O Observatório da Coronacrise conversou nesta quarta-feira, 26 de agosto, com especialistas em “Infância, pandemias e Covid-19”. Com a mediação de Márcio Jardim, diretor da Fundação Perseu Abramo, o programa contou com a odontóloga e professora Ana Estela Haddad, os médicos e também professores Fernando Barros, Paulo Saldiva e Sulivan Mota.
A professora Ana Estela Haddad deu panorama do contexto de pandemia. O Brasil que tem 2% da população mundial e está com 15% dos infectados por Covid-19 no mundo. Apesar de a pandemia atingir fortemente os mais idosos por causa das doenças crônicas também tem efeitos muito severos no crescimento e desenvolvimento. Tendo em vista a primeira infância, os primeiros mil dias – que se dão a partir da gestação –, recupera estudo realizado pelo economista James Heckman em que mostra “que o quanto antes o poder público investe em políticas e destina orçamentos à primeira infância, os retornos são maiores e mais impactantes”.
Lembra ainda que o desenvolvimento cerebral da criança ocorre a partir de funções mais simples, que dão base às mais complexas dentro do processo de desenvolvimento, e possibilitam à criança estabelecer o desenvolvimento físico, cognitivo e socioemocional. Exemplifica que “crianças que têm acesso à leitura, desde bebês, ou seja, que os pais leem para elas, contam histórias, chegam à fase de alfabetização com 60% de vocabulário a mais do que aquelas que não tiveram a mesma oportunidade”. A professora menciona ainda outros estudos em que a desigualdade socioeconômica, a relação meio social e os vínculos afetivos são preponderantes, além dos fatores genéticos, são determinantes para o desenvolvimento infantil.
O professor Fernando Barros apresentou dados de pesquisa nacional EpiCovid-19, realizada pela Universidade de Pelotas e outras entidades, em municípios sedes de regiões intermediárias do IBGE, que procura detectar a população que já teve contato com o coronavírus. Nas três etapas já realizadas pela pesquisa, maio, junho e julho, das pessoas testadas 1,9%, 3,1%, 3,8%, respectivamente, apresentaram prevalência de anticorpos. Inicialmente a maior contaminação estava na região Norte, seguida de Nordeste, Sudeste, Centro Oeste e Sul. Chama a atenção o nível socioeconômico dos afetados. Os 20% mais pobres também foram os mais atingidos, sendo duplamente mais afetados que os mais ricos.
O epidemiologista destaca o fato de que em um recorte por faixa etária, a prevalência de anticorpos em crianças de 0 a 9 anos igual ou superior aos outros grupos de idade.
Segundo o patologista Paulo Saldiva, professor na Faculdade de Medicina da USP, nos últimos dois meses tem aumentado o número de crianças infectadas pela Covid-19, principalmente nos EUA e no Brasil. O problema é que não se sabe qual o risco de morte, nessa faixa. Lembra que se trata de uma discussão importante uma vez que está em debate o retorno às aulas presenciais e relata que teve contato com cinco crianças infectadas que vieram a falecer no Hospital das Clínicas de São Paulo, das quais quatro não tinham qualquer comorbidade. Saldiva apresenta estudo sobre como a doença se desenvolveu em uma criança. No caso em questão o vírus se instalou no coração, ocasionando microenfartos, levando a criança a óbito. Destaca ainda outro estudo realizado na região metropolitana de São Paulo, que mostra que a vulnerabilidade da população à doença aumenta à medida que nos distanciamos do Centro em direção à periferia, “revela que a incidência de morte dos acometidos pela doença até 20 anos também é muito maior na periferia”.
O médico Sulivan Mota, da Universidade Federal do Ceará e diretor do Instituto da Primeira Infância (Iprede), relata ações desenvolvidas pela instituição no período de pandemia tendo como público alvo crianças de 0 a 6 anos em situação de vulnerabilidade. Reitera a importância dos estímulos nessa faixa etária para a formação do indivíduo. “O Iprede trabalha também com a família, representada pela mulher, no sentido de promover autoestima, saúde e profissionalização e também o vínculo da criança com a mãe”, destaca.
Segundo ele, na pandemia o instituto “teve de se reinventar e buscar os bairros de menores IDH em Fortaleza para entrega de doações em alimentos, cestas básicas e produtos de higiene e limpeza”.
Assista abaixo o programa na íntegra
O Observatório da Coronacrise é o programa do Observatório da Crise do Coronavírus (clique aqui para acessar), iniciativa da Fundação Perseu Abramo para monitorar a crise sanitária e econômica gerada pela pandemia e promover esforços no sentido de atenuá-la e até de superá-la.
O programa é transmitido ao vivo nas noites de quarta e sexta-feira, às 21h, no canal da Fundação Perseu Abramo no YouTube, em sua página no Facebook e no Twitter, além de ser retransmitido pelas redes sociais de Dilma Rousseff e Fernando Haddad, e dos portais parceiros: Revista Fórum, DCM e Brasil 247.