Conheça o que pensam alguns dos participantes do evento.

Semy Ferraz*

A maior dificuldade na relação entre o Parlamento e a população é a participação popular. É o grande desafio da democracia participativa. É as pessoas acreditarem que podem ser agentes do processo, que podem fazer a mudança. O governo tem sua lógica, seus indicadores. E não presta a atenção necessária para saber até que ponto a população está sendo atingida por aquele beneficio.

No processo de privatização dos serviços públicos, há reajuste excessivo das tarifas públicas, da energia, da telefonia. E a própria democracia representativa, o Parlamento cria as agências reguladoras, que se resume a uma burocracia pra dizer se isso pode ou aquilo não pode. Acho que atende apenas os interesses de quem está investindo naqueles serviços e não de quem está consumindo aqueles serviços, que é a maioria da população. O Parlamento precisa entrar nesse debate.

Na AL, mesmo sabendo da dificuldade de se discutir um reajuste de uma concessão federal, é preciso chamar a população para discutir, para pelo menos debater esse assunto. Estamos vivendo isso, chamando audiências públicas, chamando o conselho de consumidores de energia. Por ex. no Mato Grosso do Sul, quem preside esse conselho é o maior consumidor de energia, que é a empresa de saneamento. Ou seja, o grande consumidor está representado. O pequeno consumidor, não tem representação. O conselho, portanto, vai referendar uma política de tarifas mais altas, sem regulação econômica.

Na medida em que se começa a chamar a população e suas representações, o Procon, a associação de consumidores, começa-se a ver resultados, a cobrar, explicitar o lucro excessivo, os esquemas de corrupção que existe.

Nesse sentido, o Parlamento não se omite.

Credibilidade do Poder Judiciário – No MS e no restante do país, o poder legislativo está em baixa. Vive uma crise de representatividade, apesar de ser eleito por voto direto. As pessoas não estão confiando na credibilidade do poder legislativo. Na medida em que é o poder que dá sustentação à democracia, fica fácil, fica vulnerável a qualquer atitude ditatorial, ou seja, a algo que não seja a democracia.

O episódio da vitória de Severino Cavalcante para presidente da Câmara dos Deputados não é nocivo somente para o PT, que perdeu a eleição. A classe política saiu perdendo, a classe política ficou manchada na sua idoneidade, na sua credibilidade. Precisamos fazer uso desse episódio sobre o papel dos partidos democráticos, as instituições democráticas, a representação popular. Esse episódio coloca em pauta a reforma política.


* Semy Ferraz é deputado estadual do Mato Grosso do Sul

Dora Martins dos Santos*

A relação entre o poder executivo e a população tem se dado pelo Orçamento Participativo. É experiência recente na cidade, começou em 2003. É um chamamento do executivo à população. Cerca de 5% da população freqüenta as reuniões semanais através dos seus delegados.

Em relação ao Legislativo, a gente percebe um certo descrédito. Dar credibilidade ao legislativo é um processo que precisa ser construído. A população se expressa pelo OP e ela tem respondido porque o orçamento do município tem dado conta dos investimentos necessários. As assembléias do OP desmontam os discursos de políticos que dizem "sou eu que faço as coisas". Ao ser esclarecido quem é responsável pelas obras, a população passa a entender que é o Executivo que faz as coisas. O vereador, então, perde aquele papel intermediário, de despachante da população.


* Dora Martins dos Santos é membro do conselho do OP de Botucatu (SP)

Luis Carlos Cicuto, conhecido na região como "Reverte"

Estando de fora da Câmara, temos o hábito de criticar, mas quando estamos dentro a pressão começa já na eleição da mesa, porque os membros são indicados pelo prefeito municipal. As dificuldades são imensas.

Nos meus projetos, levo aquele que não freqüenta a Câmara, que levanta às 4 horas da manhã, que é o bóia-fria, que não sabe o que é o OP, o que são os direitos dele; o que ele sabe é que está faltando alguma coisa na casa dele. A gente avisa um dia antes, eles vêm pra Câmara, participam. Tem uma pequena plenária, que nunca teve na minha sessão. Fiz uma emenda e hoje faz parte do regimento interno: nessas plenárias se discute os problemas municipais. Nessa plenária com a participação do povo, convido os outros vereadores a votar no meu projeto. Meu aliado hoje é o povo. Antes não ia nem cinco, seis pessoas. Hoje vão em peso, eles querem saber o que está acontecendo. Eles não podem votar, mas querem saber o que está acontecendo.

Quando fui tomar posse, aqueles presidentes de partidos grandes me falaram assim: "Esse tá sozinho". Escutei aqui, ali, tomei a palavra e disse: "Este vereador não está só, estou com a Constituição, com a Lei Orgânica do Município e com o regimento interno". Só é aquele que não lê, que não tem conhecimento das leis. Hoje tenho um trabalho de domingo, que é cansativo, vou de casa em casa fiscalizar. Tenho lista das consultas, daquelas pessoas que são dependentes e que são atendidas no posto de saúde. Vou ver se estão recebendo a cesta de remédios, que é um projeto meu, aprovado na Câmara, que é a cesta do diabético e a do hipertenso. São doenças que a pessoa não pode ficar sem remédio. Então cabe a mim fiscalizar se estão recebendo, porque o prefeito que saiu, fazia a área social no gabinete. Ele dava remédio pra quem ele queria, pra quem era cabo eleitoral dele. Então, eu sou diferente, porque na minha campanha não prometi guarda-chuva, não prometi pé de sapato. Eu prometi que ia trabalhar em cima das leis.

Vim pra SP com recursos próprios. Quando eu me envolvo numa área social, eu vou atrás. Não bato nas portas das secretarias do governo do Estado, porque as portas estão fechadas para o PT. Eu parto direto para os ministérios, da Saúde e da Educação.


* Luis Carlos Cicuto (Reverte) – vereador em Trabiju (SP)

José Ferreira de Souza*

O PT precisa estreitar seu relacionamento com seus parlamentares. O poder legislativo é o mais democrático entre os três poderes. Tem de ser o mais democrático, porque ali é que se compõem todos os partidos, eleitos com sua representatividade, que vem da população. No Executivo, o grupo é mais puro, porque os cargos são nomeados. Esses cargos acabam tendo mais peso que aqueles que foram eleitos. Precisa avançar nisso.

Precisa também comunicar mais. Dar mais instrumento. O vereador de oposição sofre muito, lamentavelmente sempre foi assim, o legislativo se tornou um departamento do executivo.

A bancada de sustentação, em troca talvez de alguns privilégios, abre mão do que é fundamental do poder legislativo, que é o de fiscalizador do poder executivo.

E nós do PT temos que nos educarmos para isso, entender que ser oposição não quer dizer ser contra tudo ou contra todos. Ser oposição é o papel que nos cabe, de fiscalizar.

Tenho agido assim em SBC. Quando fui da bancada de situação, eu atuava ajudando nosso prefeito a governar, mas fazendo as críticas construtivas que eu achava que devia fazer.

E o PT precisa dar um chacoalhão nesse Brasil, porque vários poderes executivos, copiaram nosso discurso, eles copiaram mal algumas propostas nossas de democratização do poder e aplicam errado. E os nossos parlamentares, nesses determinados lugares onde são oposição, às vezes não tem estrutura para informar a população sobre o que está acontecendo.

Em São Bernardo do Campo, cito o exemplo da consulta popular que fazíamos para o OP, em 91 e 92. O prefeito não tinha apreço por essa causa. Ele fingia que aplicava, mas não aplicava. Mas mesmo assim aplicamos o OP em alguns lugares. Quando ele saiu do PT, foi eleito por outro partido, o PSDB, trocou o OP por uma consulta que é feita. É uma carta que é mandada por correio ou por e-mail. E ele, o prefeito, diz pra população que sua proposta é mais democrática que a do PT. Outra coisa são os conselhos locais de saúde, que em SB foi implementada por lei pelo prefeito, e a população nem sabe que existe. Para fora, para os meios de comunicação e até pra projetos internacionais, eles divulgam aquilo como exemplo de democracia. Quem não conhece, acha que aquilo é coisa do PT. Outra coisa são os programas Primeiro Emprego, os programas dos agentes de saúde, que são do governo federal. Nessa questão, a comunicação é fundamental. Às vezes vamos a alguns locais que tem TVs locais. No ABC não tem. O que fala pelo ABC é um determinado jornal, que não vou citar o nome. Este jornal é manipulado pelo poder Executivo. Então não sai nada, nós do PT, movimentamos a população, ela conquista suas reivindicações. O jornal acompanha, faz matéria com a população, mas põe o prefeito na parada e sequer divulga que esteve presente um vereador do PT. Aí aparecem os vereadores da bancada de sustentação do prefeito como se fossem eles os organizadores daquela população. São esses picaretas que encontramos pelo caminho e dificulta fazer valer as propostas do PT.

É claro que alguma coisa organizada fica, mas se tivesse mais comunicação, o Partido mais próximo de seus parlamentares, talvez no nosso caso, no poder Executivo, se o prefeito aplicar a democracia, fortalecendo a representação popular, acredito que o PT dará um salto de qualidade para a democracia em nosso país.


* José Ferreira de Souza é vereador em São Bernardo do Campo (SP), desde 1983

Gislene de Oliveira Silva*

O PT ganhou muita credibilidade a partir da devassa que a Câmara de Embu sofreu a partir de denúncia do vereador Geraldo Cruz, em 1999. Foram afastados 18 vereadores.

A população tem respondido nas urnas. O PT cresceu muito a partir daí. Temos uma bancada de 4 vereadores; a vereadora Maria das Graças é presidente da Câmara; o Geraldo, prefeito reeleito em 2004. Na penúltima eleição, 3 vereadores dos 18 afastados tinham sido reeleitos, mas agora, só um deles voltou à Câmara.

A participação popular ainda é pouca apesar de irmos para as ruas e mobilizarmos a população. A resposta é lenta. Acho que o horário da Câmara deveria ser mudado. Hoje as sessões são às 18h, as pessoas estão chegando do trabalho.

O OP veio suprir essa necessidade de participação da população. As assembléias são feitas nos fins de semana.

 


* Gislene de Oliveira Silva é assessora a presidenta da Câmara de Embu (SP)

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