Candidaturas periféricas por uma política inclusiva e emancipadora
Eleger candidaturas negras e periféricas fortalece a luta por uma sociedade mais justa, diversa e democrática
A política brasileira é marcada por uma profunda desigualdade racial e social, que reflete composições das Casas Legislativas nos diferentes níveis federativos. São espaços ocupados majoritariamente por homens brancos e de classes altas. As instituições não representam a diversidade racial e social de um país com uma população composta em sua maioria por pretos, pardos e pobres. Diante da sub-representação nos espaços de poder, fortalecer e eleger candidaturas negras e periféricas é um passo essencial para construir uma democracia socialmente justa.
Assim sendo, a defesa da representação de grupos marginalizados se faz importante, pelo fortalecimento da democracia e exigência de inclusão política, ampliando a participação ativa desses grupos nas decisões. O horizonte liberal de igualdade, por vezes, ignora as condições materiais da competição eleitoral. Contudo, a democracia vai além de critérios institucionais, como voto universal e eleições livres: é também inclusão social, correção das desigualdades e inclusão progressiva de diferentes grupos nos processos políticos.
O Brasil, historicamente, é profundamente desigual, porém a exclusão de uma parcela da população dos espaços políticos não é apenas um reflexo desta desigualdade. O sistema político, partidário e eleitoral também produz novas desigualdades. As dinâmicas de distribuição de recursos financeiros, as diferentes redes de apoio e o capital social dos atores dificultam aos diferentes grupos sociais apresentar candidaturas com capacidade de disputar os votos em condições mais igualitárias. E reforçam a hegemonia de um perfil social e afastado das vivências e demandas da maior parte dos brasileiros.
Isto é, a exclusão se traduz em agendas políticas que não refletem os interesses da população negra e periférica, reforçam desigualdades e a manutenção do poder político na mão de poucos. A predominância de políticos que não vivenciaram as dificuldades sociais cotidiana produz um sistema político afastado de dilemas no âmbito do acesso à saúde pública, educação, transportes e trabalho. Desta forma, as decisões políticas ficam limitadas a respostas parciais frente aos dilemas públicos da sociedade.
Importante destacar que, embora tenhamos essa predominância de eleitos brancos e das classes altas, há uma presença significativa de candidaturas negras e periféricas disputando as eleições. A conjuntura política brasileira tem destacado candidaturas e políticos com origens populares. Tais candidaturas refletem o avanço na articulação de movimentos sociais, coletivos comunitários e redes de articulação, buscando e reivindicando espaço e exigindo novas formas de participação política. São movimentos políticos que almejam representação conectados com novas agendas.
O ingresso dessas vozes nos espaços Legislativos e Executivos não é apenas um ato de correção de desigualdades históricas. Mas também uma oportunidade para repensar a política brasileira. Candidaturas negras e periféricas têm trazido pautas inovadoras, como o direito à cidade, ao trabalho digno, à democratização dos meios de produção cultural, à proteção ambiental e ao combate ao racismo e à violência institucional. Essas propostas emergem das vivências e das resistências históricas das periferias e têm o potencial de transformar a política em um instrumento efetivo de inclusão e emancipação social.
A predominância de legisladores brancos e de classe alta não é apenas excludente, mas revela limitações na capacidade de imaginar e construir caminhos transformadores. Em contrapartida, candidaturas negras e periféricas se destacam por trazer soluções que refletem as vivências da maioria, uma política mais conectada com as aspirações coletivas do povo. Além disso, eleger essas candidaturas é uma alternativa progressista frente à escalada conservadora que ameaça direitos conquistados. Os desafios da política econômica, o combate às desigualdades e a defesa da política de ação afirmativa são alguns dos desafios enfrentados pelas populações negras e periféricas. Nesse contexto, as candidaturas que emergem desses grupos não apenas defendem direitos, mas também constroem novas possibilidades de futuro.
Imaginar um futuro diferente é mais do que um exercício de idealização; é assumir o compromisso de transformar a realidade. Eleger candidaturas negras e periféricas fortalece a luta por uma sociedade mais justa, onde a diversidade seja valorizada e reconhecida como um pilar democrático. É uma oportunidade para reestruturar o poder, democratizar a política e priorizar as maiorias sociais nas decisões. É preciso reconstruir nossos sonhos de um mundo mais justo, ter a capacidade de imaginar uma sociedade mais igualitária, onde todos possam se ver representados e participar da construção do futuro.
Eleger essas candidaturas significa abrir caminhos para novas práticas políticas, capazes de tornar as Casas Legislativas reflexos mais fiéis da sociedade brasileira. Com agendas inovadoras, projetos transformadores e a coragem de construir um horizonte mais inclusivo, essas candidaturas oferecem uma chance concreta de usar a política como ferramenta de mudança, promovendo um futuro mais igualitário e plural para todos.
Wescrey Portes Pereira é doutor em Sociologia pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e pesquisador associado no Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa (Gemaa)