Via portal https://www.gov.br/mre/pt-br/

(Tradução Fábio Pessôa)

Excelências,

Um genocídio está em andamento em Gaza.

O povo palestino, quando não executado diretamente, está sendo deliberadamente condenado à fome, à miséria e à morte.

Até março de 2025, mais de 50.000 crianças e adolescentes palestinos foram mortos ou feridos em Gaza.

A fome foi transformada em arma, colocando centenas de milhares em risco nutricional – incluindo 132.000 crianças menores de cinco anos, 41.000 das quais estão em estado crítico.

Apenas 1,5% das terras de Gaza permanecem adequadas para a agricultura. Quase 80% da infraestrutura e 92% das casas foram danificadas ou destruídas, deixando 1,35 milhão de pessoas sem abrigo adequado.

No entanto, Israel mantém um bloqueio ilegal à ajuda humanitária e a obstrução do trabalho das Nações Unidas. Dois parlamentares brasileiros integram a flotilha, juntamente com outros 15 cidadãos brasileiros, uma iniciativa da sociedade civil para romper o cerco a Gaza. Sua segurança deve ser preservada e o Brasil monitora de perto suas atividades.

Portanto, o Brasil parabeniza o Grupo de Haia por seu esforço em mobilizar apoio internacional para pôr fim ao genocídio da população palestina.

Excelências,

O direito internacional exige que os Estados não apenas se abstenham de cometer genocídio, mas também o previnam. Falhar nessa regra pode acarretar responsabilidade dos Estados, inclusive por cumplicidade em genocídio.

Chegou a hora de os Estados cumprirem suas obrigações sob a Convenção sobre Genocídio, adotando medidas eficazes para garantir que não colaborem, direta ou indiretamente, com seus perpetradores.

Na Conferência de Alto Nível sobre a Implementação da Solução de Dois Estados, o Presidente Lula anunciou medidas concretas:

– A investigação e o controle mais rigoroso das importações de assentamentos ilegais;

– A contínua negação de exportações de defesa para Israel;

– O apoio a uma missão internacional de verificação liderada pela ONU para monitorar o cumprimento do direito internacional e a um mecanismo inspirado no Comitê Especial contra o Apartheid;

– Apoio técnico à Autoridade Palestina e apoio contínuo às atividades da UNRWA;

– Garantir uma distinção fundamentada entre críticas legítimas às políticas e práticas estatais que afetam os palestinos e o antissemitismo.

Excelências,

Na semana passada, o Brasil apresentou oficialmente sua intervenção no caso da CIJ movido pela África do Sul sob a Convenção sobre Genocídio.

Fizemos isso guiados não apenas por um dever legal, mas por um profundo senso de responsabilidade de defender a proibição absoluta do genocídio e garantir que a Convenção mantenha seu pleno poder protetor.

O Brasil acredita firmemente que o genocídio deve ser compreendido em sua verdadeira complexidade – como um crime composto, revelado não apenas por atos isolados, mas por padrões sistemáticos de conduta que, em conjunto, demonstram a intenção de destruir um povo, no todo ou em parte.

Neste contexto, o Brasil rejeita o uso indevido da legítima defesa como pretexto para ações ilegais. A legítima defesa não se aplica no contexto de uma ocupação ilegal e não pode servir para obscurecer o dever do Tribunal de avaliar se a violência sistemática infligida aos palestinos em Gaza revela intenção genocida.

Essa é a mensagem que o Brasil traz a Haia – uma mensagem de direito, de justiça e de humanidade.

Excelências,

Todos os Estados devem garantir que seus arcabouços jurídicos e institucionais nacionais deem pleno efeito aos princípios universais de direitos humanos, autodeterminação dos povos e respeito ao direito internacional.

Isso requer o alinhamento das políticas nacionais com as obrigações internacionais, incluindo as Convenções de Genebra, a Resolução ES-10/23 (2024) e o Parecer Consultivo de 2024 da Corte Internacional de Justiça.

Devemos transformar indignação em ação, direito em justiça e justiça em paz.

Obrigado.

*Mauro Vieira, Ministro das Relações Exteriores do Brasil

O Texto original em inglês

Excellencies,

A genocide is underway in Gaza.

The Palestinian people, when not directly executed, are being deliberately condemned to hunger, destitution, and death.

By March 2025, over 50,000 Palestinian children and adolescents had been killed or injured in Gaza.

Famine has been weaponized, placing hundreds of thousands at nutritional risk – including 132,000 children under five, 41,000 of whom are in critical condition.

Only 1.5% of Gaza’s land remains suitable for agriculture. Nearly 80% of infrastructure and 92% of homes have been damaged or destroyed, leaving 1.35 million people without adequate shelter.

Yet Israel maintains an unlawful blockade on humanitarian aid and the obstruction of the work of the United Nations. Two Brazilian members of parliament integrate the flotilla, together with 15 other Brazilian nationals, an initiative of the civil society to break the siege against Gaza. Their safety must be preserved and Brazil is closely monitoring their activities.

Therefore, Brazil congratulates the Hague Group for its effort to mobilize international support for ending the genocide of the Palestinian population.

Excellencies,

International law requires States not only to refrain from committing genocide, but also to prevent it. Failure to do so may give rise to State responsibility, including for complicity in genocide.

Time has come for States to fulfil their obligations under the Genocide Convention by adopting effective measures to ensure that they do not, directly or indirectly, collaborate with its perpetrators.

At the High-Level Conference on the Implementation of the Two-State Solution, President Lula announced concrete measures:

  • The investigation and tighter control of imports from illegal settlements;
  • The continued denial of defence exports to Israel;
  • The support for an UN-led international verification mission to monitor compliance with international law and a mechanism modeled after the Special Committee against apartheid;
  • Technical support for the Palestinian Authority and continued support for UNRWA’s activities;
  • Ensuring a principled distinction between legitimate criticism of state policies and practices affecting Palestinians and antisemitism. 

Excellencies,

Last week, Brazil officially submitted its intervention in the ICJ case brought by South Africa under the Genocide Convention.

We did so guided not only by a legal duty, but by a profound sense of responsibility to uphold the absolute prohibition of genocide and to ensure that the Convention retains its full protective power.

Brazil firmly believes that genocide must be understood in its true complexity – as a composite crime, revealed not only by isolated acts, but by systematic patterns of conduct that, taken together, demonstrate the intent to destroy a people, in whole or in part.

In this context, Brazil rejects the misuse of self-defense as a pretext for illegal actions. Self-defense has no application in the context of an illegal occupation and cannot serve to obscure the Court’s duty to assess whether the systematic violence inflicted on Palestinians in Gaza reveal genocidal intent.

That is the message Brazil brings to The Hague – a message of law, of justice, and of humanity.

Excellencies,

All States must ensure that their domestic legal and institutional frameworks give full effect to the universal principles of human rights, self-determination of peoples, and respect for international law.

This requires aligning national policies with international obligations, including the Geneva Conventions, Resolution ES-10/23 (2024), and the International Court of Justice’s 2024 Advisory Opinion.

We must turn indignation into action, law into justice, and justice into peace.

Thank you.

*Mauro Vieira, Ministro das Relações Exteriores do Brasil