Henry Campos e Nahuan Gonçalves

Em conduta que colide frontalmente com as orientações emanadas de países ocidentais para que as vacinas contra a Covid-19 só sejam liberadas depois de completadas todas as fases do rigoroso protocolo de autorização para utilização em seres humanos, a China anunciou que já administrou a centenas de milhares de pessoas três de suas vacinas em experimentação, sem que em nenhuma delas tenha sido concluída a fase de ensaios clínicos.

A primeira vacina que recebeu autorização do governo chinês para uso emergencial em junho, em militares, foi aquela desenvolvida pela CanSino Biological Inc., tendo sido o seu emprego estendido, no mês seguinte, a médicos e inspetores de fronteiras. Não foi divulgado o número total de pessoas que recebeu essa vacina.

A segunda vacina com uso emergencial autorizado por Pequim, em julho, foi a que é produzida pela companhia farmacêutica chinesa China Biotec Group Co. (CNBG), subsidiária da estatal Sinopharma, que informou, nessa última semana, ter injetado em centenas de milhares de pessoas a sua vacina experimental. Entre as centenas de milhares de pessoas que receberam a vacina da CNBG encontram-se funcionários, residentes na China, da Phoenix Satellite Television Holding Ltd., empresa de Hong Kong, não havendo sido declarado o número desses funcionários. O presidente da Sinopharma, Liu Jingzhen, em entrevista a essa cadeia de televisão informou que essa vacina seria oferecida a mais jornalistas, especialmente àqueles que trabalham em outros países. Outro dirigente da CNBG, Zhou Song, declarou que, nas redes sociais da companhia, “nenhuma só pessoa que recebeu a vacina foi infectada ou apresentou alguma evidência de reação adversa atribuível à vacina”. Ele acrescentou que a vacina não estava sendo administrada a mulheres grávidas ou em fase de amamentação, não revelando se as pessoas vacinadas foram informadas dos riscos potenciais da vacina. Zhou Song também revelou que chineses que vêm trabalhando em obras de infraestrutura em outros países também foram vacinados, embora não façam parte dos estudos clínicos finais. A CNBG declarou ter recebido, de vários países, encomendas de 500 milhões de doses, sem precisar quais eram esses países.

A terceira vacina, administrada na mesma condição, é aquela produzida pela empresa farmacêutica chinesa Sinovac Biotech, que informou ter inoculado, com a sua vacina experimental, cerca de 3.000 dos seus funcionários e familiares, incluindo o seu executivo-chefe. Segundo o porta-voz da empresa, Liu Jingzehn, essas vacinações recentes da companhia eram todas voluntárias e não incluíram pessoas que apresentavam fatores de risco para a vacinação, e que, a opção de vacinar seus funcionários deveu-se ao fato deles estarem expostos a riscos de contaminação. Liu declarou ainda sobre o uso emergencial que “ele não se destina a demonstrar ao público a segurança da vacina”. De acordo com a empresa, Filipinas, Indonésia e Brasil devem receber a vacina como países estratégicos para a Sinovac Biotech, e que Bangladesh receberá gratuitamente, por razões humanitárias, 100.000 doses da vacina.
A China tem atualmente dez projetos de vacinas contra a COVID-19 em fases adiantadas de estudos, algumas delas realizadas apenas em países estrangeiros, como Argentina, Peru , Marrocos, Bahrein e Emirados Árabes Unidos, pois o “gigante asiático” não tem número suficiente de infecções ativas para realizar tais estudos. Segundo as nebulosas estatísticas chinesas, até o último levantamento, a China não registra novos casos de transmissão local desde 16 de agosto, e só 403 dos 96.623 casos registrados até aquela data permanecem ativos.

Uma dessas novas vacinas em estudo destaca-se por seu modo peculiar de administração: um spray nasal de uma formulação de vírus da gripe atenuados, aos quais foram acrescidos segmentos genéticos de proteínas do SARS-CoV-2, segundo o Science and Technology Daily, publicação do Ministério da Ciência e Tecnologia da China. O composto, já testado com sucesso em camundongos e hamsters, foi desenvolvido pela companhia farmacêutica Beijing Wantai e pela Universidade de Hong Kong, e entrará na fase de ensaios clínicos em novembro, com uma centena de voluntários já recrutados em Hong-Kong.

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