A Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas realizada em Glasgow, na Escócia, a Cop26, teve um resultado muito aquém das expectativas de ativistas, ambientalistas, indígenas e de movimentos sociais. Mas o saldo para o mundo é positivo, de acordo com o senador Jaques Wagner (PT-BA), presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal. Ele esteve na Cop26 e afirma que há uma movimentação cada vez mais forte da sociedade civil e de grande parte do empresariado, mas dificilmente o compromisso de restringir o aquecimento global a 1,5°C será cumprido.

 

Focus Brasil — O senhor esteve na Cop26, pode contar um pouco sobre o tamanho dessa conferência?

Jaques Wagner — Primeiro, é importante explicar que existem as delegações oficiais negociando e é disso que sai o resultado. Essas delegações são formadas pelos países. Eu fui para lá como parte, porque chama-se conferência das partes, e eu sou parte porque eu fui representante do Brasil, mas não delegado do Brasil, assim como a sociedade civil organizada, os indígenas, a juventude. Tinha muita gente. Chego a comparar com um grande festival do meio ambiente. Então, tem a parte oficial que está acontecendo a portas fechadas, que são os diplomatas, os responsáveis pela área ambiental de cada país, fazendo a tentativa de chegar a algum acordo, eu não diria nem consenso. E a parte que é uma espécie de Fórum Social Mundial ambiental. Porque tem a sociedade civil toda, a juventude… é uma coisa muito bonita. Eu fiquei lá do dia 1º ao dia 9 e só se respira meio ambiente, movimentação, contestação, duas grandes marchas. Uma que sempre teve que é a oficial e a outra puxada pela Greta Thunberg. Então, é uma coisa que fervilha.

Então, eu queria separar em dois aspectos: a movimentação da sociedade civil, da juventude, dos intelectuais, das academias, para mim é uma coisa fantástica. Respirando muita esperança, compromisso e responsabilidade com o futuro do planeta. Lá, nós lançamos o Observatório Parlamentar do Clima e da Transição Justa, que é uma iniciativa nossa, da Comissão de Meio Ambiente junto com a CEPAL [Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe].

 

— E qual é a sua perspectiva sobre o desfecho das negociações oficiais?

— Eu diria que ela foi menos ruim do que a gente podia imaginar. Inclusive na posição brasileira porque saiu do discurso ideológico e voltou para a mesa de negociação. Então, esse é um dado positivo. Mas o Brasil gera uma tremenda desconfiança. Principalmente, porque o presidente da República… acaba a Cop, o Itamaraty, eu diria que fez um esforço de retornar ao leito natural, de ser parte das negociações ao invés de ficar fazendo discurso ideológico do “passa a boiada”… Aí, ele vai lá para o Bahrein e dá aquela declaração de que a Amazônia não pega fogo, que é invenção do Inpe. Então, ele é o tipo do cara que alguém enche o balde de leite e quando ele vê que está cheio, dá uma patada, um coice e o derruba. Então, ele consegue fazer isso. Destruir constantemente a imagem do Brasil lá fora que já está totalmente detonada.

Então, há uma frustração em relação aos países mais desenvolvidos em dois aspectos: não houve o compromisso total da extinção do carvão e também não houve uma coisa que os países do Hemisfério Sul, que é onde tem ainda floresta tropical, reivindicam que é dizer o quê? É eles assumirem que, historicamente, não na fotografia de hoje. No acúmulo dos danos ao clima e à camada de ozônio e ao planeta, eles têm um estoque muito maior do que os países em desenvolvimento e que, portanto, eles deveriam aportar um volume grande de dinheiro – que nem os US$ 100 bilhões prometidos lá atrás chegaram. Então, eles tinham que aportar para poder ajudar esses países, para que se desenvolvam preservando ao invés de se desenvolverem destruindo, como foi o desenvolvimento a partir da revolução industrial. Então, houve essa frustração. Houve de certa forma também uma frustração porque não foram ambiciosos na minha opinião, apesar de todo mundo falar de ambição.

Eu acho que com o que foi assinado a gente não vai conseguir segurar o aquecimento do planeta em 1,5°C. Então, eles foram pobres nesse aspecto. Agora, de qualquer forma, é uma tomada de consciência, é um passo tímido. O que eu acho importante é que na agenda empresarial, de todos os setores, eu diria que a agenda verde é uma agenda que está introduzida e não vai sair mais. As pessoas sabem, inclusive, para os seus negócios que se não abraçaram a agenda verde, não vão para lugar nenhum. Houve o compromisso do desmatamento zero. Aí você me pergunta, é bom? É bom se for verdade.

 

— Aqui no Brasil está muito longe de ser verdade.

— Pois é. Porque, inclusive, no mês passado foi o maior volume de queimada de florestas na Amazônia dos últimos anos. Então, o que eu quero dizer é o seguinte, a proclamação é um avanço mesmo que tímido. A mudança de postura do Brasil na negociação, também. Agora, vamos ver se é à vera ou se foi só proclamação para ultrapassar a Cop. Agora, eu acho que a cada dia você ganha aliados, por isso que eu estou dizendo. Tem muitos fundos que falam em investimentos não reembolsáveis, o que eu acho importante. Cresceu muito o protagonismo, principalmente aqui no Brasil, subnacional. A presença de governadores, do governador Renato Casagrande (ES) que hoje dirige o Fórum dos Governadores Pelo Clima, é uma coisa importante. Despertou nos investidores internacionais esse caminho alternativo se o governo federal continuar fechado para esse tema, há um caminho via os entes subnacionais. Eu acho que isso é um crescimento. É tímido? É aquém? É. Mas eu prefiro dizer que é menos ruim do que alguns achavam que podia ser.

 

— Enquanto o Bolsonaro fala bobagens na Amazônia, o ex-presidente Lula viaja pela Europa e discute como implementar uma agenda de combate à desigualdade e que respeite o meio ambiente. A volta do Lula é um avanço para o meio ambiente e para agenda verde no mundo?

— Eu resumiria no seguinte: um país para avançar, precisa de uma liderança que tenha proposta e credibilidade. Essa é a diferença fundamental daquele rapaz para o Lula. O rapaz não tem proposta nem credibilidade. O Lula tem muita credibilidade e muita proposta para o Brasil, então, sem dúvida nenhuma, ele faz um bem enorme ao Brasil com essa circulação que ele fez. Eu diria que é um tapa na cara, é uma aula para aqueles que têm preconceito dentro do Brasil. Ele foi recebido em todos os países com pompa e circunstância. Na França, o próprio Champs-Élysée fez questão de publicar antes do encontro, algo que não é muito comum, o anúncio do encontro e os temas que seriam tratados.