Marcado pelo humor e pela sátira, escritor era filho do romancista Erico Verissimo e construiu legado fora da sombra do pai

Morre em Porto Alegre o escritor Luis Fernando Verissimo, mestre do humor na crônica brasileira
“A morte é uma sacanagem, sou cada vez mais contra”
Luis Fernando Verissimo; morto aos 88, deixa legado de discrição e vasta obra
Foto: Divulgação

Morreu hoje (30) em Porto Alegre, cidade em que nasceu e viveu, o escritor Luis Fernando Verissimo, aos 88 anos.

Verissimo vivia com complicações de um AVC desde 2021. Há três semanas, estava internado com pneumonia grave. O velório será realizado hoje, às 12h, na Assembleia Legislativa da capital gaúcha.

O escritor deixa a esposa, Lucia Helena, com quem viveu por 60 anos. Juntos, eles tiveram três filhos: Pedro, Fernanda e Mariana.

Com mais de 80 títulos publicados, trabalhou como cartunista, tradutor, roteirista, publicitário, revisor, dramaturgo e romancista.

Teve seus textos adaptados para teatro, cinema e série de TV. Além das palavras, foi um amante da música, dedicado à prática do saxofone.

“No fim, pensando bem, a vida é uma grande piada. Acontece tudo isso com a gente, e a gente morre…que piada, né? Que piada de mau gosto. Mas acho que temos que encarar isso com uma certa resignação, uma certa bonomia [bondade]” – Luis Fernando Verissimo

Sua maior marca, no entanto, foi a que o canonizou na literatura brasileira: a crônica. Expoente do gênero e admirador daqueles que o introduziram, Verissimo sempre defendeu o texto como uma genuína manifestação brasileira – e dizia ser fundamental o humor, para falar “de coisas graves e de coisas leves, mas sempre com humor”.

Palavras que traduzem um país

Sobre a crônica, afirmava também ser o de vida mais curta dentre os outros gêneros. “A crônica é retrato de um tempo. Se lermos as crônicas dos anos 50, veremos o Brasil dos anos 50. Mas, ao mesmo tempo, ela é efêmera, morre logo”, refletiu.

Seu primeiro livro publicado foi “O Popular”, pela Editora José Olímpio, no Rio de Janeiro, em 1973. Com o subtítulo “crônicas, ou coisa parecida”, a obra saiu como uma coletânea de textos já veiculados na imprensa, o que seria o formato da grande maioria de suas publicações até hoje.

Já a carreira de jornalista veio um pouco antes, com o começo no jornal gaúcho Zero Hora, em 1956, como colunista. Escreveu crônicas sobre futebol, cinema, literatura e comportamento com o humor e ironia que se tornaram característicos de sua obra.

Entre seus personagens mais marcantes, lembrados por muitos e descobertos com surpresa pelas gerações mais jovens, estão o Analista de Bagé, que recorria ao famoso “joelhaço” para curar dores emocionais, e a Velhinha de Taubaté, retratada como “a última pessoa no Brasil que ainda acredita no governo”, criada em meio à decadência da ditadura militar.

“Um dos maiores nomes de nossa literatura”, diz Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se manifestou sobre a morte do escritor Luis Fernando Verissimo, na manhã deste sábado (30). Ppor meio da rede social ‘X’, Lula apontou que Verissimo foi “um dos maiores nomes de nossa literatura e do nosso jornalismo”.

“Dono de múltiplos talentos, cultivou inúmeros leitores em todo o Brasil com suas crônicas, contos, quadrinhos e romances. Criou personagens inesquecíveis, a exemplo do Analista de Bagé, As Cobras e Ed Mort”, postou o presidente em suas redes sociais.

“Sua descrição bem-humorada da sociedade ganhou espaço nas livrarias e na TV, com a Comédia da Vida Privada. E, como poucos, soube usar a ironia para denunciar a ditadura e o autoritarismo; e defender a democracia. Eu e Janja deixamos o nosso carinho e solidariedade à viúva Lúcia Verissimo – e a todos os seus familiares”, finalizou o presidente.

A morte por Verissimo 

Com fama de ser um homem calado, Verissimo costumava dizer que não era ele que falava pouco, “os outros é que falam muito”. Em 2017, quando tinha chegado aos 80 anos, ele disse em entrevista ao programa Conversa com Roseann Kennedy, da TV Brasil, como gostaria de ser lembrado.

 “Gostaria de ser lembrado pelo o que eu fiz, pela minha obra, se é que posso chamar de obra, mas pelos meus livros. E, talvez, pelo solo de um saxofone, um blues de saxofone bem acabado”, contou. 

Na mesma entrevista ele disse que tinha uma fantasia de ser conhecido e viver apenas da música, que era sua paixão. E aconselhou que a vida não deve ser levada tão a sério.

“No fim, pensando bem, a vida é uma grande piada. Acontece tudo isso com a gente, e a gente morre…que piada, né? Que piada de mau gosto. Mas acho que temos que encarar isso com uma certa resignação, uma certa bonomia [bondade]”.