Crise ambiental: periferias pensam soluções e querem justiça climática
Em roda de conversa sobre efeitos da mudança do clima realizada no Rio, jovens defendem que a cultura seja uma estratégia para mobilizar a população em defesa do planeta
Os efeitos catastróficos das mudanças climáticas sobre vida das populações periféricas foram tema da roda de conversa realizada no Rio de Janeiro pela Fundação Perseu Abramo e o projeto Reconexão Periferias no último sábado (11), em parceria com a Fundação Friedrich Ebert Brasil e o Diretório Municipal do PT do Rio.
A vereadora e ex-secretária de Meio Ambiente e Clima do município do Rio de Janeiro Tainá de Paula abriu o debate e pontuou que o PT se reencontrou com a agenda climática. “Nossa ministra Marina Silva vem sendo atacada por dizer que as laterais dos rios precisam ser repensadas e a especulação imobiliária precisa ser enfrentada nesse país, e acho que é o momento para o PT elevar o tom com a especulação imobiliária nos centros urbanos e ter uma agenda para os mais pobres e vulneráveis”, afirmou.
Sobre sua trajetória na Secretaria, a vereadora lembrou como construiu uma discussão de classe com base no debate com a periferia, onde não se falava da pauta ambiental e climática. “A gente passou por uma pedagogia de enfrentar o negacionismo ambiental, falar de qualidade de vida e justiça climática a partir das chaves ancestrais, da boa comida, da água, da mata, da presença de componentes e soluções ancestralmente arrancadas de nós, no fazer das periferias e no chão das favelas”.
A chefe de Diplomacia e Advocacy para Cidades na C40 Cities, membro do Conselho da Frente Parlamentar Ambientalista e do Fundo Brasil de Direitos Humanos, Marina Marçal, destacou que infelizmente essa tragédia não é a primeira e e não será a última. “Muitas vezes o desenho de planejamento que a gente tinha para uma cidade dez anos atrás não faz mais sentido hoje. Como você chega para a população de uma região inteira destruída, como o Vidigal e a Cidade de Deus, para dizer que construíram no lugar errado? Não dá para fazer isso. Esses exemplos mostram o papel da sociedade e sua responsabilidade na hora de votar em pessoas que não sejam contra a agenda do clima e que tenham planejamento claro de políticas de prevenção e adaptação das cidades”, disse.
E também mencionou a visita do presidente Lula ao Rio Grande do Sul, afetado pela recente tragédia. “Ele disse que a gente precisa ter em mente que muitas coisas podem ser reconstruídas, mas outras não dá. São 347 municípios afetados. É necessário pensar um novo modelo de construção de cidade”, concluiu.
Para o educador popular, comunicador e morador da Cidade de Deus Jota Marques, quando a gente vê o Rio Grande do Sul neste momento sendo destruído e dizimado, o senso de urgência chega. “Mas a política não pode ser simplesmente um reflexo da urgência. Sobretudo quando funciona, ela precisa ser reflexo de uma mudança, para antecipar a urgência, para que a gente não lide sempre com a crise.”
Para ele, o Rio Grande do Sul está passando por uma situação que muito provavelmente, se ocorresse em outros lugares, não teria a mesma visibilidade. “O fato de estar em uma parte do país que tem de fato uma atenção diferenciada, uma visão sobre desenvolvimento, sobre um povo, que supostamente é mais capacitado, mais evoluído em uma perspectiva histórica, reserva um carinho por esse lugar no inconsciente como algo a ser cuidado. É preciso provocar que quando estamos falando sobre justiça climática e racismo ambiental, vamos olhar cada território de uma perspectiva diferentes”, afirmou.
A jovem negociadora pelo clima da Secretaria do Meio Ambiente do Rio e diretora executiva do PerifaLab Marcele Oliveira acredita que os desafios colocados para a política precisam ser enfrentados com criatividade. “Quando a gente fala sobre formar pessoas, tem de pensar quem são elas, que espaço ocupam e por que não estamos usando as rodas de samba, os bate-bolas, os lugares de acolhimento de mulheres para falar de meio ambiente também?”, questionou.
E observou que quando acontecem as enchentes na Baixada Fluminense, em janeiro, a população fica em uma situação muitíssimo parecida com a que se vê hoje no Rio Grande do Sul, mas em menor escala. “A gente observa uma rede na arte, na cultura, na política dizendo: doe, ore, esteja. Mas essa enchente já apareceu outras vezes na Bahia, no Maranhão, inclusive com outros nomes, como seca e como falta de oxigênio. Estamos falando de uma série de violações que só aumentam, uma vez em cada lugar, mas parece que nossas formas de conscientizar estão sempre alocadas nas mesmas pessoas e lugares”, afirmou.