Por Rose Silva

Durante o seminário O papel das periferias no processo de democratização no Brasil do século XXI, realizado pela área Reconexão Periferias, da Fundação Perseu Abramo, em Brasília, coletivos e lideranças sociais de várias regiões do Brasil apresentaram os principais desafios que vivem em suas comunidades.

A cientista social Luana Darby, do coletivo Utopia Negra, é professora substituta na rede municipal de ensino em Oiapoque (AP), uma cidade de 30 mil habitantes na fronteira com a Guiana Francesa. Ela desenvolve um projeto de incentivo aos jovens de 14 a 18 anos para terem perspectivas de trabalho por meio de um aplicativo de orientação vocacional que os próprios alunos constroem. E também realiza uma formação sobre fabricação de repelente natural a partir de citronela. Ela afirma que não faltam mentes capazes, e sim apoio para desenvolver a região de acordo com os saberes locais. “Nós não somos valorizados dentro do Estado brasileiro. Há quem tenha muitas oportunidades para ingressar em uma universidade boa, fazer pesquisa, e a gente não tem. Esses jovens devem ser muito valorizados, porque não é trabalho fixo, com direitos”, disse.

Hélio Silva Barbosa vem de uma organização – a Ajurcc (PB) – nascida de um núcleo de base do PT e da Teologia da Libertação que hoje atende 18 mil pessoas com entregas de alimentos, inclusão digital, economia solidária e cinema. “Experimentamos isso pensando que as igrejas evangélicas estão todos os dias na periferia fazendo o debate, e a gente também tem de estar. Fizemos cursos de economia solidária para 500 mulheres de uma única cidade e obtivemos um resultado eleitoral: elegemos pela primeira vez uma mulher negra em um dos municípios mais reacionários da Paraíba e quase elegemos um deputado. É interessante isso porque mostra que nossa intervenção social reflete na ação política se for casada e articulada com esse objetivo. O número de beneficiários que alcançamos equivale ao número de votos que obtivemos no processo eleitoral”, relatou.

A integrante do movimento de mulheres do subúrbio Ginga, Claudia Isabele Rocha, disse que a atuação de seu coletivo em Salvador (BA) disputa meninos e homens com o genocídio e todas as interfaces da necropolítica. “Sinto que existe uma dificuldade, um estranhamento de concatenar o que a gente conhece do vivido com todo o aporte acadêmico que recebemos. Por exemplo, na profissionalização das pessoas nas periferias. Como a gente pode reconstruir essa linguagem comum e comunitária? Precisamos fazer um processo de apropriação a partir da periferia, pois pela academia a gente falha em decorrência das lacunas de percepção, do etnocentrismo e de todas as violências epistemicidas. Esse e um dos custos do nosso futuro”, afirmou.

A diretora da Fundação Perseu Abramo Elen Coutinho, nascida e criada no subúrbio de Salvador, disse que a Reconexão Periferias abre um debate fundamental para o PT. “A crise que tem a ver com expectativa de vida, violência e ausência de democracia e direitos sociais na periferia está colocada para o PT como um debate programático, que tem a ver com o desenvolvimento do país. Quais elementos de nosso discurso político e de nosso programa falam sobre horizonte e esperança para as pessoas? Nós precisamos de um programa que dialogue com o Brasil do século 21”, concluiu.

Para a Secretária Nacional LGBT do PT, Janaína Oliveira, fala-se muito de política social sem entender a própria geografia daquilo que está sendo tratado. “De que território estamos falando? De natalidade, migração, classe, ordem econômica. Quem está no território? E aí as igrejas têm um efeito borboleta, imediato, que atinge com discurso, com resultado concreto, com assistência. Trabalhadores que estão no desemprego regularmente se deslocam para secretarias de Trabalho buscando alternativas, e quem está naquelas filas auxiliando as pessoas e oferecendo café da manhã e a palavra do senhor são as igrejas, algo que a gente não faz mais”, afirmou.

Ela lembra ainda que é necessário encarar temas espinhosos para melhorar a comunicação com as periferias. “Esse discurso moralista que as igrejas e a direita usam hoje contra LGBT, mulheres e aborto é uma questão que a esquerda se recusou a debater lá atrás. As lutas sociais se dão para além de gerar emprego e matar a fome”, pontua.

Já o secretário de Economia Solidária da CUT, Admirson Mederios Ferro Jr, o “Greg”, disse que pretende levar a periferia para dentro da secretaria. “Temos um coletivo nacional de economia solidária, estou no Conselho Nacional, e essa pauta é nossa. A gente precisa discutir os empreendimentos solidários e organizar a classe trabalhadora em territórios periféricos, afirmou.