Despenca a renda dos brasileiros
Inflação recorde e desemprego histórico corroem o rendimento médio do trabalhador, 9,4% inferior a 2019. Entre a parcela mais pobre da população, perdas chegam a 21,5%. E o poder de compra da cesta básica com um salário mínimo é o menor em 15 anos
Frutos da política econômica do desgoverno Bolsonaro, a inflação recorde e o desemprego histórico estão corroendo os rendimentos de trabalhadores e trabalhadoras do país. A renda média se encontra 9,4% abaixo do nível do final de 2019, e entre a metade mais pobre da população o abismo é ainda maior, chegando a 21,5%. A estimativa é do economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Social.
Neri aponta o aumento do desemprego como principal causa da queda de renda da metade mais pobre da população. Para a maioria da população, o impacto da falta de trabalho foi de -11,5%. Além disso, muitos dos brasileiros na base da pirâmide social se retiraram do mercado de trabalho por falta de perspectiva de encontrar ocupação.
“A redução de renda dos ocupados, fruto da aceleração da inflação e do próprio desemprego, e a redução da jornada de trabalho completam a queda de renda dos pobres entre o último trimestre de 2019 até o segundo trimestre de 2021, como aproximação dos efeitos totais da pandemia”, explica o economista.
Neri presidiu o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2012 a 2014 e foi ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República de 2013 a 2015, no governo Dilma Roisseff. Entre as maiores vítimas da derrocada promovida pela equipe do ministro Paulo Guedes, estão idosos, nordestinos e mulheres.
Os idosos tiveram um recuo de 14,2% na renda média. Os nordestinos perderam 11,4%, enquanto no Sul a perda foi de 8,4%. E as mulheres, que precisaram cuidar dos filhos em casa, sofreram redução na renda de 10,35%, contra 8,4% entre os homens. Os três grupos amargaram perdas superiores à média (-9,4%).
A consultoria Tendências – que considera, além da renda proveniente do trabalho, outras fontes como Previdência, transferências sociais e lucros, aluguéis e outros – espera queda de 3,2% na massa de renda total das famílias para este ano. O quadro é ainda mais dramático para a classe D/E, com queda projetada de 14,6%.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada no fim de agosto pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), também aponta perdas. A estimativa é de que o rendimento médio dos trabalhadores baixou 6,6%, para R$ 2.515, no segundo trimestre de 2021, em relação ao mesmo período de 2020.
Pelos dados da Pnad, que avalia o mercado de trabalho de formais e informais ligados ao setores privado, público, trabalhador doméstico, empregador e empregado por conta própria, o país ainda tem um contingente de pessoas ocupadas estimada em 6,9 milhões abaixo do nível pré-pandêmico — considerando os dados de fevereiro de 2020.
Nesse quadro de completa deterioração do mercado de trabalho, o boletim Salariômetro da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), da Universidade de São Paulo (USP), revela que de janeiro a abril deste ano, 61,6% das negociações salarias coletivas entre patrões e empregados resultaram em reajustes abaixo da inflação.
Apenas 25,4% dos acordos coletivos repuseram a alta de preços e menos ainda (13%) resultaram em reajustes acima do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), indicador que é referência para os reajustes salariais. No Boletim Focus divulgado pelo Banco Central na última segunda-feira, 6, o mercado financeiro aumentou, pela 22ª semana consecutiva, a projeção para a inflação do país para 7,58% em 2021.
E a última Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, divulgada em julho pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), identificou um valor médio de R$ 560,65 da cesta básica em 17 capitais analisadas. O valor equivale a 55,68% do ganho líquido do trabalhador remunerado com um salário mínimo (R$ 1.100).
Com isso, o poder de compra da cesta com um salário mínimo é o menor em 15 anos. O Dieese estima que o salário mínimo necessário deveria ser equivalente a R$ 5.518,79, valor que corresponde a 5,02 vezes o piso nacional vigente. O cálculo é feito levando em consideração uma família de quatro pessoas, com dois adultos e duas crianças. Como resultado, avançam a miséria, a fome e a falta de perspectivas no país de Jair Bolsonaro.