Os dados mostram uma continuidade na recuperação da melhoria de vida da população; segundo o economista Pedro Rossi, o saldo é positivo, com contradições e incertezas no caminho
Balanço do 2º ano de Lula 3 traz índices econômicos positivos e desafios políticos
Diogo Zacarias – Ministério da Fazenda

No início de janeiro (7), a Receita Federal anunciou dados sobre a arrecadação do governo no mês de novembro de 2024: um montante de R$ 209,21 bilhões. A cifra representa um crescimento real de 11% em relação ao mesmo mês de 2023. No compilado de 2024, a soma foi de R$ 2,391 trilhões, um aumento real de quase 10%.

Os números crescentes da arrecadação, além de refletirem o trabalho árduo do governo no setor econômico, também sintetizam que, para além da reconstrução da da máquina estatal iniciada logo ao assumir o gestão, o governo Lula 3 caminha na direção do compromisso com o desenvolvimento e a consolidação das melhorias sociais, medidas consideradas bastante caras para o presidente.

Nesse sentido, o foco no equilíbrio econômico é uma meta central. Em entrevista à GloboNews, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, falou da questão fiscal e trouxe um balanço da atuação até aqui. 

“Nós vamos chegar com a economia muito mais arrumada do que nós herdamos, que é a minha missão como ministro da fazenda, entregar muito melhor do que nós recebemos, sem maquiagem, sem contabilidade criativa, sem calote, sem vender estatal na bacia das almas para favorecer grupos econômicos, sem deixar de enfrentar os jabutis de grupos empresariais campeões nacionais que, vira e mexe, conseguem benefícios no Congresso”, diz o ministro. 

Haddad completa destacando as perspectivas da pasta: “estamos contendo gastos da maneira adequada, sem prejudicar o trabalhador de baixa renda, garantindo os direitos consignados na constituição, tudo isso somado não é uma tarefa simples e nós somos os primeiros a reconhecer, mas nós vamos perseguir esse caminho e eu estou muito confiante de que nós vamos entregar o resultado”, afirma. 

Desafios e incertezas

Para o professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica, Pedro Rossi, “o balanço do governo Lula 3 é positivo, com contradições e incertezas”. 

“Positivo porque todos os indicadores sobre o mercado de trabalho e a questão da pobreza estão melhores nos últimos dois anos, mas as contradições ocorrem porque o governo tenta mover uma agenda econômica progressista em meio a herança de uma agenda neoliberal que está muito instituída, estruturada inclusive constitucionalmente, e no discurso, desde 2016 com a deposição do PT, com uma pressão da mídia sobre o gasto público”, analisa Rossi. 

O economista relaciona as incertezas para o restante do mandato, principalmente, a partir da retórica da imprensa sobre a economia. “O fiscal não é um nó do desenvolvimento, é um instrumento, mas ele não trava o desenvolvimento do Brasil como colocam, não há uma crise fiscal em curso. As incertezas são justamente por conta disso. As melhoras que tivemos nos últimos dois anos, eu atribuo à recomposição do orçamento para os ministérios, as políticas sociais, além da política de aumento do salário mínimo no primeiro ano de governo”, aponta. 

Queda do desemprego e desigualdade social 

Destacado como um dos principais pontos positivos da atual gestão, o quadro geral sobre o emprego no país mostra que a taxa de desocupação recuou para 6,1% – a menor da série histórica da PNAD Contínua, iniciada em 2012. O total de pessoas ocupadas no Brasil chegou a quase 104 milhões (sendo 39 milhões com carteira assinada); em agosto de 2020, o número de trabalhadores empregados era na casa de 82 milhões. 

Outro ponto relevante para o balanço dos dois anos do governo Lula 3 é a queda positiva de um índice que mede a desigualdade social nos países. O índice Gini varia de 0 a 1, e quanto mais próximo de zero, menos desigual é a sociedade. O pior nível de desigualdade da série foi em 2018 (0,545). Em 2024, o índice de Gini de renda domiciliar foi de 0,517. Segundo levantamento do IBGE, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, sem os programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, o índice no país estaria próximo de 0,555.

Apesar do recuo, os dados divulgados em dezembro de 2024, em referência ao ano de 2023, mostram que quase 59 milhões de pessoas viviam na pobreza e 9,5 milhões na extrema pobreza. 

O estudo leva em conta a chamada pobreza monetária, ou seja, a família que não tem rendimentos suficientes para prover o bem-estar. Com a melhora dos índices, a fatia da população que está em extrema pobreza terminou 2023 em 4,4%. A taxa era 5,9% em 2022. Em relação à pobreza, a proporção da população ficou em 27,4%. O índice era de 31,6% em 2022. 

O ano da colheita 

Em dezembro do ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou, em entrevista ao Fantástico, sobre sua avaliação e perspectivas para a segunda metade de seu governo. “Tudo o que foi planejado a gente fazer, até agora, está cumprido. Tudo. Criamos o Novo PAC e lançamos todos os programas que tinham que ser lançados. Eu tenho dito para os meus ministros: nós já plantamos. Agora, em 2025, é ano da colheita”, afirmou Lula. 

Autor do livro “Brasil em disputa: Uma nova história da economia brasileira”, lançado em setembro do ano passado pelo selo Crítica da editora Planeta, Pedro Rossi comenta a declaração do presidente. “O desafio é a continuidade da colheita porque a colheita já ocorre com a melhora dos indicadores. O grande desafio é a continuidade desse processo porque no terceiro ano há mais restrições do que nos anos iniciais”, avalia.  

Em Brasília, Pedro Rossi entregou um exemplar do livro a Lula. Ele disse, na ocasião, que o presidente é “o árbitro dessa disputa entre duas agendas, a neoliberal e distributiva”. A relação entre as diferentes agendas é a temática da obra. A pesquisa de Rossi está debruçada, entre outros pontos, nos períodos pré e pós-golpe contra a presidente Dilma Rousseff, que fez com que a economia “capotasse” nas palavras do autor, que destacou também as ameaçadas do programa “Ponte para o Futuro”, formulado no governo Temer e com continuidade de aplicação na política de Paulo Guedes, durante o período de Bolsonaro no poder. 

“Essa agenda não saiu de cena, as discussões sempre voltam, é o caso, por exemplo, do debate sobre a desindexação do salário mínimo da Previdência Social e a desvinculação dos pisos das áreas de Saúde e Educação”, lembra o economista.  

Democracia e o debate macroeconômico

Ao fazer uma análise mais geral do quadro atual a partir do viés político, Pedro Rossi comenta: “acredito que há um grande objetivo no governo que é o de recuperar a normalidade política, ou seja, fortalecer as instituições e fortalecer a democracia, sendo a democracia um processo que precisa sempre ser alimentado ou então ela não se realiza. É um governo de coalizão ampla e que, evidentemente, traz os projetos e debates econômicos que estão na raiz do PT”. 

Para o professor de economia da Unicamp, é necessário que o debate na sociedade passe por um entendimento sobre os objetivos dos gastos do governo. “Revisitar a história brasileira, entendendo os erros é importante. Pensar no modelo econômico como algo que fortalece a democracia. O governo Lula tem iniciativas muito interessantes, como a transformação ecológica, que não se faz sem investimentos públicos pesados. É preciso fazer o debate macroeconômico sobre cortes de gastos. Fazer investimento no futuro do Brasil é rentável, é bom para a sociedade brasileira, não apresenta nenhum risco, mas nós estamos ainda muito presos ao ‘curto-prazismo’, que domina o debate público desde 2015”, defende Rossi.