Por Henry Campos e Nahuan Gonçalves

Em entrevista concedida ao jornal Financial Times, no dia 30 de agosto, o dirigente máximo da Food and Drug Administration (FDA), Dr. Stephen Hahn, disse ser possível que a agência conceda uma autorização em regime de urgência ou a aprovação de uma vacina antes que os testes clínicos da fase 3 tenham sido concluídos.

O anúncio da medida tem causado preocupações e controvérsias no país em que, segundo pesquisa da rede CNN de televisão, 40% da população não quer receber a vacina quando ela estiver disponível, mesmo que seja gratuita e de fácil acesso. A polêmica gerada pela declaração de Hahn só reforça esse quadro – no dia seguinte à sua entrevista, uma comissão de proeminentes médicos e especialistas veio a público para solicitar a criação de uma comissão independente para rever os dados (da FDA) dos testes de vacinas antes que elas sejam comercializadas.

A Dra. Kathryn Stephenson, professora da Harvard University declarou que um painel dessa natureza aumentaria a confiança na vacina, depois de ter ouvido de vários colegas que não desejavam tomar a vacina quando ela estiver disponível. “Tenho ouvido isso dos meus colegas, de médicos e enfermeiros. Eles não são contra vacinas. São a favor das vacinas. Eles vacinaram seus próprios filhos. Mas não estão confiantes nessa vacina”, disse a médica, que é diretora da Unidade de Ensaios Clínicos do Center for Virology and Vaccine Research, do Beth Israel Deaconness Medical Center, em Boston. A promessa de que os dados do ensaio clínico seriam revistos por um Comitê Assessor da FDA foi feita pelo seu dirigente máximo, Stephen Hahn, à Dra. Susan Bailey, presidente da American Medical Association.

Em sua entrevista, Sthephen Hahn declarou que “cabe ao promotor do estudo (fabricante da vacina) solicitar uma autorização ou aprovação e cabe a nós fazer uma adjudicação desse pedido. Se isso for feito antes do final da Fase 3, nós podemos julgar isso apropriado e, em caso contrário, determinar o que deve ser feito”. Hahn informou que “nossa autorização de urgência para utilização não é o mesmo que aprovação total”. Disse ainda que a decisão será baseada em dados, não em política: “Nós temos uma convergência da pandemia da Covid-19 com o período das eleições e temos que atravessá-lo e nos manter fiéis aos nossos princípios”.

Acontece que, antes mesmo da recente Convenção Nacional do Partido Republicano (24-27 de agosto), o presidente Donald Trump vem prometendo que uma vacina contra a Covid-19 estará disponível “antes do final do ano, certamente”, tendo declarado também que está “otimista que uma vacina esteja pronta por volta do dia da eleição”, ou seja, 3 de novembro. Os médicos têm expressado sua preocupação que, “poucos dias antes da eleição, Donald Trump pressione a FDA para aprovar uma vacina não finalizada, como um presente de outubro para ganhar votos”. “Não se pode deixar que isso aconteça”, manifestou o geneticista Francis Collin, diretor do Projeto Genoma Humano e  atual diretor do National Institutes of Health (NIH), que acrescentou que, se a FDA de Hahn aprovar uma vacina com base em evidências não fundamentadas “ele terá que responder a muitas pessoas”, informando que ele e o dr. Anthony Fauci, diretor do National Institutes of Allergies and Infectious Diseases (Niaid), e membro da Força Tarefa para a Covid-19 da Casa Branca, estarão entre essas pessoas.  Collins disse que ele, Fauci e outros “certamente fariam um grande barulho de não apoio à vacina”, se o FDA fizer uma aprovação prematura, acrescentando que “a vacina não pode ser aprovada com base em outra coisa que não seja a ciência”.

Entre as 170 vacinas em desenvolvimento no mundo registradas pela Organização Mundial da Saúde, hoje três delas desenvolvem, nos Estados Unidos, a Fase 3, a fase dos ensaios clínicos, onde se avalia em profundidade, em especial, eficácia e segurança. Essas vacinas são as produzidas pelas companhias Moderna, Pfizer/BioNTech – ensaios iniciados há três meses, e a do laboratório AstraZeneca, que iniciou, em setembro, os seus ensaios clínicos. Embora as apostas sobre o primeiro lançamento pareçam convergir para a vacina da Moderna, entre essas a primeira a iniciar os ensaios clínicos, são necessários ajustes para aumentar a representação das minorias no seu grupo de voluntários a serem testados. Ainda que tenha elevado para 24% o recrutamento de “pessoas de cor”, isso está longe de chegar ao que é preconizado pelo Dr. Anthony Fauci – que 66,4% dos voluntários testados pertençam a quatro grupos – negros, latino, indígenas e nativos do Alasca, na mesma proporção em que estão distribuídos na população como um todo.

Uma vez que Donald Trump, continua a explicitar diariamente, nos discursos e entrevistas, como fez na sua polêmica fala de aceitação da candidatura, a promessa que a vacina estará disponível “até bem antes” do final do ano, é certo que, confirmada a liberação, o diretor da FDA, Stephen Hahn, cairá mais uma vez em descrédito, como ocorreu no caso do plasma convalescente, ainda  hoje anunciado por Trump  como “salvador de 35 em cada 100 pacientes”, com base em informações prestadas pelo executivo da FDA. Hoje, quando os dados revelam que o benefício do plasma convalescente não supera tímidos 5%, Hahn pede desculpas “por ter contribuído para interpretações errôneas no domingo”, véspera da Convenção Nacional do Partido Republicano.

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