Dados oficiais mostram que os casos de violência crescem cada vez mais, do discurso de ódio nas redes ao feminicídio de fato

Calvo do Campari e a violência de gênero: quase 4 milhões de mulheres já sofreram agressões em 2025
O inlfuencer Calvo do Campari – Foto Reprodução YouTube

Entre o final de novembro e o início de dezembro, três casos de violência de gênero tomaram conta dos noticiários brasileiros. O de maior repercussão envolve Thiago Schutz, também conhecido como “Calvo do Campari”, que agrediu a namorada  com chutes e tapas dentro da casa do influenciador. 

Schutz foi preso em flagrante, mas solto logo em seguida. O fato ocorreu em 29 de novembro. No mesmo dia, um homem atropelou e arrastou a ex-namorada com o carro por 1 km por não aceitar o término. A violência resultou na amputação das duas pernas da vítima. O agressor está preso.

Um dia antes, duas servidoras do Rio de Janeiro morreram após um ataque a tiros no Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) Celso Suckow da Fonseca, no Maracanã, zona norte do Rio de Janeiro. O autor foi João Antônio Miranda Tello Ramos, colega de trabalho que, após o ataque, tirou a própria vida. Segundo apurações iniciais,o crime foi precedido por episódios de ameaça e por uma explícita dificuldade do agressor em aceitar ser chefiado por uma mulher. 

Os três casos recentes endossam os números da pesquisa “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado”,  feita pela Fundação Perseu Abramo, em parceria com centro de formação política e de produção de conhecimento do PT e o Sesc São Paulo.

Segundo a iniciativa, houve um aumento, na última década, dos relatos espontâneos de violência sofrida entre mulheres  – de 18% em 2010 para 23% em 2023. Quando estimuladas com alguns exemplos de situações de violência física, moral, sexual, patrimonial, psicológica, os relatos aumentam para 50%. 

O cenário piora quando se constata que a maioria das vítimas (71%) não denunciou oficialmente o episódio e que 58% não pediram ajuda diante dessa situação. Corrobora para isso o fato de que 2 a cada 10 mulheres que admitiram ter sofrido violência foram orientadas a não fazer denúncia (21%).

A violência psicológica, pouco reconhecida espontaneamente, chegou a 43% quando estimulada. Na sequência, a violência moral (37%), a sexual (23%) e a física (22%). A diferença na classificação mostra como as violências psicológica e moral não costumam ser percebidas no dia a dia e como há entraves no reconhecimento e na nomeação das violências. 

Discurso de ódio

O caso do Calvo do Campari apresenta mais um dado alarmante no Brasil: o aumento do discurso de ódio contra mulheres na internet, justamente o tipo de conteúdo que rendeu fama ao agressor. 

Pesquisadores do Laboratório de Estudos de Internet da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em uma parceria com o Ministério das Mulheres, identificaram, de 2018 a 2024, 137 canais nacionais que pregam a misoginia somente no YouTube. Em alguns casos, os autores ainda vendem livros e até cursos que defendem o ódio contra mulheres, sobretudo as que se declaram independentes e feministas. 

Principal canal de denúncia 

O Ligue 180 é a principal porta de entrada para a denúncia e o acolhimento. Em duas décadas, a Central prestou mais de 16 milhões de atendimentos. Nos dez primeiros meses de 2025, o número de ligações para o serviço subiu 33% em comparação com o mesmo período do ano passado. 

Por meio do Ligue 180, é possível registrar denúncias de violência contra mulheres, obter orientação sobre leis e direitos, além de buscar informações sobre a localidade dos serviços especializados da rede de atendimento às mulheres (Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referência, delegacias especializadas, Defensorias Públicas, entre outros).