O que pensa a população não-polarizada
Neste artigo, trazemos as análises do Núcleo de Opinião Pública, Pesquisas e Estudos, da Fundação Perseu Abramo, abordando os resultados do estudo mais recente do próprio Noppe, intitulado “Percepções e Valores da Sociedade Brasileira Não-Polarizada”. As últimas pesquisas realizadas pelos institutos mostram que avaliação do governo Bolsonaro segue estagnada e cenários eleitorais cristalizados, sem grandes alterações.
O estudo do Noppe, realizado com metodologia qualitativa de entrevistas em profundidade, traz como principal resultado a heterogeneidade da camada da população pesquisada, que circula por valores progressistas e conservadores de forma não-linear baseados em experiências muito próprias.
Detectamos a tendência de aceitação maior entre jovens e mulheres de valores vinculados aos direitos civis e às liberdades individuais, bastante próximos ao progressismo. Resultados que dialogam com o que trabalhamos em artigos anteriores redigidos para a Focus Brasil – visto que ambos são segmentos que rejeitam fortemente o bolsonarismo.
O conservadorismo deste perfil organiza-se muito por conta do debate sobre a autonomia da mulher, em especial na rejeição à legalização do aborto e na percepção da divisão sexual do trabalho. Há reconhecimento de existência de preconceitos, de ordem racial e de gênero, com receptividade bastante ampla ao casamento civil para a população LGBTQIA+ e também à adoção por casais não-heteronormativos. Aprofundamos tal análise em artigo recente para a revista Teoria e Debate, também editado pela Perseu Abramo.
O ‘excesso de poder’ e a corrupção dos ‘mais ricos’ seriam os responsáveis, junto da classe política, por tornar a vida dos brasileiros difícil e penosa. Para superar tal condição, tais segmentos veem a saída nos valores ligados ao trabalho, com um pensamento bastante vinculado à persistência e resiliência frente às inúmeras adversidades que o povo brasileiro convive, numa percepção de que ele trava uma batalha diária pela sobrevivência.
Com base nisso, essa faixa da população vê o ‘trabalhador’ como virtude, e não como uma posição na sociedade de classes – que estaria organizada em torno do que distingue “ricos”, “pobres” e “classe média”.
Quadro político e eleitoral
Os cenários eleitorais seguem estagnados, de acordo com a pesquisa Ipespe. Lula (PT) mantém o mesmo patamar, por volta de 43%, desde agosto de 2021. Bolsonaro (PL) mantém-se por volta dos 25% desde novembro do mesmo ano. O Ipespe traz ainda empate entre Sergio Moro (Podemos) e Ciro Gomes (PDT): 8%. João Doria tem 3%, seguido por André Janones (1%).
A distância entre Lula e Bolsonaro em um eventual segundo turno segue a mesma desde setembro do ano passado, por volta de 23 pontos percentuais de vantagem para o ex-presidente — neste levantamento, 54% a 31%. Em um improvável segundo turno entre Moro e Bolsonaro, há mais brasileiros que optam por não escolher entre ambos (38%) do que brasileiros que escolhem o ex-juiz (32%) ou o atual presidente (30%).
Já a pesquisa do PoderData traz tendências distintas do Ipespe e de outros institutos mencionados em artigos feitos anteriormente para a Focus Brasil. Lula segue na liderança com 40%, mas sua vantagem teria caído 5 pontos em um mês. Bolsonaro agora tem 31%.
O levantamento mostra que teria havido uma queda na vantagem no segundo turno, na ordem de 7 pontos percentuais. Agora são 15 pontos de vantagem para Lula, que tem 50% das intenções de voto contra 35% de Bolsonaro. No cenário do primeiro turno, Moro teria 9% e Ciro 4% — outros levantamentos têm apontado para empate entre ambos. Por fim, Doria teria 3%, seguido por 2% de Janones.
De acordo com a mais recente pesquisa do Ipespe, a avaliação do governo Bolsonaro segue estável, com 54% de reprovação e 24% de aprovação – mantendo o mesmo patamar desde agosto, considerando a margem de erro de 3,2 pontos percentuais. O mesmo é demonstrado na pesquisa PoderData: 56% avaliam o governo como ruim ou péssimo, enquanto 28% o consideram ótimo ou bom – sem variação desde o último levantamento.
O levantamento Ipespe foi realizado entre 7 e 9 de fevereiro, com 1 mil entrevistas telefônicas, feitas por operador humano, e margem de erro de 3,2 pontos percentuais. Já a pesquisa PoderData foi realizada entre 13 e 15 de fevereiro, com 3 mil entrevistas telefônicas (operador automático) e margem de erro de 2 pontos.
Segundo o Ipespe, a maioria da população (63%) considera que a economia brasileira está no caminho errado. Há uma possível queda desta percepção, visto que em novembro eram 69% – um empate técnico, no limite da margem de erro. Houve aumento, dentro da margem, da percepção de manutenção do emprego — de 60% para 65% desde o último levantamento.
Apesar da possível melhora nas expectativas, quando o assunto é inflação e endividamento, o cenário é outro: 71% consideram que houve aumento significativo nos preços no último período. E outros 25% reconhecem que houve aumento em alguma intensidade. Em relação ao futuro, 63% esperam mais aumento daqui para frente, 21% esperam manutenção e somente 12% relatam que haverá diminuição. Alia-se a isso, a baixa expectativa de redução do endividamento próprio no próximo período: somente 23% esperam tal feito.