*Haldaci Regina da Silva

No Brasil as desigualdades perduram como sintoma do processo de escravidão da população africana e são reproduzidas e atualizadas pela ausência de acesso à educação de qualidade, à saúde integral, à territorialidade, aos meios de produção de bens e ao trabalho digno, dentre outros.

As disparidades sociais segmentam hierarquias, onde o topo da pirâmide de renda pertence a homens brancos, e a base localiza as mulheres negras, com poucas chances de mobilidade. Elas continuam sendo a base para o desenvolvimento econômico e político do Estado brasileiro, porém, não usufruem do resultado dos seus trabalhos. Dialogando com essas informações, as mulheres negras piauienses, em diversos momentos históricos, se organizaram estrategicamente contra as violências que atingiam e ainda atingem os corpos negros femininos. Com o surgimento dos primeiros grupos afros no Piauí, na décadas de 80, mulheres negras protagonizaram e anunciaram novas formas de denunciar o racismo e visibilizar suas narrativas, principalmente por meio da musicalidade e do batuque. Daí em diante, as organizações negras que foram surgindo mantiveram à frente mulheres negras, fossem entidades relacionadas aos batuques, religiosidade, pastorais, teatros, música, etc.

Assim, seguindo a ideia de recuperar a arte de contar nossas histórias, mulheres negras piauienses refazem os caminhos diaspóricos de luta e resistência, organizando grupos de identidade de raça e gênero, com um nome relevante de Esperança Garcia, que teve uma importante atuação no estado, desenvolvendo parcerias e relações de irmandade com outras entidades de mulheres negras do Brasil, a exemplo a articulação de mulheres negras do Brasil (AMNB).

Nesta assertiva, no dia 6 de setembro de 2009, o movimento negro realizou um protesto sobre a condição de pobreza da população negra piauiense, com um documento coletivo que tinha como estratégia o dia estadual da Consciência Negra. Ao depararmos com as pessoas convidadas para aquela ação, nos vimos apenas em um grupo de seis mulheres negras, em uma praça, acompanhadas de um militante negro. De imediato fizemos a leitura/releitura da necessidade de organizarmos um coletivo de mulheres negras, assim nasceu o Ayabás. Tal leitura tornou possível retomar as narrativas de outras mulheres pretas, que organizaram outros coletivos negros.

O Ayabás nasceu como Sankofa, e durante quase um ano tínhamos a certeza que a escolha desta adrinka era o nosso retrato. Contudo, as rainhas negras piauienses, em busca de um nome significativo, capaz de relacionar sua identidade aos aspectos da luta, resistência, beleza, irmandade, religiosidade, sabedoria e natureza, resolveram celebrar o Instituto com o nome Ayabás , ressinificando a história das mulheres negras piauienses, que sempre lutaram por sobrevivências através da cura, afetos, reflexões a alimentando-se das energias do nosso sagrado;

Neste percurso, o IMNP –Ayabá, durante 13 anos de atuação no Piauí, compõe atualmente a Cooordeadenação da Rede de Mulheres Negras do Nordeste e integra a Articulaçao de Mulheres Negras no Brasil. Respalda-se nos trabalhos com mulheres da periferia de Teresina, juventude negra, mulheres de terreiros, quilombolas, mulheres vitimas de violência doméstica e mantém parcerias com diversos coletivos de mulheres e mistos.

Somos nossa própria história, no cotidiano de lutas, conquistas e desafios que ainda temos de travar. Nossa história nos pertence, por meio dela somos e vamos mudar a vida de outras mulheres, que neste processo de escravidão desumanizou-as, tornando-as sujeitos de dominação. Contudo, somos sujeitas afro-resilientes, com intelectualidade pra mudar o sistema de dominação e direcionar o mundo para uma humanidade que reconhece a importância do bem viver para todas as pessoas.