A ameaça Bolsonaro

Deputados dos EUA apresentam emenda à Lei de Autorização de Defesa Nacional para 2023 estabelecendo o fim da ajuda militar ao Brasil se as FFAA interferirem nas eleições de outubro. É um tapa na cara do presidente-capitão e dos generais do Palácio do Planalto

 

As reiteradas ameaças de Jair Bolsonaro às urnas eletrônicas e à Justiça Eleitoral pode levar o governo Joe Biden a cortar financiamento e ajuda para as Forças Armadas brasileiras. Na quinta-feira, Bolsonaro anunciou que vai chamar todos os embaixadores estrangeiros  em Brasília nesta semana para falar da fragilidade das urnas eletrônicas e apontar falhas na atuação de três ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE): Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes.

Na terça-feira, 5, durante reunião ministerial, Bolsonaro e os generais do governo — incluindo o seu candidato a vice, o ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto — criticaram o TSE e ameaçaram promover uma auditoria nas urnas, mesmo sem a autorização ou a consulta à Justiça Eleitoral. Na semana anterior, Braga Netto ameaçou que se não houver auditoria “não deve ter eleição”. A declaração ocorreu durante reunião com empresários da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan).

Na sexta, 8, Bolsonaro voltou a criticar ministros do TSE e a lançar dúvidas sobre o resultado das eleições de outubro. Segundo o chefe do Executivo, é “esquisito” que o presidente do tribunal eleitoral, Edson Fachin, “já saiba” o resultado do pleito. Fachin afirmou, em Washington, que o país pode ter uma versão ainda mais grave da invasão ao Congresso dos EUA, ocorrida em 6 de janeiro do ano passado, por iniciativa do então presidente Donald Trump, que queria impedir a posse de seu sucessor, Joe Biden. Trump é alvo de uma investigação de um comitê especial da Câmara e já foi apontado como responsável pelo episódio, já considerado um atentado contra as instituições americanas.

“O que se tem dito no Brasil é sobre a ocorrência de um episódio ainda mais agravado do que 6 de janeiro daqui [dos EUA] do Capitólio”, disse Fachin, diante de uma plateia de brasilianistas, estudiosos e assessores do Congresso dos EUA. A declaração do presidente do TSE ocorreu durante sua palestra na sede do Wilson Center, organizada pelo Brazil Institute, em Washington. O Wilson Center é um dos mais poderosos think tanks do mundo, mas, diferente da maioria dos organismos americanos de estuos é uma instituição governamental, controlada diretamente pela Casa Branca.

Desde que se instalou na Casa Branca, Biden manda mensagens contraditórias sobre Bolsonaro. Ele alertou Brasília contra os ataques às eleições e às urnas eletrônicas, mas depois convidou o líder da extrema-direita brasileira para uma reunião na Cúpula das Américas em Los Angeles.

Agora, um grupo de deputados democratas se movimentou para ajudar a Casa Branca a se decidir sobre a relação com o Palácio do Planalto. Eles apresentaram emenda à Lei de Autorização de Defesa Nacional para 2023, que ameaça a continuidade da ajuda militares do Pentágono ao Brasil no próximo ano, caso os militares interferiam nas eleições presidenciais de outubro.

A Emenda 893, intitulada “Neutralidade das Forças Armadas Brasileiras Durante as Eleições Presidenciais”, exige que dentro de 30 dias da aprovação da lei, que ainda precisa passar pelo Congresso, o secretário de Estado entregue um relatório sobre a interferência das Forças Armadas brasileiras nas eleições de outubro, e considerar tais ações como “proteções estatutárias na assistência de segurança dos EUA”.

A emenda cita pontos a serem investigados: interferência na contagem de votos, manipulação para tentar reverter o resultado e participação em campanhas de desinformação para questionar o sistema eleitoral e os resultados por meio de protestos, redes sociais ou outros meios de comunicação. Caso alguns desses pontos sejam constatados, o Brasil pode vir a ser enquadrado na Seção 7.008, que prevê o fim da assistência de segurança dos EUA a países em que haja Golpe de Estado ou ataques de à democracia, o que poderia colocar em risco a condição do Brasil de aliado extra-Otan, obtida em 2019.

A emenda 893 foi proposta pelo deputado democrata Tom Malinowski, de Nova Jersey, junto com os também democratas Albio Sires (Nova Jersey), Joaquín Castro (Texas), Susan Wild (Pensilvânia), Ilhan Omar (Minnesota) e Hank Johnson (Geórgia). A proposta, assim como o Orçamento de Defesa, precisa ser aprovada pelo Congresso, num processo a ser concluído até outubro, quando começa o ano fiscal.

Legisladores democratas progressistas liderados por Hank Johnson têm pressionado a Casa Branca a esclarecer seu papel na investigação da Lava Jato e na prisão arbitrária de 2018 do candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva.  Isso mostra que cada vez mais democratas estão preocupados com as ramificações de um possível golpe militar no Brasil este ano.

Em nota, o Ministério da Defesa disse não haver interferência dos militares nas eleições brasileiras. “O ministério reitera que as Forças Armadas participam, a convite do TSE, da Comissão de Transparência das Eleições (CTE)”, informa. “Nesse trabalho, as Forças Armadas apresentaram propostas técnicas para atender ao propósito do TSE de aperfeiçoar a segurança e a transparência do processo eleitoral. A participação dos militares na CTE se dá de maneira colaborativa e segue as resoluções do TSE”, afirma. •