já vinha se impondo nas etapas preparatórias de sua organização. Esse ato foi realizado no auditório do Colégio Sion, gentilmente cedido para a ocasião. Assinaram a ata de lançamento do Manifesto do PT personalidades ilustres como Mário Pedrosa, Antonio Candido, Manuel da Conceição, Sérgio Buarque de Holanda, Apolonio de Carvalho – ex-combatente das Brigadas Internacionais na Guerra Civil Espanhola (1936-1939), onde lutou contra Franco – e ainda muitas pessoas de renome. Foi-me dada a honra de assinar, entre os seis primeiros, aquela ata. Foi gentileza de Lula, talvez porque eu estivesse entre os primeiros presidentes de sindicato não-operário a aproximar-me e a reconhecê-lo como líder. Havíamos passado momentos importantes, e às vezes perigosos, lado a lado.

No dia 17 de abril ocorreu a intervenção militar no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC; dois dias depois, Lula, bem como vários diretores do sindicato, foram detidos. Ficaram presos nas dependências do DEOPS durante vários dias, processados e condenados. Posteriormente, impetrado recurso, foram todos absolvidos.

De fevereiro de 1980 a fevereiro de 1981 trabalhamos para a legalização do PT; a nossa atividade na criação de núcleos, na formação de diretórios e na campanha de filiação exigiu um esforço constante e diário de todos os simpatizantes, não apenas nesta capital de São Paulo mas em todos os cantos do País. Andávamos com as fichas de inscrição no bolso e, a cada pessoa que encontrávamos, explicávamos a importância e a necessidade de se obter o número de filiados exigidos para a legalização do partido. Fazíamos igualmente mutirões, bairro por bairro, rua por rua, casa por casa, com o mesmo objetivo, e finalmente, o número de filiados ultrapassou em muito o exigido pela lei de organização dos partidos. Parecia estar surgindo uma esperança suscetível de movimentar uma boa parte da população, que, em breve tempo, formou centenas e até milhares de núcleos pelo Brasil todo. O PT alastrou-se com rapidez nunca vista aqui, só comparável àquilo que aconteceu em Roma no final da Segunda Guerra Mundial, quando a população, num só impulso, colocou-se em filas gigantescas para inscrever-se nos partidos políticos que haviam sido fechados durante os 21 anos de fascismo.

Os núcleos do PT não só se espalharam por toda a parte, mas iam sempre aumentando em número de filiados. Por exemplo, o núcleo de Perdizes, bairro de classe média de São Paulo, onde se situa a PUC, chegou a ter cerca de 300 pessoas, que se reuniam no restrito espaço de uma garagem e que acabavam se espalhando pela rua. O núcleo da Augusta, também na cidade de São Paulo, na sede da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), ficava lotado por militantes professores, artistas plásticos, engenheiros, arquitetos, estudantes, médicos etc., enfim, membros de várias categorias sociais e profissionais iam para aquelas reuniões.”

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O Partido que começou dessa forma heróica, graças ao esforço e à garra de todos e de cada um de nós, é hoje, talvez, o maior partido de esquerda da América Latina, detentor de cerca de 30% dos votos nas eleições nacionais. A luta destes 20 anos valeu a pena.

* Lélia Abramo, atriz e sindicalista, na época do relato era presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões (SATED) de São Paulo. Continua, como era então, aguerrida militante de esquerda e filiada ao PT.
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