Entrevista: Pedro Tourinho, ex-vereador em Campinas fala sobre futuro político da cidade
Fernanda Otero
Pedro Tourinho tem por vocação cuidar de pessoas e escolheu a medicina como meio para estar próximo a todos e todas. Na faculdade, identificou seu objetivo de vida: fortalecer o SUS. Ao estudar e trabalhar na rede pública, percebeu que era preciso mais para garantir o direito à saúde. Era necessário estar onde as decisões são tomadas e, por isso, a política era o local para a verdadeira transformação da sociedade. Em entrevista à Focus, fala sobre a experiência como vereador de Campinas e o futuro político da cidade
Um vocacionado com uma necessidade muito forte de mudança. Essa frase não só define a personalidade do pré-candidato a prefeito pelo Partido dos Trabalhadores de Campinas, o médico sanitarista Pedro Tourinho de Siqueira, conhecido como Pedro Tourinho: sobretudo, revela seu entusiasmo para concorrer mais uma vez à prefeitura de uma das 15 maiores cidades do Brasil.
Pedro Tourinho, 42, nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais. Influenciado pela irmã mais velha, chegou a considerar a fotografia como carreira profissional, mas acabou optando pela medicina, onde poderia “trabalhar e atuar para transformar as coisas”. Estudou medicina na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Na faculdade, conheceu Ellen Rodrigues, também médica sanitarista. Concluíram que era necessário dedicar-se mais aos estudos. Por essa razão, mudaram-se para Campinas, em busca de oportunidades de estudar diretamente com suas referências teóricas: Márcio Pochmann e Gastão Wagner de Sousa Campos, cujos trabalhos admiravam. Unidos há 17 anos, o casal se estabeleceu em Campinas, cidade onde vivem e criam seus três filhos.
Em 2012, aos 30 anos, elegeu-se vereador pelo PT, sendo reeleito em 2016 com expressiva votação. Destacou-se pelo trabalho de fiscalização e denúncias de corrupção no Hospital Ouro Verde e em um contrato de publicidade municipal. Orgulha-se de ter defendido o projeto Mais Médicos, sua atuação foi fundamental para a formalização do convênio com a prefeitura.
Médico concursado na Prefeitura de Campinas e em Vinhedo, trabalha em postos de saúde na periferia e em bairros populares das cidades. Leciona como professor na disciplina de saúde da família na PUC-Campinas. Pedro Tourinho foi convocado pelo presidente Lula e, atualmente, preside a Fundacentro, Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho, vinculada ao Ministério do Trabalho, uma instituição voltada para o estudo e pesquisa das condições dos ambientes de trabalho.
Com uma população estimada em mais de um milhão de habitantes, Campinas é a terceira maior cidade do estado e uma das mais influentes do país, especialmente na região Sudeste. Campinas destaca-se como um centro de tecnologia e inovação, abrigando o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), várias universidades renomadas, como a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e inúmeros parques tecnológicos que atraem empresas de alta tecnologia, tornando-a um dos principais polos de pesquisa e desenvolvimento da América Latina.
Além disso, a cidade conta com robusta infraestrutura de transporte e logística, incluindo rodovias que a conectam a importantes centros econômicos do país, além do Aeroporto Internacional de Viracopos, um dos mais movimentados do Brasil.
Podemos começar falando de suas origens na política e a influência de sua família em sua trajetória?
Nasci em Belo Horizonte, Minas Gerais, e cresci em uma família de classe média que, na realidade, não tinha uma vivência política ativa. Não sou praticante atualmente, mas fui criado na fé católica. Tenho uma irmã mais velha, que é fotógrafa, e um irmão mais novo, que também é médico. A política, embora muito presente nos períodos eleitorais, não fazia parte do nosso cotidiano. Guardo uma lembrança carinhosa da primeira eleição da qual lembro ter acompanhado minha mãe. Ela pegou um santinho, e, como eu tinha acabado de aprender a ler, ri do nome do candidato em que ela iria votar: Patrus Ananias. Achava aquele nome muito curioso e engraçado; ele era candidato a vereador. Não esqueço que havia um desenho no santinho, e eu ainda era uma criança. Mas o fato é que cresci nesse contexto não particularmente político, e comecei a me envolver de verdade na vida política depois que me encontrei com o movimento estudantil na faculdade de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte.
Eu escolhi a medicina porque queria ser Médico Sem Fronteiras. Já tinha uma inclinação para a ação social na medicina do trabalho. Contudo, na época, não imaginava que viria a descobrir minha grande paixão: o Sistema Único de Saúde. O movimento estudantil e o contato com o movimento popular de saúde me abriram os olhos para o imenso processo civilizatório de garantia de direitos, participação e democracia institucional que é o SUS, que estava em construção e precisando de pessoas dispostas a se dedicar a esse projeto, que segue inconcluso até hoje. Foi na militância que conheci a Ellen quando estava na Bahia, ambos já trabalhando na rede. Nos encontramos trabalhando pelo SUS, construindo a Conferência Municipal de Saúde, atuando nas comunidades no movimento popular de saúde, sempre com um forte envolvimento comunitário. Esse encontro, que começou na política, transformou-se em amor, e já estamos juntos há 17 anos e temos três filhos. A experiência na Bahia foi extremamente importante para minha formação, ensinando-me muito sobre nossas contradições, limitações e avanços, além de o que significa, na prática, um governo do PT. Depois disso, minha companheira e eu decidimos que precisávamos estudar mais e viemos para Campinas, em busca de aprender com nossas referências teóricas. Eu queria estudar com Márcio Pochmann, Gastão Wagner e outras figuras da Unicamp que eu lia. E foi isso que fiz: vim para Campinas estudar. Me envolvi muito rapidamente com o movimento social aqui, uma coisa levou à outra, e daí pra frente, eu já estava engajado, mergulhado no movimento social na cidade de Campinas.
Quais caminhos te levaram da medicina à política? Você considera a política uma vocação?
Então, eu diria que tive duas grandes influências no início da minha trajetória: o movimento estudantil, onde na UFMG tínhamos uma proximidade significativa com o MST, participando do estágio interdisciplinar de vivência e tendo uma grande relação com o coletivo de trabalho e estudos em reforma agrária e saúde; e o movimento de saúde, cativante naquela época. Após me formar, optei por ser um médico popular, um educador social, e fui trabalhar em Camaçari, no litoral norte da Bahia, cidade que, na época, era governada pelo PT, sob a gestão de Luiz Caetano. Acredito que também tenha sido vocacionado, talvez, essa vontade real, esse sentimento forte de uma necessidade de transformação, de uma necessidade de mudança, um componente que sempre me tocou profundamente. Então, acredito que foi mais por aí que as coisas aconteceram. Não tenho um referencial individual, uma pessoa específica que me marcou profundamente, mas acho que tive várias figuras, professores, pessoas que sempre apresentaram uma visão progressista, um olhar social para a necessidade de transformação, marcado pelo encontro com a pobreza no Brasil nos anos 90. Desde muito novo, ainda adolescente, entendia que dedicar a vida a uma missão transformadora era não apenas valioso, mas indispensável. Isso me ajudava a encontrar um caminho para minha vida, um projeto, um rumo. Foi um quebra-cabeças de encontros que me inspiraram, sabe? Desde colegas, amigos, como o atual vereador Bruno Pedralva, em Belo Horizonte. Bruno foi coordenador geral do Diretório Acadêmico de Medicina junto comigo, crescemos juntos na compreensão da política. A atual deputada federal Ana Pimentel, do PT de Minas Gerais, também participou comigo no movimento estudantil, construímos uma trajetória conjunta. Alexandre Padilha foi uma figura de grande importância na formação da minha geração, entre várias outras figuras que contribuíram para construir esse quebra-cabeças. De Campinas, teve a médica Idê Lima, que foi uma médica popular, muito querida, que faleceu recentemente, infelizmente, mas é uma figura que é uma referência para Campinas toda. Professores como Emerson Merri e Gastão Wagner, foram somando para criar um senso de comprometimento com a militância, com a vida de luta, de transformação.
Quais os destaques da sua passagem pela Câmara Municipal de Campinas?
Fui vereador por dois mandatos, eleito em 2012, aos 30 anos, totalizando oito anos de mandato. Após este período, candidatei-me a prefeito na última eleição. Naquela eleição, o PT avançou para o segundo turno, competindo acirradamente com a direita. Durante o ano em que Marcio Pochmann disputou o segundo turno, perdemos a eleição por uma margem estreita, e eu decidi ser o porta-voz do projeto alternativo para a cidade que quase vencemos, assumindo uma posição de vereador de oposição por oito anos. Enfrentei muitas dificuldades, sobretudo porque o período de 2013 a 2020 foi bastante turbulento para a política nacional, especialmente para o PT. O que mais me orgulha, no entanto, foi ter sido um vereador profundamente dedicado às lutas sociais, aos movimentos sociais e populares da cidade, sempre presente nas discussões por moradia, educação e saúde. Atuei intensamente como fiscal da administração pública da cidade, sendo autor de denúncias significativas, como a do desvio de recursos no hospital Ouro Verde.
Também me orgulho de ter contribuído para a chegada do programa Mais Médicos a Campinas. A administração municipal inicialmente resistia em aderir ao programa por preconceitos contra os médicos cubanos. Descobri que havia mais de 60 médicos disponíveis no Ministério da Saúde que não estavam sendo convocados. Minha denúncia e insistência na mídia forçaram a administração a integrar Campinas ao programa. Fui ainda pioneiro na agenda nacional de humanização do parto e do nascimento, sendo o primeiro a propor um projeto de lei neste sentido no Brasil, o qual foi adotado depois por mais de 50 cidades brasileiras. Atuei fortemente junto ao movimento de moradia, participando das lutas por direito à permanência e regularização de ocupações e comunidades ameaçadas de despejo. No entanto, como sempre fui um vereador de oposição, meus projetos enfrentavam dificuldades para serem aprovados pela base governista. Assim, todas essas iniciativas foram conquistadas com muito esforço e luta. Durante esses oito anos, posso dizer que fui a principal voz de oposição na cidade, liderando a proposta de um projeto alternativo para Campinas e promovendo o debate de divergências na Câmara Municipal, o que movimentou bastante a cidade a partir da minha posição de vereador.
Na última eleição, em 2020, você chegou perto do segundo turno ao concorrer como candidato a prefeito. Atualmente, seu nome aparece em segundo lugar na pesquisa espontânea. Quais alianças você tem tentado para sua pré-candidatura e como está planejando lidar com a visibilidade de Campinas e sua importância na região metropolitana?
Primeiramente, Campinas se destaca como centro de uma região metropolitana com 3 milhões e 300 mil habitantes, classificada entre as dez regiões metropolitanas mais ricas do Brasil, contribuindo com 20% da produção científica nacional. É um polo industrial, educacional e uma verdadeira potência urbana. Economicamente e em termos populacionais, é maior do que outras importantes capitais brasileiras. Portanto, é uma cidade de grande relevância, tanto em São Paulo quanto em todo o Brasil. Nesse sentido, Campinas envolve discussões tanto locais quanto de abrangência nacional, sendo como outras grandes metrópoles brasileiras. Estamos buscando uma coalizão abrangente. Nós entendemos que, assim como aconteceu na disputa para o governo federal, é imprescindível construir uma frente ampla para derrotar a administração que está aqui hoje, uma administração que, a cada oportunidade, tem optado por se aproximar do Bolsonaro, do bolsonarismo. Além de conservadora, do partido Republicanos, essa gestão liderada pelo governador Tarcísio tem sido muito prejudicial, especialmente para os serviços e direitos da população carente e das camadas mais populares de Campinas. Nossos esforços estão voltados para dialogar com todos os partidos que compartilham do ideal de mudança. Mantemos diálogo com o PSOL, que foi nosso parceiro na última eleição, além de termos vereadores em Campinas. Também estamos em negociação com o PDT, que já tem uma aliança com PCdoB e PV, o Avante e outros partidos em potencial. Nossa expectativa é consolidar essas alianças.
Quanto ao governo federal, sua importância para nós é dupla. Primeiramente, o período em que Campinas mais avançou em termos de infraestrutura para os setores populares foi sob uma administração alinhada com o governo do presidente Lula e da presidente Dilma na década de 2000. Hospitais, rodoviária, melhorias em aeroporto, creches, postos de saúde, foram algumas das realizações desse período, deixando uma memória positiva na população sobre a eficácia de uma administração alinhada ao PT. Em segundo lugar, representa uma fonte de poder e articulação importantes, ampliando nossa influência e possibilitando um diálogo político mais efetivo. O presidente Lula é muito querido em Campinas, e sua presença na cidade sempre foi recebida com grande festividade pela população, demonstrando a disposição do povo campineiro por uma mudança positiva na cidade.
Como tem sido a experiência à frente da Fundacentro?
Atualmente, eu presido a Fundacentro, a Fundação Jorge Duparte Figueiredo, que é a entidade que cuida de fazer pesquisa, formação, difusão e inovação na área de saúde do trabalhador, segurança do trabalho, no Brasil todo. É uma entidade de distribuição nacional, nós temos 13 unidades pelo Brasil e tem sido uma experiência muito importante, muito desafiadora, que é a de tentar contribuir para a reconstrução de uma entidade que foi duramente atacada e sucateada no último governo, assim como tentar fortalecer uma agenda de política pública, que é a agenda de proteção ao mundo do trabalho. Esse desafio está sendo extremamente rico, tem sido uma experiência muito importante para mim, essa experiência do Poder Executivo, além de ser uma grande oportunidade de fortalecer também o campo da ciência e tecnologia no Brasil. A Fundacentro é uma ICT, uma instituição científico-tecnológica, e essa vivência, sem dúvida alguma, está me trazendo muitos aprendizados que eu vou usar em todos os lugares para onde eu for.
Você afirmou, em relação às eleições em Campinas, que a “a história não se repete”. Como posicionar experiências passadas em um novo projeto de cidade? Sobre a chapa, você considerou a escolha de uma mulher para concorrer à vice?
Em relação à escolha da vice, ainda estamos discutindo intensamente com os partidos aliados que compõem nossa coalizão. Sim, nós temos a preferência para que seja uma mulher, nós queremos que seja uma mulher que possa trazer elementos distintos, diferentes, ampliar o escopo da nossa da nossa chapa, mas isso está realmente em discussão ainda, isso é uma discussão que ainda não está amadurecida ou concluída. Sobre o passado, acredito que aprendemos com nossas experiências passadas. O povo brasileiro, incluindo o de Campinas, teve a oportunidade de se arrepender muito amargamente, porque foi um período desastroso para o Brasil, desastroso para a vida na cidade. Vivemos um período desastroso, marcado por divisões, violência e descaso com as necessidades da população. Foram anos de ataques ao Brasil. De divisão, violência, e principalmente de indiferença com as necessidades do povo, então a vida do povo piorou demais, a comida ficou cara e ninguém estava nem aí, o presidente estava nem aí, o povo morrendo de Covid, e o cidadão vendendo falsos remédios, promovendo charlatanismo, negando vacina. Tudo isso se soma para o entendimento de que o aprendizado histórico nos ajuda a não repetir erros do passado. Acredito que a história não se repete porque os tempos mudaram, e o Brasil está em um cenário muito melhor, distinto da gestão anterior. Por outro lado, há aspectos positivos que podemos buscar repetir. Já tivemos momentos de sucesso com administrações petistas em Campinas, como as prefeituras de Jacó Bittar, Toninho e Izalene Tiene, o que nos mostra a possibilidade de um novo ciclo de transformação e inclusão. O Partido dos Trabalhadores traz uma agenda de mudanças significativas alinhada com a recuperação da dignidade do povo brasileiro, dando indícios de um novo capítulo de vitórias e sucesso, considerando a fadiga do atual grupo político que há 12 anos se mantém no poder em Campinas. Estamos em busca de fazer história novamente, sendo essa a nossa expectativa para o futuro.