Um chamado evangélico face ao conflito Israel-Hamas:  precisamos clareza de pensamentos para não confundir o cenário atual com o bíblico para evitar um ciclo de violência

Coordenação Nacional do Núcleo de Evangélicos do PT

A associação feita por alguns segmentos evangélicos entre o Estado de Israel moderno e o Israel bíblico, além de contradizer o entendimento cristão sobre Jesus como o Messias, serve apenas para perpetuar o ciclo de violência na região.

A realidade do conflito entre Israel e o Hamas, no território palestino, é uma história de dor e sofrimento que perdura há décadas. Como membros do Partido dos Trabalhadores e, acima de tudo, como cristãos evangélicos, somos chamados a ser instrumentos de paz e reconciliação, repudiando veementemente toda forma de violência, especialmente quando resulta na perda de vidas.

É imperativo que nos debrucemos sobre as raízes históricas deste conflito para aspirar a uma solução pacífica. Este entendimento também nos convida a refletir sobre a interpretação equivocada de associar o Estado de Israel moderno ao Israel bíblico, uma narrativa que tem sido utilizada para legitimar o avanço de Israel moderno sobre terras palestinas.

A Bíblia nos ensina, através das palavras de Jesus, o valor da vida e a importância do amor ao próximo. Em Mateus 5:9, Jesus nos diz: “Bem-aventurados os pacificadores, pois serão chamados filhos de Deus”. Em outra passagem, Mateus 22:39, Ele instrui: “Ama o teu próximo como a ti mesmo”. Estes ensinamentos são claros convites à paz, ao amor e à tolerância.

Não há margem para interpretação quando lemos em 1 João 2:9 que “Aquele que diz que está na luz, e odeia a seu irmão, até agora está em trevas” e em 1 João 4:20: “Se alguém diz: ‘Eu amo a Deus’, mas odeia seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê”. 

É inconcebível e incoerente que qualquer cristão evangélico possa defender a guerra e o massacre de um povo. O Evangelho de Cristo não oferece qualquer justificativa para a morte de milhares de crianças e, como ele mesmo ressaltou em Mateus 18:6, “mas, se alguém fizer tropeçar um destes pequeninos que creem em mim, seria melhor para ele que uma grande pedra de moinho fosse pendurada em seu pescoço e fosse afogado nas profundezas do mar”.

A associação feita por alguns segmentos evangélicos entre o Estado de Israel moderno e o Israel bíblico, além de contradizer o entendimento cristão sobre Jesus como o Messias, serve apenas para perpetuar o ciclo de violência na região. Esta interpretação ignora a rejeição de Jesus como Messias pela religião judaica e, consequentemente, o movimento que culminou no cristianismo.

Além disso, a relação política e militar entre Estados Unidos e Israel, muitas vezes endossada por segmentos evangélicos, merece uma análise crítica. O conceito de “Destino Manifesto” nos Estados Unidos, que se vê como “o novo Israel para o mundo”, muitas vezes é absorvido e difundido por parte da massa evangélica brasileira, criando uma predileção por Israel como “povo escolhido” e “nação santa”, independentemente das atrocidades cometidas pelo Estado de Israel.

Já no Velho Testamentos fomos instruídos a não admirar quem pratica a violência: “Não inveje o homem violento e não escolha nenhum de seus caminhos.” (Provérbios 3:31). A lei é categórica: não matarás; não tomarás a propriedade do teu próximo. A paz no Antigo Testamento não é ausência de guerra, mas fruto da justiça.

É importante ressaltar que nem o Hamas significa a totalidade da população palestina, que não pode ser punida pelos crimes da organização, ainda mais da forma desmedida e desproporcional como vem acontecendo, nem os judeus podem ser punidos pelas ações de seu governo sionista, que tem utilizado o conflito para promover uma limpeza étnica na região. 

Nesse cenário, o governo Lula acerta ao condenar o terrorismo e se empenhar na criação de uma grande articulação internacional, com o apoio de mais de 50 países, para tentar derrubar o veto dos Estados Unidos à resolução do Conselho de Segurança da ONU que propõe uma “pausa humanitária” para evacuação de civis de Gaza, política humanitária e pacifista com a qual concordamos e apoiamos do mesmo modo que repudiamos todas as tentativas de setores extremistas do Brasil de atribuírem ao governo Lula e às esquerdas a falsa imagem de apoio ao terrorismo. Defendemos a paz, o imediato cessar-fogo como condição humanitária, a criação e o reconhecimento do Estado Palestino soberano e a coexistência pacífica entre dois Estados nacionais.

O dramaturgo da antiga Grécia, Ésquilo, sabiamente disse que numa guerra, a primeira vítima é a verdade. Nós, enquanto cristãos, repudiamos a mentira, descrita pelo próprio Cristo como filha do diabo, conforme registrado em João 8:44. Todo aquele que segue a Cristo tem a obrigação de preservar a verdade: “Portanto, cada um de vocês deve abandonar a mentira e falar a verdade ao seu próximo, pois todos somos membros de um mesmo corpo” (1 Pedro 2:14).

Como cristãos evangélicos e membros do Partido dos Trabalhadores, nosso compromisso é com a justiça, a paz e a solidariedade, valores fundamentais do Evangelho de Cristo. É nosso dever, então, repudiar a violência e buscar uma solução pacífica para o conflito Israel-Hamas, mantendo sempre acesa a esperança por um futuro de paz fruto da justiça e reconciliação para todos os povos daquela região. •

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