O programa Pauta Brasil de 16 de julho, tratou do tema Brasil e a Soberania Alimentar. O conceito de Soberania Alimentar surgiu por volta da década de 1990 e destaca a importância da autonomia alimentar dos povos, respeitando a cultura e hábitos de cada país, assim como está associado à geração de emprego e à menor dependência das importações e flutuações de preços do mercado exterior.

Participaram Betta Recine, coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição da UNB, era a presidenta do Conselho de Segurança Alimentar (Consea), quando Bolsonaro extinguiu a instância; Frei Sergio Görgen, dirigente nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e da Via Campesina; e Islândia Bezerra, presidenta da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e integrante da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. A mediação ficou a cargo de Artur Henrique, diretor da Fundação Perseu Abramo.

Betta Recine inicia sua exposição lembrando que o tema da fome sempre esteve presente na história da humanidade, “apesar de hoje termos condições de não viver esse problema”. Para a docente na América Latina e na África, o problema da fome vinha se agravando mesmo antes da pandemia. “Tanto no Brasil como na AL vivemos quase uma década e meia de melhora muito importante nos índices de segurança alimentar, que são condições de produzir, de comprar, de comer, além da quantidade necessária também a qualidade necessária de alimentos”, resgata.

No Brasil, com base nas pesquisas do IBGE com dados coletados entre 2017 e 2018 e outras duas realizadas em dezembro de 2020, uma Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e outra pela Justiça Alimentar, que mostram o aumento significativo dos níveis de pobreza e extrema pobreza e consequentemente da fome, a partir de 2014, Betta afirma que isso era esperado tanto pelo aumento do desemprego, queda do valor do salário mínimo, aumento da informalidade, em função da crise política e econômica como pelas grandes reformas que foram feitas. “Hoje mais da metade da população brasileira em situação de insegurança alimentar... 19 milhões em estado de fome, em dados de dezembro. Talvez o número seja maior uma vez que o auxílio emergencial teve um intervalo e voltou com menos valor”, relata.  Conclui chamando a atenção para a importância de se mudar o modelo de produção de alimentos.

Para Frei Sergio Görgen, ex-deputado federal, soberania alimentar implica não haver ninguém passando fome no país. Em síntese, é preciso, “comida para todos”, diz o dirigente. Não apenas comida, mas alimento, o que implica qualidade, diversidade, não transgênico, sem veneno, tipo de solo... “É uma aberração um país agrícola, com uma imensidão de solos férteis, um povo muito capacitado para produzir, que se vangloria de ser um grande produtor de grão, ter sua população passando fome”, sentencia Görgen.

A soberania alimentar defendida pelo frei é “da roça ao prato”. “Trata-se de um projeto de nação, que envolva um projeto de agricultura sustentável agroecológica em harmonia com os ecossistemas, com os biomas, que cuida da terra e dos recursos naturais, diversificada e adequada aos hábitos alimentares regionais. Além de integrar ciência, tecnologia, o conhecimento e a sabedoria do povo. O país tem de financiar, subsidiar a produção e também as redes de abastecimento, a logística, ter capacidade de estoque, reguladores e estratégicos”, explica. Isso é completamente o contrário do que temos hoje no país, que produz muito, pouquíssimos produtos, grãos, com baixo valor agregador e com grande quantidade de veneno e dependente de insumos químicos importados, conforme exposição de Frei Sérgio.

A professora Islândia Bezerra menciona os problemas já elencados anteriormente e coloca como resposta/solução potencializar os sistemas alimentares e saudáveis, a partir de outra perspectiva produtiva e também de relação com a própria vida, que é a agroecologia. Aponta as várias experiências nos campos, nas florestas, nas periferias das grandes cidades, como a de mulheres organizadas em sistemas solidários de produção de alimentos, de comida de verdade, que vêm trazendo um alento.

Ao falar sobre o perfil do governo Bolsonaro, que nega a ciência, Islândia diz que já está comprovado que destruição da natureza tem impacto nas nossas vidas desde 2007. “A redução dos habitats naturais potencializa o surgimento de bactérias e vírus que são altamente letais e a agroecologia é exatamente o enfrentamento dos territórios, das comunidades indígenas, quilombolas com produção e consumo de alimentos que promovem a saúde”, ressalta. Ainda como resposta ao problema da soberania alimentar coloca que é preciso pautar a questão da democratização da terra e resgata o quanto simbólico e desastroso foi a extinção do Consea, no primeiro dia do governo Bolsonaro.

Assista à íntegra do programa abaixo.

Pauta Brasil recebe especialistas, lideranças políticas e gestores públicos para discutir os grandes temas da conjuntura política brasileira. Os debates são realizados nas segundas, quartas e sextas-feiras, sempre às 17h, e serão transmitidos ao vivo pelo canal da Fundação Perseu Abramo no YouTube, sua página no Facebook e perfil no Twitter, além de um pool de imprensa formado por DCM TV, Revista Fórum, TV 247 e redes sociais do Partido dos Trabalhadores.

O novo programa substitui o Observa Br, programa que era exibido nas quartas e sextas-feiras, às 21h. Clique aqui e acesse a lista de reprodução com todos os 66 programas.