Por Cláudio Rafael Almeida de Souza

Este texto apresenta a pesquisa que objetiva mapear os marcadores sociais por meio do comércio de escravizados no periódico “Idade d’Ouro do Brazil”, da cidade de Salvador (BA) no serviço de busca da Hemeroteca Digital Brasileira, que pertence ao Arquivo Online da Biblioteca Nacional, e relacioná-los com a interseccionalidade e suas implicações na educação das relações étnico-raciais.

Como aporte, buscam-se referenciais em bibliografia para compreender com brevidade o conceito de interseccionalidade, definem-se os marcadores sociais mais contundentes no que se refere à educação das relações étnico-raciais. Com isso, ilustra-se primeiramente por meio dos anúncios do periódico de compra e venda de escravizados com o intuito de compreender como se estabelecia a comercialização. Enfatizam-se as características dos escravizados que eram normalmente comprados e vendidos, bem como a maneia com que esses escravizados eram anunciados. O resultado da pesquisa permite ter um breve panorama das atividades dos escravizados, idade, gênero e outras especificidades que marcam o sujeito social pela perspectiva da interseccionalidade, relacionando-as às acepções atuais de afrodescendência.

Metodologia

A metodologia de estudo utilizada na pesquisa e para a escrita do artigo foi desenvolvida a partir de uma revisão de literatura, de natureza qualitativa, que buscou aproximar-se do “estado da arte” sobre os anúncios do jornal Idade D’Ouro que abordam a compra e venda de escravizados, especificados com marcadores sociais na perspectiva da interseccionalidade. Definindo, deste modo, natureza quantitativa. Assim, os métodos aplicados determinam-se neste sentido qualitativo e quantitativo, dado o levantamento da quantidade de anúncios encontrados.

Conforme Ferreira (2002), por estado da arte entendem-se as pesquisas de caráter bibliográfico, que têm a finalidade de mapear e discutir a produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento sobre uma determinada temática e se propõem a visibilizar os aspectos e dimensões que vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, as formas e condições em que foram produzidas. São reconhecidos por realizarem metodologias de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica à luz de categorias e facetas que se caracterizam em cada trabalho e no conjunto deles, sob os quais o fenômeno passa a ser analisado.

Para a composição do cenário, o estudo foi realizado por meio do serviço de busca da Hemeroteca Digital Brasileira que pertence ao Arquivo Online da Biblioteca Nacional. Diante da metodologia, buscaram-se diferentes anúncios utilizando o período de 1811-1823 apenas no periódico Idade D´Ouro do Brazil, que abordavam a temática em discussão, utilizando a palavra “vendem-se escravos” ou “vendem-se escravas” como descritor no local de busca existente na plataforma da hemeroteca.

• Fonte: a busca dos anúncios comercializando escravizados em Salvador (BA) do primeiro período do século XIX coincidem com a fixação do primeiro periódico da Bahia, que é o jornal Idade D´Ouro do Brazil. Inicialmente houve uma ampliação da pesquisa, incluindo assim, outros periódicos. Mas, por encontrar maior quantidade de anúncios no periódico anteriormente citado, resolveu-se elencar somente os anúncios existentes neste jornal.

• Período: a demarcação do período implica na fixação e tempo de atuação e comercialização do periódico na cidade de Salvador, Bahia (1811-1823).

• Idioma: foram contempladas somente as produções em língua portuguesa, pois, na plataforma de busca, só havia exemplares de jornais na versão em português.

A partir do levantamento do material, procedemos à leitura dos anúncios e construímos tabelas para análise a partir de informações como as atividades dos escravizados, idade, gênero e outras especificidades que marcam o sujeito social pela perspectiva da interseccionalidade. Depois da construção das tabelas, iniciou-se a discussão dos achados. Para dialogar com os resultados encontrados a partir dos indicadores, foram utilizados também textos que fazem parte da temática discutida e que foram encontrados em bases de dados investigadas como o Scielo e outros indexadores, e correspondem ou não ao período dos anúncios encontrados.

Conclusões

Entende-se que estudos como esta pesquisa indicam meios de interpor recursos de combate ao racismo que buscam maneiras e encontram subsídios para melhor compreender as relações étnico-raciais que correspondem aos ideais de educação antirracistas e buscam deste modo estratégias de combate ao racismo ambiental e estrutural, não muitas vezes velado existente na sociedade contemporânea. Certamente, os meios pelos quais esta pesquisa trabalha o comércio escravista dizem necessariamente os meandros pelos quais é e se faz pertinente às discussões que tangem os problemas sociais da contemporaneidade.

Discussões que partem de ideias de raça, idade e gênero na perspectiva da interseccionalidade buscam maneiras de contribuir para a diminuição da discriminação no que tangencia a mentalidade dos sujeitos sociais que vivem na sociedade contemporânea. As maneiras pelas quais os sujeitos sociais que atualmente discutem e buscam maneiras de combater tentativas racistas na sociedade permitem que os modos pelos quais a díade racismo – escravidão fora estudada no passado, sem necessariamente ter a ver com questões especiais que correspondem ao interstício do comércio escravista.

O estudo atual indica que os meios pelos quais os negros escravizados sofreram discriminação na sociedade têm a ver com questões sociais que tangem o tratamento diferenciado dado atualmente aos seus afrodescendentes. Deste modo, apresentam-se questões que tangenciam desde o período da escravidão a episódios discriminatórios com teor racista, lgbtfóbico, xenofóbico, dentre outros. O que açambarca pesquisas de estudiosos que debruça sobre a temática da díade na qual propõe discussões de combate ao preconceito existente nas relações étnico-raciais e por que não dizer nas relações interpessoais.

As questões que os estudiosos pesquisados trabalham na perspectiva da interseccionalidade muito contribuem para os não apagamentos e/ou silenciamentos da memória social de negros na contemporaneidade. Estes ainda não retribuídos pela dívida histórica que decorre desde o período escravista que assola o ocidente até questões mais excludentes da contemporaneidade que se relacionam com questões que envolvem marcadores sociais como idade, gênero e raça. Estas especificações e categorização envolvem ideais de branquitude, que desenvolvem aspectos racistas em discussões relacionais que assolam negros, brancos, ameríndios, entre outras etnias que correspondem à sociedade atual.

Buscou-se por meio de aparato metodológico pesquisas em diferentes edições do periódico Idade D´Ouro do Brazil juntamente e em contraponto com publicações de vários tipos como livros, dissertações, teses que tratam do tema da interseccionalidade e racismo. Assim, o estudo busca maneiras de dialogar com as diferentes esferas da sociedade e pretende desmistificar a ideia de acreditar que os marcadores sociais como a idade, o gênero e a raça não se relacionam com o ínterim do comércio escravista e atitudes racistas na contemporaneidade. E sem o devido combate pela perspectiva da interseccionalidade, o racismo e outros modos de discriminação jamais serão extintos das sociedades, em específico a da Bahia.