A posse do 47º presidente dos Estados Unidos foi marcada por um tom sombrio, alianças com bilionários das big techs e ameaças imperialistas que reacendem tensões internacionais
A posse do 47º presidente dos Estados Unidos foi marcada por um tom sombrio, alianças com bilionários das big techs e ameaças imperialistas que reacendem tensões internacionais
Donald Trump faz juramento como 47º presidente dos EUA. Foto: Reprodução/RRSS


O dia amanheceu frio em Washington, com termômetros marcando -8°C e sensação térmica de -11°C, no que se tornaria a posse presidencial mais gélida desde 1930. Ainda assim, o clima externo não foi suficiente para rivalizar com o ambiente carregado que marcou a cerimônia de posse de Donald Trump como o 47º presidente dos Estados Unidos nesta segunda-feira (20).

Entre os detalhes que transformaram o evento em um espetáculo distópico estavam o traje austero de Melania Trump, cuja escolha fez surgir comparações com “O Conto da Aia”, e a presença de magnatas como Elon Musk, Mark Zuckerberg e Jeff Bezos, todos celebrando em meio a discursos de viés autoritário e promessas de uma política expansionista que reacendeu tensões internacionais.

Como observou James Green em seu artigo nesta edição da Focus, um Trump menos atrapalhado e palhaço aparece desta vez, um Trump que “aprendeu” com os erros da primeira gestão e retorna mais preparado para atacar e cumprir seus planos, com uma equipe técnica motivada a cumprir seu projeto de poder. 

Convidados de honra da posse de Trump: Mark Zuckerberg, Jeff-Bezos, Pichai e Elon-Musk
Convidados de honra da posse de Trump: Mark Zuckerberg, Jeff-Bezos, Pichai e Elon-Musk

Uma posse marcada por excessos e gestos obscuros

A cerimônia, realizada na Rotunda do Capitólio devido às baixas temperaturas, reuniu não apenas políticos tradicionais, mas também figuras do mundo empresarial, sobretudo da elite bilionária das big techs. Elon Musk, futuro integrante do governo, protagonizou um momento controverso ao fazer uma saudação associada ao nazismo, que rapidamente viralizou e gerou condenações internacionais.

Enquanto assinava decretos que reforçam sua agenda de extrema direita, Trump acenava para os empresários que o apoiam sob o pretexto de “defesa da liberdade de expressão”. Musk, ao lado de Zuckerberg e Bezos, simbolizava a aliança entre política e capital, destacando a centralidade da elite econômica no governo que se inicia.

Discurso de posse

Seu discurso destacou a tese de que os EUA estão ameaçados por migrantes, especialmente da América Latina, e que os cidadãos foram “vítimas” da administração democrata. Trump acusou Biden de ser “incapaz” de lidar com crises internas, enquanto enfrenta “catástrofes” internacionais.

Em um aceno à sua política anti-imigratória, Trump afirmou que a administração atual garante segurança a “criminosos perigosos” que entraram ilegalmente no país, incluindo ex-detentos e pacientes psiquiátricos.

“Temos um governo que financia a defesa fora do país, mas se recusa a proteger seus próprios cidadãos”, criticou, aludindo aos conflitos na Ucrânia e Israel sem mencioná-los diretamente.

Referindo-se ao atentado sofrido durante sua campanha, declarou: “Nos últimos oito anos, fui testado como nenhum outro presidente. Aqueles que tentaram interromper nossa causa quiseram tirar minha liberdade e minha vida.”

Trump também surpreendeu ao citar Martin Luther King em um apelo às comunidades negras e hispânicas: “Hoje é o dia de Martin Luther King e, em sua honra, vamos fazer seu sonho se tornar realidade.”

Seu discurso foi aplaudido, com exceção de Biden, Kamala, o casal Bush e o casal Clinton que apenas assistiram. Kamala Harris levantou-se e foi seguida pelos demais quando Trump deu a entender que o acordo no Oriente Médio era um “reflexo” da sua volta à Casa Branca. O grupo voltou a sentar-se e levantou-se apenas para deixar a cerimônia. 

Extremismo, imperialismo e ameaças de guerra: uma nova era para os EUA de Trump
Incluindo Michelle e Eduardo Bolsonaro, comitiva da oposição assistiu posse de Trump pela TV de hotel, pois não foram convidados para a cerimônia oficial. A situação virou meme nas redes sociais Foto: Reprodução

A retórica imperialista toma forma

Em seu discurso, Trump não economizou no tom belicoso e expansionista. Entre as declarações mais polêmicas, prometeu “renomear o Golfo do México como Golfo da América” e retomou críticas ao controle do Canal do Panamá, sugerindo a intenção de “reassumir” o projeto. A presidente do México, Claudia Sheinbaum, ironizou a proposta, sugerindo que os Estados Unidos fossem rebatizados como “América Mexicana”.

Sobre a fronteira sul, Trump declarou estado de emergência para conter a imigração e prometeu deportar “milhões de criminosos estrangeiros”, reafirmando sua política anti-imigração. No mesmo tom, anunciou a intenção de plantar a bandeira americana em Marte, em um aceno à SpaceX de Musk, cuja recente explosão de um foguete parece não abalar o entusiasmo do magnata.

Cerimônia entre aliados e rivais

A solenidade contou com a presença de figuras como Joe Biden, Kamala Harris e Barack Obama, que assistiram de forma protocolar, evitando aplausos. Do outro lado, estavam representantes da elite global e líderes empresariais, entusiasmados com as promessas de Trump. A ausência de Michelle Obama, que ainda não superou as mentiras disseminadas por Trump sobre Barack Obama, foi notada.

Em tom quase monárquico, Trump destacou o papel da “grandeza americana” e sugeriu que sua reeleição foi uma resposta divina à crise que, segundo ele, foi instaurada pelos democratas. “Nos últimos oito anos, fui testado como nenhum outro presidente”, afirmou, mencionando o atentado sofrido durante sua campanha como prova de sua resiliência.

Reações nacionais e internacionais

Líderes globais reagiram de forma mista à posse. Enquanto Vladimir Putin elogiou o tom pragmático de Trump em buscar diálogo com a Rússia, o presidente brasileiro, Lula, adotou uma postura diplomática, destacando a amizade histórica entre Brasil e EUA. Por outro lado, países como Panamá e México criticaram a retórica imperialista do novo governo americano.

No Brasil, parlamentares petistas egressos do bolsonarismo que viajaram aos Estados Unidos para acompanhar a posse foram barrados na entrada do Capitólio, causando constrangimento. Gleisi Hoffmann ironizou o episódio, classificando-o como “um show de vira-latismo”.

Um novo capítulo de tensões globais

A posse de Donald Trump marcou o início de um mandato que promete intensificar as divisões internas e internacionais. Com um discurso repleto de ameaças veladas, acenos à extrema direita e promessas de uma agenda expansionista, o republicano demonstra que seu segundo mandato será, no mínimo, tão controverso quanto o primeiro.