Inclusão de vacinas contra covid para  crianças de até cinco anos no Programa Anual de Imunização do Ministério da Saúde para 2024 revive o pesadelo negacionista antivacina da pandemia; Nísia Trindade é convocada para esclarecimentos

Uma nova onda de negacionismo tomou as redes desde que o Ministério da Saúde incluiu a obrigatoriedade da vacina para crianças até cinco anos no Programa Nacional de Imunização de 2024.  Na última semana,  deputados bolsonaristas lotados na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos Deputados conseguiram aprovar a convocação da ministra da Saúde, Nísia Trindade, para audiência sobre a vacinação a ser realizada em 28 de novembro. 

Entre os deputados que assinaram o pedido estão políticos que se notabilizaram por declarações contra as vacinas e que minimizar os perigos da covid 19, como os  deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP),  Nikolas Ferreira (PL-MG), Bia Kicis (PL-DF) e Carlos Jordy (PL-RJ). Outros apoiadores do ex-presidente Bolsonaro, que não hesitaram em propagar fake news a respeito das vacinas durante os piores momentos da pandemia, como Osmar Terra, Janaína Paschoal, Gustavo Gayer, também se manifestaram nas redes sociais contra a vacinação de crianças.

O arsenal de argumentos também segue inalterado: para os negacionistas, a vacina contra covid ainda não teria sido suficientemente testada para se aplicada em bebês e crianças ou representaria riscos demasiados de efeitos colaterais. Em outra linha de justificativas, alegam que bebês e crianças não “precisariam” da vacina, uma vez que, caso contaminados, não desenvolveriam os sintomas mais graves da doença. 

Por fim, também tentam classificar a vacinação como um “perigo para as famílias”. De acordo com Eduardo Bolsonaro, a obrigatoriedade é “um ataque frontal contra a família”. “Nunca um ataque foi tão frontal contra a família e a liberdade geral. Se executada mesmo esta política em 2024, para picar bebês de 6 meses de vida (…) estará aberta a porteira para absolutamente qualquer coisa, bastando apenas uma desculpa para deixar sem ação parte da população.”.

Mesmo depois da longa CPI da covid, que concluiu pelo descaso do governo de Jair Bolsonaro na pandemia e pediu seu indiciamento por crime contra a humanidade, o discurso do bolsonarismo radical ainda apresenta se mostra impermeável à racionalidade, às evidências científicas e adesão da maioria da população à vacinação e aos programas de imunização. Pesquisa recente conduzida pela Rede de Pesquisa Solidária e pela USP revelou que 98% dos pais e mães de filhos menores de 14 anos são favoráveis à vacinação de seus filhos. Além disso, mais de 83% dizem que já levaram seus filhos para serem vacinados.

Ainda assim, os números indicam que a vacinação infantil contra a covid ainda está abaixo do esperado. Segundo o boletim Observa Infância, produzido pelo Icict (Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde), da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), só 11,4% das crianças abaixo de cinco anos apresentam o esquema vacinal completo, o que equivale a pouco mais de 5,29 milhões de crianças imunizadas. A população estimada no país para 2023, nesta faixa etária, é de 13.122.252 crianças. E, ao contrário do que propala o bolsonarismo negacionistas,  a covid tem um alto risco nas crianças menores. 

O pesquisador do Icict e coordenador do Observa Infância, Cristiano Boccolini, aponta o negacionismo e os movimentos antivacina entre os resposnáveis pela baixa cobertura vacinal nessa faixa etária: “Existe uma potencialização do movimento antivacina, que ganhou espaço e voz, inclusive com um ex-presidente que liderava o movimento e um ministro da Saúde que colocou várias restrições à vacinação, uma falsa sensação de segurança dos pais que as crianças seriam menos atingidas por Covid e o medo de efeitos colaterais. Tudo isso prejudica a vacinação. “Foi veiculado que criança não morria ou não pegava Covid, mas isso não é verdade. O que infelizmente observamos é que nos dois primeiros anos da pandemia morreram cerca de duas crianças por dia com menos de cinco anos por Covid”

A inclusão da vacina contra a covid no calendário obrigatório de imunização a partir de 2024 foi medida tomada em consonância com as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde) no último dia de outubro, de acordo com a secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, Ethel Maciel. “Alinhados com a recomendação da Organização Mundial da Saúde recente, a gente passa a incorporar a dose no calendário anual de vacinação para grupos prioritários. Aqui no Brasil, ampliamos um pouco o grupo que a OMS recomenda, que é mais restrito. Vamos, na campanha de 2024, manter os mesmos grupos de 2023. Essas são as duas mudanças fundamentais”, explicou. 

Além das crianças até 5 anos, fazem parte do grupo prioritário idosos, imunocomprometidos, gestantes, puérperas, trabalhadores da saúde, pessoas com comorbidades, indígenas, ribeirinhos, quilombolas, pessoas vivendo em instituições de longa permanência e seus trabalhadores, pessoas com deficiência permanente, privados de liberdade maiores de 18 anos, adolescentes e jovens cumprindo medidas socioeducativas, funcionários do sistema penitenciário e pessoas em situação de rua.

Pessoas que não estejam em nenhum dos grupos prioritários poderão tomar a vacina, depois que forem atendidos os mais vulneráveis. De acordo com Esther Maciel, desde que a vacinação contra covid foi iniciada em em 2021, os dados apontam sua eficiência: “Temos já elementos muito robustos e contundentes que indicam a segurança e a efetividade da vacina. No Brasil, tínhamos 4 mil pessoas morrendo todos os dias por Covid. Hoje, temos 42. Essa é a maior prova da efetividade da vacina.”

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