Pela primeira vez, um presidente de esquerda governará o país. Em sua terceira tentativa de se eleger, Gustavo Petro, ex-prefeito de Bogotá e senador, venceu com a proposta de fortalecer o Estado, transformar o sistema de saúde e previdência e mudar a política energética

 

Após quatro décadas de luta, primeiro nas armas e depois na democracia, o revolucionário de óculos que sobreviveu à tortura e ao exílio veio para conquistar a Presidência da Colômbia: Gustavo Petro, aos 62 anos, triunfou no domingo no segundo turno das eleições presidenciais. O senador foi eleito com 50,45% dos votos contra  o empresário Rodolfo Hernández, que recebeu 47,3% dos votos.

Ele comemorou a vitória ainda no domingo. “Hoje é feriado para o povo. Que ele celebre a primeira vitória popular. Que tantos sofrimentos sejam amortecidos na alegria que hoje inunda o coração da Pátria. Essa vitória para Deus e para o Povo e sua história. Hoje é o dia das ruas e praças”, escreveu Petro em sua conta no Twitter.

Em seu primeiro pronunciamento como presidente eleito, Petro saudou a esperança. “A mudança significa o acolhimento à esperança, a possibilidade de abrir um futuro, a mudança significa abrir oportunidades para todos os colombianos e colombianas, essa esperança pode encher todos os cantos do território nacional, a mudança significa que o governo da esperança”, afirmou.

No discurso de vitória, defendeu a conciliação. Assim como o Brasil, a Colômbia atravessa uma crise e a opinião pública está dividida. Mas Petro prega a unidade. “Não é hora de ódio. Este governo que começará em 7 de agosto é um governo de vida. Em que consiste um governo da vida? Primeiro na paz, segundo na justiça social, terceiro na justiça ambiental, a paz como eixo de um governo da vida” , disse.

Assim como Lula, Petro disputava pela terceira vez a Presidência, desta vez triunfando e impondo uma derrota às elites. O ex-prefeito e senador propõe fortalecer o Estado, transformar o sistema de saúde e previdência e suspender a exploração de petróleo para dar lugar à energia limpa diante da crise climática.

Nascido em 1960 em Ciénaga de Oro, no departamento caribenho de Córdoba, Petro cresceu e estudou no interior do país, em Zipaquirá, cidade andina perto de Bogotá. É o mais velho de três irmãos, de família de classe média, com pai do litoral e mãe do interior.

Essa mistura também persiste em seu caráter: tímido e quieto, mas um grande orador e que se mostra confortável quando sobe ao palco em praças públicas, onde deslumbra seus ouvintes com frases bombásticas e grandes discursos.

Na escola La Salle de Zipaquirá, a mesma por onde passou Gabriel García Márquez, Petro respondeu aos padres com altivez e ali começou sua militância lendo intelectuais marxistas. Em 1978, aos 18 anos, ingressou no grupo guerrilheiro M-19, onde trabalhou principalmente como ligação urbana e não na luta armada, até seu desarmamento em 1990.

Dos 12 anos que viveu nas fileiras do M-19 sob o nome de “Aureliano”, como o personagem de “Cem Anos de Solidão”, passou três na clandestinidade e outros dois na cadeia. Capturaram-no em 1985 em Bolívar 83, bairro popular de Zipaquirá que ele ajudou a fundar, e o torturaram como a tantos guerrilheiros da época.

O Petro que tentou novamente ser presidente em 2022 estava longe daqueles anos de militância e luta armada, e com certeza sua etapa como parlamentar pesa mais sobre ele. Nunca se sentiu à vontade com armas, mas com palavras, com as quais se defendeu na Câmara dos Deputados e no Senado.

Moradores e estrangeiros costumam reconhecê-lo como um dos parlamentares mais lúcidos da Colômbia nas últimas décadas, e ganhou popularidade no início dos anos 2000 por suas denúncias sobre as ligações entre políticos e paramilitares, tornando-se também uma dor de cabeça para seu arqui-inimigo, o ex-presidente Álvaro Uribe, e processando várias pessoas.

Lula saudou a vitória do senador. “Felicito calorosamente os companheiros Gustavo Petro e Francia Marquez e todo o povo colombiano pela importante vitória nas eleições deste domingo”, escreveu o ex-presidente brasileiro nas redes sociais. “Desejo sucesso a Petro em seu governo. A sua vitória fortalece a democracia e as forças progressistas na América Latina”.

A ex-presidenta Dilma Rousseff também celebrou o triunfo da chapa do Pacto Histórico na Colômbia. “O triunfo histórico do companheiro Gustavo Petro e da companheira Francia Marquez é uma grande vitória do bravo povo colombiano e é também um alento e uma renovada esperança para todas as nações da América Latina que lutam por democracia e contra o neoliberalismo. Viva a Colômbia”, escreveu. • Com Página 12

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