Dário Pignotti | Página 12

 

Bolsonaro está irremediavelmente isolado. Com Luiz Inácio Lula da Silva, Alberto Fernández e Cristina Fernández no palanque montado na Plaza de Mayo na sexta-feira, possivelmente o capitão-presidente e seus assessores do “gabinete do ódio”, grupo de funcionários dedicados à divulgação de fake news e propaganda negativa, assistiu à transmissão do acontecimento comemorativo do 38º aniversário da recuperação democrática na Argentina.

É impensável uma comemoração semelhante em Brasília, onde o regime se propõe a erradicar a palavra “golpe” dos livros didáticos para se referir à derrubada do presidente João Goulart em 31 de março de 1964, data que passou a ser comemorada como “revolução” pelo atual governo.

Apesar de não ser presidente em exercício, Lula foi recebido como se fosse. Reuniu-se com o chefe de Estado argentino e a vice-presidente, e se mostrou a dezenas de milhares de pessoas, exibindo uma popularidade “extraterritorial” da qual Bolsonaro não goza. Ele foi avisado que, se algum dia voltar a Buenos Aires, terá que enfrentar protestos como o realizado há um mês em Glasgow, na Escócia, durante a cúpula da COP26, onde uma manifestação de jovens o evocou com o grito de “genocida”.

Indagado por que o presidente não compareceu à conferência onde havia dezenas de dirigentes, o vice-presidente Hamilton Mourão respondeu: “Porque iam recebê-lo com pedras”. O general expressou algo que reflete a preocupação do governo com a péssima imagem global do presidente, que praticamente não saiu do país desde que assumiu o cargo, há três anos, e quando o fez foi para visitar com frequência o ex-presidente Donald Trump.

O jornal O Globo publicou na quinta-feira, 9, matéria sobre o mau humor que prevalecia no Palácio do Planalto por conta da viagem do líder do PT a Buenos Aires. Bolsonaro está “muito irritado”, informou o site.

Presumivelmente mal-humorado, ou talvez fora de controle, o capitão aposentado cancelou a cúpula presidencial do Mercosul em 17 de dezembro. Seria seu primeiro encontro cara a cara com Alberto Fernández, a quem insultou várias vezes desde julho de 2019, quando o então candidato à Presidência visitou Lula, na sede da Polícia Federal de Curitiba, onde ele cumpria pena armada do ex-juiz e agora candidato à presidência Sergio Moro.

À primeira vista, é incompreensível que Bolsonaro seja um dos poucos presidentes no mundo que se opõe tanto à vacina, quanto à máscara e ao certificado de imunização para estrangeiros, apesar do risco que isso acarreta após o surgimento da variante Omicron.

A verdade é que em sua corrida obsessiva para suceder Donald Trump como rockstar neofascista, ele sabota o passaporte de vacinação para fazer de seu país um destino turístico de negadores, uma espécie de meca da barbárie que pode projetar sua imagem entre os ultrasconservadores.