Este resultado das eleições francesas é extremamente preocupante pelos impactos negativos que terá na Europa e no mundo. Aprofunda a crise global, reforça a tendência de crescimento da extrema direita e sublinha alguns aspectos da realidade que muitos teimam em não ver. Vamos torcer para que o segundo turno na França melhore o panorama.
O neoliberalismo está em crise e suas variantes como o social liberalismo estão mostrando que não chegam a ser uma saída. E a social-democracia ainda está desnorteada, desde a queda do muro de Berlim, e não representa mais a qualidade e a melhoria de vida da população como nos bons tempos. E tem tido dificuldade para se renovar..
A tentativa de enfrentar a crise política global através da criação de um centro político anódino que aproxime e amalgame a centro esquerda e a centro direita não está tendo êxito. E, na prática, tem contribuído para esvaziar a presença da esquerda no expectro político/eleitoral dessas sociedades. Falta substância, tutano, perspicácia e senso critico para ser um projeto capaz de despertar e criar um ânimo na sociedade e produzir uma grande adesão política para enfrentar os atuais desafios econômicos e sociais. É como tentar curar um câncer com um Melhoral.
É um desastre para a sociedade e para toda a esquerda e a centro-esquerda fazer política sem se diferenciar, sem afirmar sua visão de mundo e seu projeto de nação e sem afirmar valores na sociedade em geral e entre os trabalhadores. O projeto de futuro manifesto em um programa político estratégico com as condições necessárias para construir e consolidar esse projeto político é parte da identidade da esquerda. E o programa estratégico aponta para um futuro civilizado, com justiça social, com oportunidades e direitos iguais para todos e todas. É urgente construir as bases culturais para uma convivência respeitosa e o acesso à uma vida digna para todos que compõe a diversidade humana presente na sociedade. E sem a empatia necessária para desenvolver o sentimento de pertencimento à uma mesma humanidade, a uma mesma sociedade, a uma mesma nação não avançaremos. O individualismo estimulado pelo capitalismo está corroendo as bases de uma vida em sociedade e está transformando quase todo mundo em meros consumidores.
E sem educar a sociedade para desenvolver plenamente sua condição humana, em termos individuais e coletivamente, sem desenvolver os comportamentos positivos em relação aos demais, aos diferentes e em relação à natureza, inevitavelmente iremos aproximar a sociedade da barbárie e da inviabilidade.
Neste sentido, a esquerda representa um projeto de superação dos impasses civilizatórios criados pelo capitalismo e por isso, o enfrentamento cultural, ideológico, conceitual é necessário.
É preciso enfrentar essa contradição entre as condições imediatas e a construção do futuro, mesmo quando estamos circunstancialmente juntos a setores políticos com outros conceitos e visões de mundo. A realidade imediata não apaga o que é estrutural na sociedade. Por isso a tentativa de enfrentar a crise política global através da criação de um centro político anódino com a centro esquerda e a centro direita não está sendo capaz de superar a crise política global. Falta substância para representar um programa capaz de criar uma movimentação na sociedade para enfrentar os desafios econômicos, sociais e políticos e culturais que estão postos nesta primeira metade do Século XXI. Enquanto isso, o futuro está ameaçado. E, a cada tropeço, a distopia cresce.

Juca Ferreira é sociólogo, ambientalista e Ex-ministro da Cultura do Brasil