Os integrantes do CBA, familiares de presos políticos e profissionais liberais, estudantes e artistas, foram incansáveis na edificação da entidade e do movimento pela anistia, que se multiplicava por todo o país.

Prêmio Vladimir Herzog – e a anistia de 1979

A luta pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita no Brasil se organizou no país ainda dominado pela ditadura militar. Por isso mesmo, todas as denúncias que então se fizeram e as formas de luta eram, em si, atos de coragem e de compromisso ético com a nação. O Comitê de Anistia de São Paulo CBA/SP, fundado em maio de 1978, teve suas primeiras reuniões dentro do Instituto Sedes Sapientiae, autorizadas pela saudosa Madre Cristina Sodré Dória, sua diretora. Os integrantes do CBA, familiares de presos políticos e profissionais liberais, estudantes e artistas, foram incansáveis na edificação da entidade e do movimento pela anistia, que se multiplicava por todo o país. Foi, talvez, a primeira experiência de um movimento, que hoje podemos entender como um movimento em rede. Somente “a posteriori”, com as reuniões gerais e com o Primeiro Congresso de Anistia, realizado em São Paulo (no Sedes Sapientiae, e no Tuca – Teatro da PUC/SP) – é que os comitês tiveram uma organização nacional, ganhando uma coordenação geral. Houve um Segundo Congresso, em Salvador, além de vários encontros nacionais.

O congresso de São Paulo foi convocado pelos dezessete movimentos de anistia, reunidos em Salvador, em 7 de setembro de 1978. A organização geral do Congresso esteve sob a responsabilidade dos Comitês pela Anistia de São Paulo, Rio de Janeiro e da Bahia, dos Movimentos Femininos pela Anistia de São Paulo e de Pernambuco e pela Sociedade de Defesa dos Direitos Humanos do Pará. Os objetivos gerais e específicos do Congresso, definidos em um regimento interno, propunham a congregação de todas as entidades que se posicionassem a favor da anistia ampla, geral e irrestrita; o auxílio na articulação dos diversos setores sociais em prol da luta pela anistia e a aprovação de encaminhamentos comuns.

O congresso estabeleceu oito objetivos específicos, ao mesmo tempo políticos e organizativos, marcados pelos propósitos éticos de fazer avançar a luta pela conquista da anistia sem deixar de denunciar, a cada passo, os crimes e vilanias do regime militar. Em nenhum momento se fizeram alianças ou acordos com os militares e seus aliados. Ao contrário, os dirigentes da anistia foram em busca dos seus próprios aliados, e foi assim que foram convidadas sete entidades de caráter nacional que se destacavam na luta pelos direitos humanos: a CNBB, a OAB- Conselho Federal, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a Comissão Justiça e Paz/SP, a comissão pró União Nacional dos Estudantes e o Movimento Democrático Brasileiro.

Dentro desse cenário é que foi aprovada a criação do Prêmio Vladimir Herzog, a partir de sugestão apresentada por Helena Greco do CBA/MG e abraçada por todos, como justa homenagem ao jornalista assassinado pela ditadura e compromisso com os ideais de justiça e liberdade. Coube ao CBA/SP elaborar e materializar o regimento do prêmio, tarefa imediatamente assumida por Perseu Abramo, integrante do CBA/SP.

O leque de decisões desse congresso foi a sistematização das várias resoluções elaboradas pelas doze comissões de trabalho, que se reuniram durante os três dias que precederam o encerramento do Congresso.

A comissão de trabalho dos jornalistas tomou como sua a carta “Compromisso com a Verdade”, aprovada no Primeiro Congresso Nacional de Liberdade de Imprensa, realizado em São Paulo, em outubro de 1978, que protestava contra a violação sistemática do direito de informar e de ser informado, o que, em última instância, é o direito de o povo decidir o seu próprio destino. Nas resoluções da comissão reunida durante o congresso em São Paulo, entre vários propósitos, os profissionais de imprensa assumiram a tarefa de exigir “a responsabilização judicial, individual e coletiva dos agentes da repressão envolvidos na prática de atos de violência contra os que lutam pelos interesses populares, a exemplo da sentença emitida recentemente pela Justiça Federal, responsabilizando a União pela morte do jornalista Vladimir Herzog…” (Resoluções do Congresso Nacional pela Anistia, novembro de 1978).

Ancorado no resgate da verdade e na denúncia do arbítrio, o “Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Direitos Humanos” sedimenta a pauta de compromissos assumidos durante a campanha da anistia, especificamente pelos profissionais de jornalismo e se re-atualiza na permanente defesa dos princípios que norteiam um Brasil melhor e o amadurecimento de uma nação cidadã.


* Maria Auxiliadora Arantes (Dodora) é fundadora e dirigente do CBA/SP