Tradução de Rodrigo Toneto para artigo de Emiliano Rodríguez publicado em Nature
Nove meses após o início da pandemia do coronavírus, o número oficial de mortos no mundo já ultrapassou um milhão de pessoas. Mas os pesquisadores alertam que este número provavelmente subestima muito o número real de pessoas que morreram de Covid-19. E, na pior das hipóteses, um grupo de modeladores sugere que o número de mortes pode ultrapassar 3 milhões de pessoas até janeiro.
A marca de um milhão foi atingida em 28 de setembro, de acordo com o rastreador de casos de COVID mantido pela Johns Hopkins University em Baltimore, Maryland.
Na verdade, é provável que esse número “tenha sido ultrapassado há algum tempo”, afirma Andrea Gómez Ayora, epidemiologista da Universidade do Chile em Santiago. Muitas mortes relacionadas ao coronavírus não foram relatadas, diz ela, especialmente em países onde os testes não são generalizados. O número de mortes continuará aumentando à medida que a capacidade diagnóstica aumenta em todo o mundo.
Entretanto, este é um momento significativo, diz Naomi Rogers, historiadora da medicina na Universidade de Yale em New Haven, Connecticut. "É um exemplo ainda mais poderoso da devastação desta pandemia em particular, que, na medida em que a vivemos, tem sido muito fácil de normalizar".
A: 2 de fevereiro - Primeira morte registrada fora da China (Filipinas).
B: 14 de fevereiro - França registra a primeira morte na Europa.
C: 29 de fevereiro - Primeira morte anunciada nos Estados Unidos.
D: 11 de março - Organização Mundial da Saúde declara a pandemia de COVID-19.
E: 1 de maio - Primeiro medicamento aprovado para a COVID-19 (remdesivir).
F: 27 de maio - O número de mortos nos EUA ultrapassa o de qualquer outro país.
G: 29 de junho - O número global de mortes supera 500.000.
H: 17 de julho - O número de mortes na Índia excede 25.000.
I: 11 de agosto - Rússia anuncia a aprovação de uma vacina para a COVID-19.
J: 28 de setembro - O número de mortes alcança 1 milhão.
Fontes: Organização Mundial da Saúde; Johns Hopkins University
"Poderíamos ter evitado muitas dessas mortes", diz Ali Mokdad, epidemiologista do Instituto de Métricas e Avaliação da Saúde (IHME) da Universidade de Washington, em Seattle. Por exemplo, nos Estados Unidos - que tem o maior número de mortes nacionais, mais de 200.000 - é provável que um mandato nacional sobre o uso de máscaras faciais em público teria ajudado a reduzir as taxas de transmissão do coronavírus, diz ele.
Quantas mais mortes veremos nos próximos meses dependerá de como os governos responderão à pandemia, acrescenta Mokdad.
Dias sombrios
Usando dados oficiais do COVID-19 de diferentes nações, o IHME projetou o impacto global da pandemia em vários cenários. Os pesquisadores estimam que, se as tendências atuais continuarem, em janeiro o número total de mortes chegará a 2,5 milhões, um número que poderia ser reduzido para 1,8 milhão se todos os países adotassem o uso universal de máscaras. Seus modelos sugerem que, se pelo menos 95% da população começar a usar a máscara, em 7 dias o número médio de mortes diárias esperadas até janeiro pode cair da projeção atual de quase 33.300 para cerca de 17.450.
Sem embargo, sob condições distintas, a situação pode piorar. Se os governos suspenderem as precauções como o distanciamento social e restrições às reuniões, o número de mortos pode aumentar ainda mais, chegando a 3,3 milhões em janeiro de 2021, com cerca de 72.700 pessoas morrendo a cada dia. “Estamos entrando em um momento difícil.” diz Mokdad.
A pandemia também causará mortes que não estão incluídas na contagem oficial do COVID-19, acrescenta, por causa dos efeitos colaterais que começam a surgir. Isso inclui um declínio nas vacinações infantis à medida que as pessoas evitam os hospitais, aumento do consumo de álcool e drogas ilegais e aumento da mortalidade por outras doenças, já que os sistemas de saúde sobrecarregados lutam para mantê-los à distância.
Outros pesquisadores estão esperançosos de que a contagem de mortes ultrapassando a marca de um milhão possa representar um ponto de viragem no curso da pandemia. “Espero que haja algo sobre a noção de um milhão, que é um número tão poderoso, [que] poderia ser potencialmente uma espécie de momento de despertar”, diz Rogers.
Com um fluxo constante de dados pandêmicos, corre-se o risco de esquecer “o que o número representa: a dor de muitas famílias que viram um ente querido perder o fôlego”, afirma Camila Montesinos Guevara, especialista em saúde global da Universidade UTE em Quito, Equador. “Não é apenas uma questão de olhar para os números.”
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