Morto aos 65 anos, militante e formulador político era colaborador da Fundação Perseu Abramo. Companheiros lembram de sua ampla formação cultural, refinamento, humor e senso prático — marcas de sua personalidade

Artur Araújo, assessor da Fundação Perseu Abramo e colaborador desta revista Focus Brasil, morreu no último dia 12 de junho, aos 65 anos. Artur estava na fila de espera por um transplante de coração desde que sofrera um infarto no final de 2021. As limitações decorrentes não o impediram de continuar trabalhando e formulando propostas de ação política e pautas para reportagens e artigos. Casado por duas vezes, Artur deixa um filho, Otávio, 36 anos, que mora no Canadá.

Otávio, por sinal, era o codinome que Artur adotou quando ingressou na luta contra a ditadura civil-militar brasileira. Nos anos 1970, fez parte do movimento estudantil, militou na Ação Popular Marxista-Leninista e depois no PCB, antes de ingressar no recém-fundado Partido dos Trabalhadores.

Naquela época, segundo testemunhos de pessoas que conviveram com ele, Artur já exibia algumas de suas marcas, como a ampla formação cultural, o amor pela leitura, a arguta visão política e de conjuntura. Também era conhecido pela gentileza e candura no trato pessoal, o humor fino e nada óbvio – ainda que denunciado por sua ampla risada – e um certo inconformismo com as estruturas e convenções.

Artur não concluiu o curso de Engenharia que iniciou na Escola Politécnica da USP, mas dele jamais abandonou o gosto pelo pensamento estratégico de médio e longo prazo, movido pela ideia de desenvolvimento econômico com distribuição de renda e ampliação da democracia. Ele costumava trabalhar esses temas nos artigos que publicava, nos últimos anos, em canais como o site Outras Palavras.

Ao mesmo tempo, tinha faro para os temas urgentes e de apelo popular, algo que evidenciava nas reuniões de pauta para a revista Focus Brasil. Na Fundação Perseu Abramo, ainda criou e coordenou projetos como o programa de entrevistas e debates semanal Pauta Brasil, em que colocava em cena não apenas sua sólida formação e sintonia fina com os acontecimentos recentes, mas também a arte da conversa franca e inteligente, que atraía convidados que se revelavam também amigos e seus admiradores.

Ao longo de sua trajetória, Artur atuou como assessor na prefeitura de David Capistrano Filho na cidade de Santos, entre 1993 e 1996, administração que ajudou a forjar o chamado estilo petista de governo. Ele também atuou como consultor e assessor do movimento sindical e, na iniciativa privada, como administrador no setor hoteleiro. No primeiro governo do presidente Lula, foi dirigente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur).

Sua segunda esposa, Sonia Castelar, geógrafa e professora, destaca o compartilhamento como uma das facetas de Artur: “Ele era preciso em suas análises de conjuntura, muito realista e crítico. Tinha um humor bem ácido. Lia muito e conversava sobre o que lia, fazia questão de indicá-las”, lembra. “Era de boa conversa e cozinhava bem. Mas o Artur tinha algo muito especial e raro nos dias atuais: era ético, correto e leal com seus amigos. Muito coerente com seus princípios políticos”.

Aloizio Mercadante foi quem convidou Artur para trabalhar na Fundação Perseu Abramo, quando presidiu a organização, entre 2020 e 2022. Atual presidente do BNDES, Mercadante se recorda do amigo, que conheceu na USP e no movimento estudantil: “Ele teve uma vida dedicada à luta por um país democrático, justo, solidário e socialista. Foi um militante com profundo compromisso, competência e dedicação com a nossa causa. Nesse período mais recente, contribuiu muito, especialmente depois do golpe contra a presidenta Dilma, a partir da Fundação Perseu Abramo, na constituição dos Núcleos de Acompanhamento de Políticas Públicas (NAPPs), do Plano Emergencial de Emprego e Renda, do Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil, que foi a base do programa de governo da chapa Lula-Alckmin”.

O pneumologista que o acompanhou no tratamento ao longo dos últimos anos e também militante do PT, Ubiratan de Paula Santos, fala dele como uma pessoa brilhante. “Eu o conheci quando trabalhávamos em Santos, há mais de 30 anos. Era um companheiro de luta pela democracia e pelo socialismo dentro do PT. Leitor voraz, sentiremos falta de sua inteligência e cultura geral muito extensa, com capacidade de intervir sobre os mais variados assuntos. Certamente uma perda importante para todos nós”, lamenta.

O professor Gilberto Maringoni, também amigo de Artur Araújo, despediu-se destacando a combinação de pragmatismo e refinamento: “Artur foi um intelectual sem obra escrita ou vida acadêmica. Era um cultor da conversa e da polêmica, com percepções e sacadas sempre inusitadas e dono de irritante realismo. Chamava atenção sempre para aspectos concretos e quase comezinhos da vida política”, escreveu.

“Mesmo quando estava em uma situação de saúde delicada e internado no hospital, Artur me pediu para continuar trabalhando e colocamos banda larga e computador no quarto dele para que ele seguisse ativo”, lembrou Mercadante. “Artur deixa uma imensa saudade e o exemplo de ter sido um companheiro dedicado, íntegro e incansável”. •

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