1º Seminário Metroferroviário do PT: Soluções para Mobilidade
Nota do Setorial Nacional de Logística, Transportes e Mobilidade Urbana do Partido dos Trabalhadores (PT)
A globalização neoliberal fracassou.
O Setorial Nacional de Logística, Transportes e Mobilidade Urbana do Partido dos Trabalhadores (PT), durante o 1º Seminário Metroferroviário, realizado nos dias 04, 05 e 06 de novembro de 2024, em Brasília-DF, apresentou uma análise detalhada da situação da mobilidade urbana e do sistema ferroviário brasileiro.
É fato que a privatização da malha ferroviária nacional foi realizada num arranjo de “filé com osso”, resultado de políticas sociais e fiscais neoliberais com ampliação desmedida da financeirização econômica, causando o enfraquecimento do financiamento de serviços públicos.
Em verdade, no discurso da 2ª sessão do G20, em 18.11.24, tem razão o presidente Lula ao afirmar que: “A globalização neoliberal fracassou.”. E não se trata de uma causalidade ou de má gestão econômica do capitalismo, mas sim da sua essência, cada vez mais orientada para a esfera das finanças especulativas, e na concentração e centralização de capital, em detrimento da tendência fundamental de agravamento das desigualdades.
O documento destaca os principais problemas e propõe soluções viáveis e sustentáveis para a revitalização do setor, visando ao desenvolvimento econômico e social do país, onde o serviço público deve estar a serviço da maioria da população trabalhadora.
O grande problema da mobilidade no Brasil
A mobilidade urbana no Brasil é um problema que afeta as cidades, e influencia na qualidade de vida de milhões de brasileiros. A precariedade dos sistemas de transporte público impõe à população deslocamentos longos, desconfortáveis, inseguros e atrasos, diariamente, sejam por trens, ônibus, metrôs ou automóveis. Acrescida pela queima de combustíveis fósseis pelos veículos rodoviários, contribui para a poluição do ar e o aquecimento global, e causa danos à saúde humana.
A liderança de Lula e a mobilidade como prioridade nacional
À exemplo das ações de combate à fome, propomos ao presidente Lula que a mobilidade urbana seja prioridade em seu governo, através da criação do programa “Transporte Para Todos”, com o objetivo de garantir um transporte público de qualidade aos brasileiros, e combater a exclusão social. A política pública sugerida é eficaz se implementada rapidamente, além de reduzir os custos com saúde, e promover desenvolvimento sustentável.
Situação do sistema metroferroviário nas metrópoles
As cidades brasileiras enfrentam problemas crônicos em seus sistemas de transporte sobre trilhos, sobretudo trens e metrôs.
E, geralmente, por serem caros, devido à produção de transporte que oferecem, e com manutenção precária dos veículos e equipamentos, em razão da prioridade aos lucros, ou da falta de recursos públicos suficientes, aumenta a quantidade de defeitos e quebras, e que causa paralisação dos serviços.
Em comparação ao modo rodoviário, o sistema viário e sua sinalização são providos pelo poder público, cabendo ao operador, apenas, investimentos em seus veículos. Assim, defendemos o mesmo tratamento aos transportes metroferroviários.
A falta de confiabilidade nessa prestação de serviços, o menor número de viagens oferecidas devido às falhas constantes, somada à cláusula contratual de reequilíbrio econômico-financeiro onde a redução de usuários não impacta na receita das concessionárias, e consequentemente, forçam a população a recorrer a alternativas ainda mais caras e de fontes poluentes, como ônibus, transporte individual ou particular.
Essa precariedade viola os direitos constitucionais de ir e vir e à mobilidade urbana eficiente, impedindo o pleno acesso ao trabalho, à educação, à saúde e ao lazer.
Propostas para os sistemas metroferroviários nas regiões metropolitanas
Para resolver a crise do transporte metropolitano, como o caso da Supervia no Rio de Janeiro – primeira concessão da Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU, e evitar que o problema se torne epidêmico nas demais operadoras estadualizadas e quase todas privatizadas, propomos uma gestão pública compartilhada entre União, Estado e Municípios, com rígido controle social, criando um modelo integrado que permita aumentar a eficiência e a acessibilidade aos transportes metroferroviários metropolitanos.
Esse modelo promoveria os investimentos necessários, dividiria os custos operacionais entre os consorciados, visando o aumento da velocidade operacional que atrairá grande número de passageiros, devido a redução dos tempos de viagem. Ademais, será capaz de retomar empregos, e minimizar o uso de ônibus intermunicipais concorrentes e o transporte individual.
Contudo, isso não seria apenas uma nova injeção de recursos para uma segunda privatização, tendo em vista que a forma adotada na primeira privatização da CBTU-STU/RJ, atualmente SUPERVIA, foi um fracasso total, resultando na evasão dos usuários devido a perda de confiabilidade nos serviços prestados. Para isso, deve ser previsto um sistema de penalização na hipótese de redução do número de usuários, ao contrário de recompensas pelo reequilíbrio econômico-financeiro.
Também as operadoras da CBTU e TRENSURB seriam beneficiadas com investimentos, no mesmo montante que seriam repassadas as privatizações, buscando uma oferta melhor dos serviços e não deixando-as sem recursos necessários sequer para sua manutenção, como é a receita neoliberal de prejudicar e degradar os sistemas públicos para privatizá-los. Essas empresas devem ser retiradas do PND, conforme prometido pelo governo federal, para que seja possível promover essas melhorias.
Nas operadoras privatizadas ou públicas, a União garantiria os investimentos necessários aos consórcios criados, com a participação e acompanhamento de técnicos da CBTU/TRENSURB na gestão, fiscalização dos serviços e na sua boa manutenção e conservação, além da expansão dos serviços, com apoio do PAC, programas do BNDES e/ou de linhas de financiamento internacionais (BRICS, BID e BIRD), para promoção de uma mobilidade urbana sustentável.
Propomos juntamente, através do BNDES, o financiamento da indústria ferroviária na produção de veículos ferroviários para passageiros, do mesmo modo para as pequenas e médias cargas, incluindo os correios, e até a compra de veículos para produção de transportes, agregado à produção de trilhos. Isso, associado ao não financiamento de empresas cuja conduta praticada é de despedida imotivada dos trabalhadores.
Para atender essas novas demandas de serviços de passageiros, além de melhorias nos sistemas da CBTU e TRENSURB, propomos a reintegração dos empregados dispensados da CBTU de Belo Horizonte-MG, privatizada no governo Zema, em quaisquer outras operadoras da CBTU e TRENSURB, como reforço de pessoal, sendo notável a mão de obra concursada, qualificada, treinada e especializada na prestação desses serviços, e na manutenção.
A ligística ferroviária regional de cargas e passageiros
A gestão das malhas ferroviárias está sob controle de concessionárias que operam concentradas nos lucros e em grandes clientes, como empresas de mineração e do agronegócio, negligenciando as demandas de outras cargas gerais com menor volume e do transporte de passageiros.
A ausência de um transporte ferroviário de passageiros e a dependência excessiva do transporte rodoviário de cargas afeta a competitividade e eleva os custos logísticos para pequenas e médias empresas e, por conseguinte, o aumento do Custo Brasil. Além do mais, sobrecarrega o sistema rodoviário, causando lentidão e acidentes frequentes, devido a alta densidade de tráfego.
O Brasil necessita ainda de projetos e investimentos em um transporte ferroviário mais rápido para ser competitivo com o transporte rodoviário. Atualmente, com as novas tecnologias para velocidades médias superiores a 100 km/h, em linhas para até 250 km/h, tornaria o transporte ferroviário imbatível para prestação desses serviços e aliviaria as rodovias, principalmente nas ligações de capitais e regiões metropolitanas.
Linhas de trens para essas velocidades, além de necessitar menores investimentos em sua implantação, comparadas aos “Trens Bala”, possibilitaria tarifas mais acessíveis aos usuários desse sistema. Para isso, sugerimos a implantação de novas linhas em bitola internacional, mais experimentadas para velocidades acima de 150 km/h, interligando suas capitais e o Distrito Federal, dentro de um programa de integração e segurança nacional.
Também se faz necessária a implantação do programa “Trens Regionais” em reestudos pelo Ministério dos Transportes, estendendo-o às regiões metropolitanas para o atendimento de passageiros e cargas de maior valor agregado (Short Lines).
A ferrovia centro-atlântica (FCA) e a Rumo Malha Oeste S.A (RMO)
A malha Centro-Leste sob concessão da Ferrovia Centro-Atlântica S.A (FCA), desativou quase um terço dos 7,2 mil quilômetros de malha por serem considerados antieconômicos, pela concessionária, seguindo seu modelo de negócio, que não inclui serviços de maior custo operacional com menor remuneração, sob a ótica apenas financeira da operação ferroviária.
A prorrogação antecipada da malha operada pela FCA está em andamento, já ocorreram as audiências públicas e aguarda-se a conclusão do relatório pela ANTT.
A FCA é controlada atualmente pela VLI Multimodal S.A. e atende os estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais, Goiás, Distrito Federal e São Paulo, servindo, predominantemente, grandes volumes, não opera serviços de passageiros e parou de atender cargas de menor volume, criando uma lacuna significativa e prejuízos econômicos para dezenas de cidades, comunidades e empresas instaladas ao longo das linhas férreas, além de dispensas sem justa causa e transferência de empregados para outras localidades fora do estado da Bahia, com redução drástica no número de funcionários nos últimos 10 anos.
A reativação de serviços em trechos paralisados e atendimento a pequenos e médios produtores sob um novo modelo de gestão, com a inclusão de serviços de passageiros e cargas de menor volume com trens regionais (Short Lines), poderiam proporcionar uma alternativa de transporte mais segura e sustentável, promovendo um maior desenvolvimento econômico dos estados que percorre.
A Malha-Oeste, sob concessão da RUMO Malha Oeste (RMO), com cerca de 1970 km, se destaca como uma ferrovia de grande importância para o atendimento das cargas do Mato Grosso do Sul e do Oeste Paulista, principalmente para exportação, sem contar sua posição estratégica para integração Sul-Americana ou defesa da soberania nacional, devido suas linhas chegarem até à fronteira com o Paraguai, pelo ramal de Ponta Porã-MS e a Bolívia em Corumbá-MS.
A Concessionária priorizou a Rumo Malha Norte, em detrimento da Rumo Malha Oeste onde deixou de operar cerca de 90% dessa malha, e promoveu a demissão em massa dos trabalhadores da ferrovia, ficando sem atender grãos, combustíveis, celulose e cargas gerais diversas de baixo volume, porém de grande importância para o pequeno e médio produtor, assim como para a economia regional e dos Estados que abrange.
Atualmente a ferrovia só atende a demanda de commodities, entre Corumbá e os portos fluviais de Esperança e Ladário, cerca de 110 km, escoando cargas de minério. O ramal de Ponta Porã foi abandonado, desde a concessão, e a maior parte do trecho Sul-Mato-Grossense e Paulista foram desativados. Essa ferrovia também operava o transporte de passageiros, excluído do contrato de concessão que se limitou apenas às cargas.
Com a falta dos serviços ferroviários, levaram a dependência exclusiva de uma logística rodoviária, que impõe um grande fluxo de caminhões e bi-trens carregados com minério, combustíveis, celulose e cargas agrícolas prejudicando o pavimento e a ultrapassagem segura devido a formação de enormes comboios, sem falar no maior custo operacional e a ruptura do acesso e comércio com a Bolívia e Paraguai.
A ausência de trens de passageiros obrigou a população a depender também de rodovias, com consequentes acidentes, custos elevados e emissões de poluentes. Uma reestruturação do modelo de gestão dessa malha, permitiria um transporte mais diversificado e acessível a todos, movimentando a economia regional para um desenvolvimento forte e permanente.
Propostas do Setorial para FCA e RMO
Propomos que através do Ministério dos Transportes, a gestão dos contratos das malhas ferroviárias seja realizada por intermédio de uma empresa pública vinculada ao mesmo, como a INFRA S.A., permitindo uma administração que priorize o interesse público. A FCA e a RMO poderiam operar em trechos específicos mediante subconcessões, junto com outras que se interessassem nessa prestação de serviços.
Propomos ainda a implementação do Plano Estratégico Ferroviário, realizado em 2023, pela Fundação Dom Cabral e a Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), cujo estudo apresenta uma proposta de reestruturação da malha e um estudo de demanda de transporte, reforçando a necessidade dos serviços ferroviários na Bahia (Campo Formoso-BA/Salvador-BA/Corinto-MG), além da manutenção dos empregos existentes.
Ademais, a INFRA S.A. faria a gestão dos contratos de concessão e da movimentação de cargas e passageiros, assim como do uso, ocupação e manutenção das linhas, em cooperação com o DNIT e a ANTT, que abrangeria o desenvolvimento de estudos e projetos, sem exclusão dos executivos, para implantação e coordenação dos investimentos públicos e privados, e de modo inclusivo a revitalização de trechos desativados. Faz-se ainda necessário, a implantação de um Conselho de Usuários dos Serviços Ferroviários para contribuir numa fiscalização mais efetiva dos serviços prestados.
Os recursos para manutenção do sistema viário, viriam das outorgas e das tarifas pagas pelo uso do quilômetro rodado sobre as linhas, seja para cargas ou passageiros.
Conclusões do Seminário
Essas propostas têm o potencial de transformar o sistema ferroviário e a mobilidade urbana no Brasil, utilizando empresas e órgãos existentes no âmbito da União, como a INFRA S.A., DNIT, ANTT, CBTU, TRENSURB, em um novo modelo administrativo das concessões para operação pública ou privada, voltado sempre para gestão e controle público dos serviços de transportes sobre trilhos.
Essa reorganização, proporcionaria um transporte sobre trilhos público acessível, não só aos grandes produtores de commodities, mas também às empresas que necessitam dos serviços de transportes para pequenos e médios volumes produzidos e para cidades que precisam dos serviços de transportes de passageiros de maior capacidade.
Com um modelo de gestão pública e integrada, este Setorial acredita que o Brasil pode garantir um transporte metroferroviário de qualidade, atendendo cargas e passageiros, ao mesmo tempo em que promove a sustentabilidade, o desenvolvimento econômico, a integração e a segurança nacional, além da melhoria da logística municipal, regional e nacional.
Brasília, 06 de novembro de 2024.
Setorial Nacional de Logística, Transportes e Mobilidade Urbana do Partido dos Trabalhadores (PT)
[1] Discurso do Presidente Lula na abertura da 2ª sessão de líderes do G20, no Rio de Janeiro-RJ, em 18/11/2024, disponível em https://www.cartacapital.com.br/politica/a-globalizacao-neoliberal-fracassou-o-discurso-de-lula-na-abertura-da-2a-sessao-de-lideres-do-g20/.