Especialistas apontam que a crescente insegurança alimentar no país está prejudicando o desenvolvimento infantil. A desnutrição pode impactar diretamente na evolução do cérebro das crianças

 

Com aproximadamente 43,2% da população brasileira sofrendo em algum nível de insegurança alimentar, as crianças são as mais atingidas pela fome que assola o país. Segundo especialistas, a desnutrição, além de atrasar o desenvolvimento infantil em todas as fases do crescimento, pode impactar diretamente na evolução do cérebro.

O pesadelo da volta do Brasil ao Mapa da Fome pode comprometer a vida das crianças brasileiras pelas próximas gerações. Isso porque, durante os primeiros anos de vida, o cérebro evolui muito rapidamente e para que ele se desenvolva saudavelmente é preciso uma boa nutrição.

Em entrevista à BBC Brasil, a professora do departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), Márcia Machado, alerta para o impacto na evolução do cérebro infantil diante da desnutrição.  Ela integra o Comitê Científico do Núcleo Ciência Pela Infância.

“O cérebro de uma criança se desenvolve de uma forma muito intensa no período que vai da gestação até os 5 anos de idade e a desnutrição pode ter impactos profundos nesse processo, em casos mais graves ou de privação longa até irreversíveis”, alerta.

Na última pesquisa do Índice Geral de Preços (IGV), o valor dos alimentos acelerou e o leite, alimento considerado fundamental na nutrição das crianças, foi o que mais subiu: 16,30%. A coleta de dados, realizada entre 11 de junho e 10 de julho, mostra o cenário desesperador que as famílias brasileiras enfrentam ao tentar comprar alimento.

Médicos alertam para os primeiros 1 mil dias de vida, período que vai do início da gravidez até os 2 anos, como fase crucial para o desenvolvimento físico e mental do ser humano. “Muitos estudos mostram que a privação de alimentos enfrentada pela mãe pode repercutir tanto no crescimento quanto no desenvolvimento da criança, pois o sistema neuronal necessita de eletrólitos, proteínas, vitaminas e outras substâncias para ser ativado”, ressalta Márcia.

Coordenadora Nacional do Setorial de Segurança Alimentar do PT, Adriana Aranha destaca os retrocessos desde o golpe contra a Dilma Rousseff, em 2016, que colocou o país de volta ao Mapa da Fome e desconstruiu políticas públicas que impulsionavam a economia do país e ajudava o povo brasileiro.

“A fome não iniciou na pandemia, mas antes, desde o processo do golpe, quando acabaram com o Ministério de Desenvolvimento Agrário, com o programa Fome Zero e o Conselho Nacional de Segurança Alimentar no Brasil, e isso trouxe consequências”, denuncia.

“Não temos recursos para nenhuma cisterna no semiárido. Os programas de aquisição da agricultura familiar foram desconstruídos, os restaurantes populares, as cozinhas comunitárias. Os municípios ficaram à própria sorte, sem nenhum apoio do governo federal para o que já tinha conseguido tirar o Brasil do Mapa da Fome. É uma vergonha o que estamos vivendo hoje”, lamenta Adriana Aranha. •

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