II ENEN – ENCONTRO NACIONAL DE ENTIDADES NEGRAS – 1999

Flávio Jorge Rodrigues da Silva

Passados quase oito anos do I Enen, com a participação de cerca de trezentos delegados, convidados e observadores, representando vinte Estados do país, a Coordenação Nacional de Entidades Negras – Conen, realizou, dos dias 8 a II de outubro, na cidade do Rio de Janeiro, o II Enen – Encontro Nacional de Entidades Negras.

O I Enen, realizado entre os dias 14 e 17 de Novembro de 1991, em São Paulo, significou a expressão e síntese de uma estratégia utilizada pelo movimento negro contemporâneo, dos últimos 30 anos: a de denúncia da situação de desigualdade e exclusão da população negra da vida política, econômica e cultural do país.

Os debates e conclusões do I Enen apontaram para a não presença do negro nos setores mais organizados da classe trabalhadora, dada a sua participação marginal no processo de produção; a prioridade dos setores organizados na “unidade da classe trabalhadora” em detrimento das questões específicas inerentes à sua composição; por fim, a ideologia da democracia racial incorporada por diversos segmentos sociais, conservadores e progressistas, que anestesiou durante muito tempo a consciência e a visibilidade do que seja o negro no Brasil.

Permitiram, também, o início de uma discussão sobre a necessidade da construção de um projeto político global de combate ao racismo, trazendo a questão racial enquanto um dos grandes impasses nacionais a serem solucionados num projeto alternativo de Brasil.

O II Enen, além de buscar a consolidação e legitimidade da construção nacional de uma complexa e articulada estrutura política organizativa de “entidades e grupos de maioria negra que tenham o objetivo específico de combate ao racismo e/ou expressar valores culturais de matrizes africanas, e que não tenham vínculos com as estruturas governamentais ou partidárias”, avançou no debate sobre o projeto político iniciado no I Enen.

Este avanço pudemos constatar nos encontros de articulações (relações e parcerias políticas, mulheres negras, sindicalistas negros, comunidades negras rurais, juventude negra, operadores de direito, pré-vestibular para negros, empresários negros, universitários negros, religiões afro-brasileiras) e nas exposições temáticas dos seguintes grupos de trabalho: Estado, poder e participação política da população negra do Brasil; Cultura, Identidade e Consciência Racial; Comunidades negras rurais e o problema da terra no Brasil; Saúde e sexualidade da população negra brasileira; Desenvolvimento sustentável e qualidade de vida da população negra no Brasil; Desenvolvimento econômico, trabalho c geração de renda; Direitos humanos e relações raciais no Brasil; Diáspora hoje: relações internacionais e globalização; O Estágio das pesquisas sobre a questão racial e os movimentos sociais negros no Brasil; Educação e pedagogia interétnica; Políticas Públicas e de ações afirmativas no Brasil.

Um exaustivo mas produtivo Encontro realizado com o tema “500 anos de racismo em tempos de globalização e exclusão social”, que finalizou com a aprovação de um plano de lutas e do “Manifesto do Rio de Janeiro”, que a partir de uma leitura da conjuntura internacional e nacional da realidade das populações e dos movimentos sociais negros, foi formulado com o seguinte norte político:

Nesse cenário, o combate ao racismo está associado à luta contra o capitalismo. A democratização do poder, a distribuição de renda e a questão da terra tornam-se eixos qut devem orientar a nossa mobilização e organização. É impossível pensar a superação do racismo sem que essas condições sejam garantidas para todos”.

Superar o racismo implica, antes de tudo, garantir condições iguais e dignas de vida para todos, visando superar as desigualdades de raça, classe e gênero. Implica na redistribuição radical das riquezas e dos gastos públicos para as políticas de atendimentos às demandas sociais. Em uma política pública que priorize os setores menos favorecidos, principalmente quando sintetizam alto grau de pobreza, de discriminação racial ou de gênero, na perspectiva de atingir a igualdade de condições sociais.

Implica construir um projeto político onde a igualdade social e a pluralidade racial sejam os pontos centrais.

O II Enen aprovou, também, um novo formato para a composição da direção da Conen, que terá como tarefa encaminhar as decisões do Encontro, fortalecer a estruturação dos Fóruns Estaduais de Entidades Negras, implementar a ação dos Comitês Estaduais do Movimento de Resistência Indígena, Negra e Popular – Brasil: Outros 500 e organizar o Congresso Nacional de Entidades Negras para o ano de 2001.

Fonte: PT Notícias, nº 86, novembro de 1999, p. 06. Acervo: CSBH/FPA.

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