Diante de ouvidos moucos, o risco de parecer repetitivo se impõe. O programa Pauta Brasil Debate da última sexta-feira, 27 de agosto, discutiu o cenário da pandemia e a variante delta do vírus Covid-19. Os dois médicos convidados, o infectologista Marcos Caseiro e a sanitarista Aparecida Linhares Pimenta, foram categóricos: os índices de cobertura vacinal no Brasil são muito baixos e a taxa de testagem é quase inexistente, portanto, não é hora de reabrir comércios, bares e outras atividades. Especialmente com a variante delta circulando por aí.

Ambos destacaram que o governador paulista, João Doria, pouco difere do presidente Bolsonaro quando o assunto é pandemia. “O Dória é só mais bem maquiado”, criticou Aparecida Pimenta, secretária-executiva do Conselho de Secretários Municipais de Saúde de São Paulo (Cosems). “O Dória diz que respeita a ciência, mas não respeita”, atacou, por sua vez, Caseiro, lembrando que recentemente importantes pesquisadores deixaram o Comitê Científico que assessora o Palácio dos Bandeirantes, por considerarem que o governador não seguia as diretrizes propostas.

A mais importante das críticas a Doria refere-se ao fato de ele se preocupar mais em anunciar para a imprensa a inclusão de novas faixas etárias no cronograma de vacinação, sem que as demais tenham tido cobertura vacinal adequada. “Ele fez do programa de vacinação uma plataforma política e eleitoral. Quando anuncia em coletivas de imprensa a inclusão de novos grupos, não se importa se os grupos anteriores foram vacinados por completo”, diz Aparecida. No Cosems, ela recebe informes diários de cidades paulistas que não tiveram o número suficiente de vacinas para completar a primeira dose.

A falta de um programa de testagem em massa é outro ponto crítico. Caseiro, que trabalha no hospital público Guilherme Álvaro, em Santos, tem procurado liderar processos de testagens em trabalhadores do hospital e também em alunos e funcionários de faculdades onde leciona. Mas sem apoio governamental nenhum. O governo estadual, lembra ele, anunciou há pouco mais de dois meses que compraria um milhão de kits de testagem para Covid-19. “O que é isso para um estado do tamanho de São Paulo?”, espanta-se.

Além desses fatores, a circulação da variante delta exige muitos cuidados. O infectologista explica que a quantidade de anticorpos tende a diminuir em todas as pessoas, após seis ou sete meses da aplicação da vacina. “Qualquer vacina, todas as vacinas são assim”, adverte. Por isso é fundamental que o maior número de pessoas tenha recebido as duas doses da vacina. Dessa forma, haverá imunização coletiva e o vírus perderá capacidade de circulação.

“As pessoas ficam espantadas porque ouvem falar de outras que tomaram as duas doses e ficaram doentes ou morreram. É porque a vacinação só vai funcionar quando a maioria tiver recebido as duas doses”, insiste o infectologista.

Ao contrário do que a euforia dos noticiários sugere, o índice de vacinação no Brasil é ainda muito baixo. Só 25% das pessoas receberam a segunda dose. Enquanto isso não mudar, dizem os dois especialistas, os cuidados preventivos devem continuar os mesmos do início da pandemia.

Até porque, afirmam, a variante delta deve se manifestar com força entre setembro e outubro, provocando nova alta dos casos.

Para assistir o programa, mediado por Artur Araújo, do Observa BR e da Fundação Perseu Abramo, clique aqui.