O povo brasileiro precisa estar no centro das políticas públicas. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem repetido este bordão desde o ano passado. Na entrevista coletiva concedida a veículos da mídia independente, na quarta-feira, 19, Lula tratou de saúde pública, da Covid-19, do teto de gastos — imposto pelo Golpe de 2016. Mas deixou claro: luta contra o aumento da desigualdade.

“É preciso que a gente recupere a democracia para colocar a desigualdade na ordem do dia, como prioridade de um governo”, disse. “E não a prioridade ser o teto de gastos. Pra gente colocar como compromisso com a evolução social e deixar em segundo plano o compromisso fiscal”.

O ex-presidente denunciou mais uma vez a conduta criminosa de Jair Bolsonaro ao longo da pandemia. “Um presidente que não respeita as mais de 620 mil mortes de Covid. Não há um gesto de carinho dele com as pessoas que sofreram Covid”, criticou. “Um presidente que tem que ser responsabilizado em algum momento da história por pelo menos metade das pessoas que morreram, o que poderia ter sido evitado, se o Brasil tivesse agido de forma civilizada”, comentou.

Lula lembrou que não cabe unicamente ao governo combater a pandemia, mas conduzir o processo, mobilizando setores em cada uma das etapas. “Mas ele (Bolsonaro) fez questão de destratar tudo o que poderia ter sido feito. Inclusive na escolha de seus ministros da Saúde”, bateu. “Eu nunca vi gente pra tratar da doença, do sofrimento dos outros, inclusive de crianças, nunca vi gente com tanta falta de humanismo, com tanta falta de afeto, como a gente viu nestes últimos dias”.

Ele lembrou que a saúde pública no Brasil foi exemplo e agora está ameaçada pelo próprio governo federal. “Falar em fazer uma consulta antes da dar vacina nas crianças é uma coisa tão absurda, num país que se tornou um país respeitado no mundo pela cultura de vacinação que nós aplicamos. Este é um momento muito delicado”, lamentou.

Lula reafirmou que o teto de gastos da União é um mal que aflige o país em diversas áreas, inclusive a pesquisa e o atendimento em saúde, e que, mais do que nunca, agora é a hora da vacina. Ele afirmou que vai garantir o cumprimento de outros tetos.

Para ilustrar as carências sociais de grande parte do país, recorreu à questão da moradia, o que o levou a lembrar de que já viveu “num quarto e cozinha com 13 pessoas”.

Emocionado, após citar esse período da sua vida, Lula disse: “Então, eu tenho consciência do que este povo está passando. Não posso ganhar aos 76 anos e dizer: ‘olha gente, eu ganhei, mas não posso fazer as coisas. Desculpa, mas eu tenho de atender o mercado. Eu preciso ter responsabilidade fiscal, respeitar o teto de gastos’. E o teto de comida? E o teto de salário? E o teto de saúde? Quem é que vai devolver para esse povo?”.

Sobre as alianças políticas, o ex-presidente apontou que está procurando construir um arco de apoios que permita o avanço das conquistas. “Eu não estou procurando uma aliança para ganhar as eleições. Estou procurando construir um conjunto de alianças com forças políticas para me ajudarem a fazer a transformação que precisamos no Brasil”, disse.

Como exemplo, citou a reforma tributária, mudança que tentou implementar, sem sucesso, em 2007, quando era presidente. “Eu mandei uma proposta que teve o apoio dos 27 governadores, de todos os líderes partidários, apoio das 27 federações da indústria do Brasil, de todas as centrais sindicais, e quando chegou no Congresso, não andou”, lembrou. “Tem uma força oculta que não deixa a política tributária andar”, disse.

“Se não pudermos fazer uma reforma tributária complexa, podemos fazer uma mudança de pouco. Vamos definir que quem vive de dividendos pague imposto de renda. E quem ganha até cinco salários-mínimos não pague imposto de renda. Temos que definir algumas coisas para dar mais sustentabilidade aos de baixo e mais compromisso com o Brasil aos de cima”, lembrou.

Na avaliação do ex-presidente, o quadro em que se encontra o Brasil é pior do que aquele que encontrou em 2003, e essa é uma razão para que ele faça a atual costura política em torno de sua candidatura. “A situação do Brasil está muito pior. O país piorou, é como aquele jogo de palito: soltou, abandonou, caiu um pra cada lado. Não há orientação. É esse país que nós vamos ter de remontar”, disse.

Lula declarou que é possível reconstruir numa perspectiva que o povo brasileiro tem demais, que é o afeto. “Uma coisa fraterna, uma coisa solidária. Ninguém precisa ficar brigando com ninguém. Não precisa ter medo, o Lula não é de perseguir ninguém, eu não vou fazer com eles o que eles fizeram comigo. O meu compromisso é fazer para o povo, nada contra os outros”, anunciou.

O ex-presidente prometeu uma campanha “leve, simpática”. E pretende levar a mesma atmosfera para um futuro governo. “É assim que eu quero levar este país. Este país precisa de muita, muita, muita, muita, muita solidariedade, muito amor, muito carinho, muita alegria. Isso que nós vamos construir”. •

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