O marco principal para a fundação do coletivo foi a participação de um representante do Pará no encontro realizado para a criação do memorial Zumbi, em Alagoas, em 1980. E também a aproximação com trabalhadores do Conselho Indigenista Missionário local.

Seus objetivos são ligados diretamente à luta contra o racismo, o preconceito, a discriminação e as desigualdades sociorraciais. As ações do Cedenpa estimulam o aumento da autoestima coletiva da população negra e a busca por cidadania plena. Além disso, leva em conta a necessidade de aprovação de políticas públicas específicas para a população negra por meio de ações afirmativas, inclusive, para garantir a equidade, no mais breve tempo possível. O Cedenpa participa de articulações e atividades ligadas à construção da democracia,  do respeito aos Direitos Humanos e dos princípios do Bem Viver.

O estudante de Medicina Veterinária Rui Gemaque afirma que entrou no Centro a partir de uma perspectiva ambiental. “Na minha caminhada, descobri que, para preservar a fauna e a natureza, não basta simplesmente cuidar dos bichos, é preciso cuidar da floresta, de quem mora nela, sobretudo as pessoas pretas que são mais marginalizadas. Então, a partir de atividades que foram ocorrendo por aqui, formações para as crianças sobre o meio ambiente, a Amazônia, fui me aproximando e acabei ficando. Eu vejo o Cedenpa como quilombo urbano no espaço de acolhimento  para a galera que faz parte, que está ao redor e acho que consegue se expandir pelo território do Estado até nacionalmente”, afirma.

Sobre a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em Belém em 2025, ele observa que chegam grandes obras de infraestrutura na cidade e as melhores são alocadas em bairros mais nobres. Ao mesmo tempo, as mais singelas são colocadas em bairros periféricos. “Isso envolve toda a questão do racismo ambiental e carência de políticas públicas para quem precisa mais”, afirma.

A professora Roberta Sodré, do Coletivo de Juventude Negra e do Núcleo de Educação, é moradora de um bairro periférico. Seu primeiro contato artístico com o coletivo deu-se pelo grafite. “O Cedenpa propiciou o Primeiro Encontro de Grafite Negro, do qual participei. Saber onde está a população negra que se movimenta e faz as coisas acontecerem me impactou desde o início, fui convidada a ficar e permaneci eternamente. Como jovem negra da periferia, eu percebi que a história do Centro se confunde com nossa história de vida”, relembra.

“Aqui a gente tem no Núcleo de Educação, atividades voltadas para crianças, musicalização e tudo mais. Isso é tentar trazer o bem-viver pra população preta, porque a gente já sabe que a nossa população é historicamente marginalizada, criminalizada e acaba sendo inferiorizada dentro desse racismo estrutural que faz com que a gente não se reconheça em locais de poder nem em espaços de discussão. Quando eu vim pra cá, mudou minha posição. Agora eu sou uma pessoa que fala sobre isso, luto contra isso, não só uma pessoa que sofre”, pontua.

A comunicadora Vic Argôlo está no GT de tecnologia da instituição e constrói o coletivo de juventude negra. “As pessoas estão vendo que eu sou uma pessoa trans negra. Vivo no centro, mas meu corpo é periférico, e acho que essa é uma dinâmica não muito falada quando se pensa vulnerabilidades e violências nos espaços. O Cedenpa para mim é uma casa, um Ilê, um lugar onde eu chego muito como um chamado de obrigação”, relata. “Como eu estou nesse front da tecnologia, vou tentar fazer um flash do que eu penso, em uma perspectiva racial, dessa violência, na perspectiva do futuro. Sobre as reformas em prol da COP 30  estão sendo instalados na cidade totens de segurança pública que têm um alcance de reconhecimento facial, com câmeras de 360 graus, que ficam distribuídos em pontos específicos da cidade. Isso abre para nós um contexto de debate sobre vigilância e segurança em um nível muito específico. Pergunto, assim, como vai funcionar esse sistema de reconhecimento facial? Quais corpos esse sistema penitenciário vai reconhecer enquanto um corpo criminoso?”, questiona.

Quilombolas de Alagamar lutam por titulação

Francisco dos Santos nasceu em 1952, na comunidade quilombola de Alagamar, que reúne em torno de 600 famílias e foi reconhecida em Brasília há mais de dez anos, porém, até hoje não está titulada pelo governo federal. Aos 71 anos de idade, ele é aposentado e vive com sua esposa Maria Aparecida, na casa onde nasceram seus cinco filhos:  Fábio, Fabiano, Fernanda, Marcela e Letícia, que estuda Engenharia Química na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Francisco conta ter sido um dos fundadores da Associação de Remanescentes de Quilombos de Alagamar, criada para que projetos e benefícios dos governos municipal, estadual e federais pudessem chegar mais facilmente aos moradores. Ele explica a importância da titulação para a comunidade. “Nós vivemos aqui na agricultura e hoje não tem terra para o povo trabalhar. Porque tem gente que não tem onde plantar nenhum feijão, nenhum um milho, nem um amendoim. Estamos precisando do título da terra, e então, assim que o título chegar, precisaremos também do apoio do governo na agricultura, principalmente maquinário, já que muitos estão idosos e com uma máquina facilita mais o trabalho para o homem do campo”.