Soube da decretação do Ato 5 quando entrava numa pizzaria da rua da Consolação, que mantinha logo à entrada um aparelho de televisão. Estava com uma turma de jornalistas, quase todos recém-demitidos ou saídos da revista Realidade. Vínhamos de um hotel da chamada Boca do Lixo de São Paulo, o Apolo, na rua Aurora. Foi um susto e uma correria, porque nesse hotel estávamos ultimando o "boneco" de uma publicação para a qual nos havia chamado o Samuel Wainer. Um semanário batizado por Samuel de Idéia Nova, que trazia matérias e colunas de crítica que já prenunciavam o que viria, como por exemplo a reportagem de José Hamilton Ribeiro cujo título era "A escalada da violência".

Corremos de volta ao hotel, recolher a papelada toda, enquanto o Samuel tratava de desaparecer. Ia por terra nosso "Projeto Apolo" e entrávamos no período da censura absoluta.

O meu cotidiano já fora afetado nos meses que antecederam o Ato 5, quando a editora Abril já tratara de expurgar a mim e a outros jornalistas "inconvenientes" em tempos de ditadura.

Quanto ao que mudou no país, resumidamente eu diria que a partir dali inaugurou-se a era do empobrecimento cultural e ético, inoculou-se o pior dos venenos na geração que despontava – o da impotência intelectual. A nação seria colocada sob a síndrome do individualismo e da descrença nas instituições. Herança perversa, resultado de um ato que a frase de um poderoso político de então, duas vezes ministro de Estado, espelha com clareza: "Às favas todos os escrúpulos de consciência".

Nos dias atuais, porém, manifesta-se, a partir das novas gerações, uma tomada de posição alvissareira, ignorada ou ocultada ainda pelos meios de comunicação tradicionais, mas que faz prever tempos diferentes.

*Jornalista, trabalhou em vários dos principais veículos de comunicação impressos do país. É editor da revista Caros Amigos.

 

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