O tema do suicídio carrega enorme importância ao debate de atenção à saúde pública, tanto é que 10 de setembro é marcado como o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio, e no Brasil há campanhas relacionadas ao “Setembro Amarelo”.

Relatório de 2021 da OMS mostra que as taxas de suicídio estão diminuindo no mundo, mas, nos últimos 20 anos tiveram um aumento de 17% nas Américas, especialmente entre os jovens de 15 a 29 anos, e com destaque aos países latino-americanos.

No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, entre 2011 e 2017 houve um aumento no número de óbitos por suicídio entre os jovens de 15 a 29 anos. Mas há um perfil que é importante ser destacado, foram majoritariamente do sexo masculino (79,0%) e negros (54,9%). Dentre as principais causas de morte de jovens negros no Brasil estão as violentas, com destaque para a principal delas, o homicídio, seguida do suicídio.

Além disso, pesquisas apontam que a população LGBT apresenta um risco maior de sofrerem com doenças psiquiátricas e cometer suicídio que a população cisgênera e heterossexual. Em síntese, o racismo, a homofobia e a transfobia são fatores ampliam processos de vulnerabilização de determinados grupos sociais.

Existem várias formas de olhar para o fenômeno do suicídio e construir estratégias de cuidado e enfrentamento pela perspectiva da saúde pública, porém, frequentemente são propostas saídas individuais para problemas que são produzidos coletivamente. Por isso temos que ficar atentos com a lógica de haver meses com cores específicas para cuidado em saúde, pois eles tendem a representar o corporativismo e interesses de uma ou mais classes de profissionais do que apresentar reflexões e saídas efetivas que a dimensão da questão de cuidado em saúde demanda. É fundamental construir saídas para um problema de saúde reconhecendo que estes exigem enfrentamento público e coletivo.

Lélia Gonzalez, em resumo apresentado na Segunda Conferência Anual do African Heritage Studies Assotiation em 1979, formula vigorosamente as relações entre a divisão racial do trabalho e desenvolvimento no Brasil, e aponta que por falta de condições dignas de trabalho — que implica em condições de vida também esvaziadas de dignidade em termos de saúde, moradia, educação etc — os jovens negros nos anos 1970 foram levados à falta de perspectiva de vida e projetos de futuro.

Mais de 40 anos depois, a realidade pouco avançou, o Brasil está encarando uma agenda neoliberal, em profunda crise econômica, política e social. No último período nós vivemos a precarização da CLT. Soma-se a isso a histórica marca de mais de 14 milhões de brasileiros e brasileiras sem emprego e, acompanhando o IBGE, taxa que tende ao crescimento. O IBGE também aponta que a taxa de desemprego não é maior porque o trabalho por conta própria tem crescido, mas não nos enganemos, estamos falando da uberização do trabalho, das pessoas fazendo entrega de bicicleta, ou Uber com carro alugado com a gasolina a 07 reais e sem nenhum, absolutamente nenhum, direito trabalhista garantido.

Estamos num momento de aprofundamento da miséria no país, segundo dados do IBGE em 2018 pelo menos 14 milhões de famílias brasileiras usavam lenha ou carvão para cozinhar, estamos falando de 01 a cada cinco famílias brasileiras. E esse dado, sem dúvida, aumentou no último período, estamos chegando a valores recordes no preço no botijão de gás.

Mas, o que fazer? Devemos construir estratégias de enfrentamento coletivo! E temos exemplos pedagógicos recentes. Quando o Brasil está passando por uma crise de fome, a Coalização Negra Por Direitos tem feito uma campanha nacional de combate à fome, que foi é possível porque a sociedade civil está organizada. Além do trabalho impressionante do MST com distribuição de alimentos e o debate sobre alimentação saudável.

Defender o Sistema Único de Saúde, a Reforma Psiquiátrica e a luta Antimanicomial que tem a prerrogativa de cuidado em saúde coletivo, em liberdade e protagonismo dos trabalhadores e usuários dos serviços nos processos de gestão dos equipamentos de saúde. Nesse sentido é importante estarmos atentos ao retrocesso do investimento Federal nas comunidades terapêuticas.

A saúde mental das pessoas só é possível enquanto projeto coletivo de vida livre. Construir estratégias coletivas de enfrentamento ao suicídio, é, concretamente, enfrentar o genocídio do povo negro brasileiro. Precisamos tecer projetos pautados na dignidade à condição de vida da população negra, isso quer dizer, a promoção do pleno emprego, moradia digna, salário digno, reforma agrária, respeito aos povos originários.