Exército compra equipamento para acessar celulares. Líder do PT alerta para o risco de violação do sigilo. “É grave que a força possa dispor de uma ferramenta com potencialidade de espionar cidadãos, imprensa e adversários”, critica Reginaldo Lopes

 

Em meio aos ataques constantes do Palácio do Planalto às urnas eletrônicas, adversários políticos e à própria Justiça Eleitoral, uma revelação surpreendeu Brasília na última semana. A Folha de S.Paulo denunciou na quarta-feira, 3, que o Comando de Defesa Cibernética do Exército, liderado pelo general Heber Garcia Portella, comprou no ano passado equipamentos para hackear telefones celulares, extrair conteúdo de nuvens e acessar dados de redes sociais, como Twitter, Facebook e Instagram.

A compra foi feita com dispensa de licitação no fim de 2021, quando o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, ainda era o comandante do Exército. O líder do PT na Câmara dos Deputados, Reginaldo Lopes (MG) alertou para os riscos de o Palácio do Planalto se transformar no Grande Irmão, do romance “1984”, de George Orwell, que a tudo vigia e mantém o povo sob monitoramento.

“Ora, num momento em que a democracia, poderes e instituições sofrem ataques autoritários reiterados do presidente da República, especialmente a Justiça Eleitoral, com o beneplácito das Forças Armadas, parece muito grave, face ao pleito eleitoral em curso, que uma instituição como o Exército possa dispor de uma ferramenta com potencialidade de espionar cidadãos, imprensa, e adversários, desestabilizando ou podendo influir no processo democrático”, criticou o parlamentar.

Ele pediu à Procuradoria da República no Distrito Federal que investigue a compra do sistema de espionagem que permite a extração de dados de aparelhos celulares e de redes sociais. Ele pediu ao MPF que adote medidas preventivas para impedir possíveis crimes, além de responsabilizar os envolvidos.

A ferramenta é normalmente utilizada por polícias civis, Polícia Federal, Instituto Nacional de Criminalística e Ministério Público como forma de acessar dados, inclusive bloqueados, de telefones celulares apreendidos a partir de decisões de busca emitidas pela Justiça. Os documentos da contratação feita para a unidade do Exército não especificam quais aparelhos celulares passariam a ser acessados nem qual é o embasamento jurídico para esse tipo de acesso a dados privados.

A própria Folha questionou o Exército sobre a aquisição da ferramenta e o objetivo da compra em cinco emails enviados desde 25 de maio. Não houve resposta. “A justificativa para a aquisição de uma solução para perícia em dispositivos móveis é o histórico de demandas apresentadas ao ComDCiber [Comando de Defesa Cibernética] nos últimos três anos”, afirma um dos documentos elaborados para a contratação, com data de 14 de junho de 2021.

A opção do Exército foi pela solução Cellebrite UFED, “com hardware próprio comercializado no Brasil”, segundo os documentos da contratação. A empresa TechBiz Forense Digital é a única fornecedora da ferramenta no Brasil e, por isso, seria impossível fazer uma licitação, conforme os documentos. Realizados os trâmites internos, a empresa foi contratada em 28 de dezembro de 2021. O valor do contrato é de R$ 528 mil, com vigência de 28 de dezembro de 2021 a 27 de dezembro de 2024. •

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